Capítulo 12: Em meio a dor um abraço se torna lar

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"É uma coisa muito dolorosa sentir vergonha da própria casa. Deve haver nisso uma infame ingratidão e a punição deve chegar e é bem merecida. Mas que em si só um sofrimento, posso asseverar." (Grandes Esperanças - Charles Dickens)

Yarin estava encarando o próprio reflexo no espelho do único banheiro de sua casa. Já fazia quase uma hora que havia se trancado ali.

Primeiramente tomou um banho demorado enquanto lavava seus cabelos. Depois se enrolou em uma toalha e, ao abaixar a tampa sobre o vaso sanitário, sentou-se. Ficou pensando se realmente iria fazer aquilo quando já tinha tantas pessoas dispostas a ajudar. Dizia que não faria qualquer diferença a sua presença. Poderia era acabar atrapalhando.

Tentava convencer a si mesma que não precisava ir. Que não tinha em parte alguma de seu ser qualquer vontade de estar com Lee Kwan. Porque de fato não havia. Pelo menos é o que tentava acreditar.

Por outro lado, pensava que seria vergonhoso dizer que sua amiga que havia lido as mensagens e respondido. Estava constrangida em falar que não iria coisa nenhuma. Ainda tinha a questão de que Moon Hana acabou envolvendo outra pessoa em toda essa problemática.

Mesmo após Yarin praticamente expulsá-la do quarto, ela não se deixou abater com essa reação. Acabou indo falar com a mãe da menina a respeito disso.

– O que está acontecendo aí? Por que essa gritaria toda? – Constance saiu da cozinha ao enxugar as mãos em um pano de prato. Enquanto fios de cabelo se soltavam do rabo de cavalo que os prendia.

– Desculpa, senhora Davies, mas é que eu acabei fazendo algo que sua filha não gostou. Mas eu tive meus motivos! Tenho certeza que a senhora iria concordar se soubesse.

Esta ao atravessar o pequeno compartimento onde tinha apenas mesa de jantar, estante contendo uma televisão, parecia desfilar com sua saia xadrez na altura das coxas. Se jogou sobre o sofá vinho que ficava debaixo da janela. Botando atrás das orelhas seus cabelos lisos e brilhosos. Depois cruzou os braços sobre o moletom vermelho que possuía Seoul National University bordado em letras brancas. Seu lema era se portar como se não sentisse frio nas pernas desprotegidas. 

– Soubesse o quê? A Yarin aprontou de novo? Essa menina! – botou o pano sobre o ombro, puxou para baixo a barra do avental florido e foi sentar-se ao lado de Moon Hana.

– Ela recebeu um convite de um jovem muito respeitável. Nem é para um encontro e sim para um evangelismo da igreja de vocês. Eu acabei respondendo a mensagem e disse que ela iria sim! Porque conhecemos a Yarin, nunca faria algo assim por si mesma. Precisamos ficar nos esforçando por ela e ainda é mal agradecida!

Moon Hana também estava chateada, pois em sua concepção de mundo era para isso que as amigas servem. Para ajudar umas as outras a alcançarem lugares e oportunidades que não teriam coragem de irem sozinhas. Sempre soube que Yarin precisava de um empurrão. Assim não conseguia se culpar por ter respondido as mensagens.

Outro jovem? – Constance arregalou os olhos – Nessa semana eu já tive duas conversas com ela sobre isso! Agora será a terceira e espero que seja a última! – quando ia se levantando para ir até sua filha, Moon Hana a puxou pelo braço.

– Como assim? Me explique isso direito porque eu estou totalmente desatualizada!

Yarin saiu abruptamente de seu quarto usando short de algodão e camisa rosa de mangas compridas. Esta blusa era uma farda de um congresso de jovens de sua antiga igreja no Brasil.

– Chega! Para a informação de vocês, não preciso de ajuda de ninguém para conseguir ter algum... – engoliu em seco – Vocês iriam era me atrapalhar! Também preciso que me dêem algum espaço, pelo menos para eu pensar e tomar minhas decisões! Eu sei que tenho uma doença que pode afastar as pessoas. Mas precisam me deixar tentar do meu jeito!

O Livro Perdido de Yarin Davies (DEGUSTAÇÃO)Onde histórias criam vida. Descubra agora