"Procurando Atmosferas" é uma coletânea em que minhas inspirações e sentimentos correm pelas palavras escritas, refletindo os novos ares que busquei e decidi explorar. A cada capítulo, uma nova reflexão e, consequentemente, uma nova atmosfera.
#8 na...
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Eu estou por um fio.
Não me lembro como vim parar aqui.
Estou dependurada, encarando o vazio abaixo de mim, e tudo que ouço é o eco da minha própria respiração. A corda que me segura é semelhante a uma atadura branca, um elástico. Ela se envolve em minha cintura, e não sei onde ela está amarrada lá em cima, para conseguir sustentar tamanho peso.
É apenas ela, solitária. Todas as outras cordas que se prendem a mim ainda me apertam, mas já não me dependuram, já não me guiam em uma dança sem fim pela escuridão como uma marionete.
Não querendo encarar um destino incerto e sentir meu coração acelerar com a probabilidade de cair, eu olho para meus braços, completamente cobertos pelo resto das cordas brancas, que se assemelham às vestes de uma múmia.
É isso que sou? Uma múmia tão enrolada no passado que todo meu presente se decompôs?
Mordo o lábio, e a súbita agonia faz a única corda que me segura balançar. Lágrimas anuviam minhas vistas, e eu quero gritar. Porém, sei que se gritar, será como uma avalanche, e aquela corda vai se romper.
E eu não quero cair.
Limpo os olhos, engolindo o soluço, e percebo o sangue seco nas ataduras. Foram das tentativas de arrancá-las a força.
Aquelas cordas poderiam estar apenas amarradas a minha volta, mas quando eu puxava, sentia como se fossem pregos grudados em meus ossos. As cordas remexiam em todo meu interior antes de concordarem em se soltar.
Na realidade, lembro-me de como causei toda essa situação de estar prestes a cair.
Eu comecei a arrancar as cordas.
Uma a uma, eu as puxei, sentindo os pregos rasgarem minha pele em feridas intermináveis e deixarem meu esqueleto com rachaduras eternas. Mesmo com os pregos tendo caído para o vazio, as marcas ainda continuam, e os restos daquelas prisões me vestem.
Por que ainda me seguro a elas?
Com esse pensamento, começo a arrancá-las. Meu sustento solitário balança com mais afinco, indo de um lado a outro, e estala. Por um segundo, me sinto despencar, para então retornar aos meus sentidos e perceber que a corda apenas cedeu minimamente.
Meu coração bate forte contra minhas costelas, e um zumbido infiltra em meus ouvidos, dando-me a sensação de torpor. Mesmo assim, continuo minha tarefa, e tento retirar cada atadura restante.
Arranco-as e as vejo despencar sem rumo certeiro, caindo em ondulações brancas em contraste com o mundo escuro ao redor. Porém, quanto mais eu tirava, mais pareciam surgir, sem fim, não querendo se livrar de mim.
Mas eu queria me livrar delas.
Com os dentes, cortei-as. Quando meus lábios já estavam cortados e sangrando, o gosto metálico invadindo minha boca, percebi que só sobrava uma.
Aquela ao redor da minha cintura. Aquela que ainda me mantinha dependurada.
O que vai acontecer caso eu a corte? Eu nunca mais vou ser controlada, mas também não significa que irei ver a luz do dia.
A incerteza me faz me sentir frágil, como se fosse feita de vidro novamente, e não detentora dos ossos de pedra que sofreram marteladas e não se partiram ou da pele que nunca de fato se rasgava.
Lágrimas grossas banharam minhas bochechas, e a corda parou de se balançar. Ela nunca me deixaria ir.
O passado nunca iria me deixar.
— Eu só queria uma tesoura...
O sussurro ecoou pela escuridão. A palavra tesoura carregava toda minha angústia e desespero, e senti sua pronúncia me circundar como uma espiral enquanto eu aceitava o fim.
Até que ouvi algo de metal bater contra alguma coisa.
Eu não sei de onde surgiu, mas algo estava caindo, vindo de cima, de onde aquela corda estava amarrada. Percebendo meus olhos se arregalarem, tentei pensar o mais rápido que meus reflexos permitiam e apanhei o objeto.
Uma tesoura.
Passei a respirar rapidamente, segurando-a colada junto ao peito. Tinha medo de que aquele tesouro fosse despencar como todo o resto.
Encarei o instrumento, posicionando meus dedos para usá-lo. Analisei a corda, a adrenalina correndo por minhas veias na velocidade da luz, mandando para longe o estágio de torpor anterior.
Posicionei as lâminas da tesoura aberta uma de cada lado da corda e olhei para baixo. Não via nada, nem mesmo névoa, apenas o infinito do desconhecido.
Decidida, fechei os olhos com força, e gritei. Soltei a voz como nunca havia feito antes, sentindo meus pulmões darem todo o oxigênio capturado para aquela única ação.
Era um grito de guerra.
Fechei os dedos e a tesoura acompanhou. A corda se rompeu, e naquele ínfimo segundo entre prisão e liberdade, eu me permiti ficar de luto pelo que estava deixando para trás.
Porém, depois, era apenas eu em queda livre, com um sorriso que não cabia em meu rosto. Alguns chamariam de salto de fé, mas no meu caso era uma queda de fé.
E cair foi a melhor coisa que me aconteceu.
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E esse foi o texto de hoje! Confesso, ele foi um dos textos mais abstratos que já escrevi, porém, um dos mais especiais para mim até hoje.
O que quis mostrar ao escrever o texto foi uma pessoa presa em cordas, que seriam a representação do passado, e a princípio o eu lírico sente medo ao se imaginar sem tudo aquilo para lhe segurar. No entanto, após refletir um instante, percebe que é inútil se manter naquele limbo e começa a arrancar as cordas, que antes estavam presas firmemente, e até parecem não ter fim.
Então, o eu lírico começa a cortar as cordas, e eu quis mostrar que só arrancando os problemas pela raiz que eles seriam solucionados. Assim, a última corda é a mais difícil, já que o eu lírico está com sua boca machucada de cortar as amarras com seus próprios dentes, aí ele pede uma tesoura (uma oportunidade para se ver livre) e a vida lhe oferece isso.
No fim, o eu lírico percebe que a queda da qual ele tinha tanto medo era sua porta para a liberdade, deixando para trás o passado.
Bom, é isso! Quis dar o meu lado desse texto porque ele dá espaço para muitas interpretações, e eu adoraria saber a de vocês!