A Vida em Livro II

Capítulo 12

- Como é que tudo aconteceu?

O André pergunta-me o óbvio. Ontem não consegui explicar mais do que o essencial.

Acabo por lhe dizer tudo o que se tinha passado no hospital.

- Os teus nervos na noite anterior, antes de eu me ir embora... A tua má disposição, eu não pensei...

- Nem eu...

O silêncio cai entre nós por um momento até que eu o interrompo:

- André... Tenho medo.

Ele vira-se para poder olhar para mim.

- André, tenho medo de que... de que não possa voltar a ter filhos. Eu sei que estava sempre a dizer que não, porque eu estou quase nos quarenta, mas e se... E se isso me for negado? Se essa escolha me for negada por isto?

O André pega nas minhas mãos.

- Eu... Eu acredito que não vai ser assim. Luísa, o médico não disse que tu estavas impossibilitada de ter filhos, ele não te conseguiu dizer isso. Temos de acreditar que essa não vai ser a notícia final. 

- Não sei... Eu... - as minhas palavras são interrompidas pelo choro.

- Luísa, Luísa - ele diz ao mesmo tempo que me abraça as pernas e coloca a sua cabeça no meu regaço - O mais importante é que estás bem. Estás bem e aqui comigo.

- Não sei se isso é o mais importante...

O André olha para mim.

- Isso será sempre o mais importante. Estás viva, aqui ao pé de mim e do Tiago. Isso é o mais importante!

- Eu não me consigo sentir assim... Sentir assim como tu dizes...

O André levanta-se e dá alguns passos em frente. Os seus braços envoltos em mim davam-me uma segurança maior do que agora... sem o ter do meu lado.

- Nem sequer devíamos estar pensar nisso. A equacionar que alguma coisa te pudesse ter acontecido... - A voz dele sai mais grave do que aquilo que eu poderia imaginar - Para que é que estamos a pensar nisso? Tu estás aqui, isso é o que importa - Ele vira-se para mim - Eu não concebo esta vida sem ti, Luisa. Tem isso bem ciente. Eu não me consigo compreender nesta vida se não te tiver do meu lado.

A seriedade com que ele me transmite  os seus sentimentos, faz-me ficar sem palavras. E sem lágrimas.

- Eu ainda não consegui encaixar que tiveste um... Que estavas grávida e que agora já não estás. Nem imagino como te devas estar a sentir - o André chega-se perto de mim e agacha-se à minha frente  - mas não estás sozinha. Estás com medo. Eu também partilho desse medo, mas estamos juntos, e seja lá o que for que está para vir, estamos juntos e vamos enfrentá-lo juntos. Não te escondas de mim, porque eu não me vou esconder de ti.

O compromisso que oiço nas suas palavras mas que, acima de tudo, descortino no seu olhar, faz-me acreditar que seremos capazes de enfrentar o que aí vem. Abraço-o com força.

- Amo-te.

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O Tiago está na sala a ver bonecos.

Eu e o André estamos a acabar de arrumar a cozinha, em silêncio. Ele ainda não me contou nada da viagem, imagino que me queira poupar, mas as coisas não funcionam assim. Preciso que ele partilhe comigo o que se passou nestes dias.

- Queres dizer-me o que aconteceu na viagem? - pergunto enqunto me encosto ao de leve na bancada.

- Não devias estar em repouso? Ontem já andaste demasiado e hoje também.