Recaídas

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Sakura


Não tive coragem de olhá-lo, de vê-lo indo embora. Mas ouvi cada passo, a mochila sendo colocada nas costas, a porta ao ser fechada. O peso de todas as palavras ditas me esmagando. Os medos, as verdades e as mentiras; tudo machucava a sua maneira. Quis desistir, voltar atrás, enfrentar o castigo da escolha difícil; esquecer os meus erros e os dele; correr e pedir para que ficasse.

Não poderia. Nossa salvação não estaria nisso.

Sentada, olhando para baixo, chorei em silêncio, deixei que as outras lágrimas contidas se juntassem àquela solitária a esquentar minha bochecha; às vezes forçando os lábios para tentar me conter, noutras abrindo a boca para recuperar o ar sem soluçar ruidosamente.

Sasuke tinha razão. Eu era só uma garota rica. Era só uma garota comum. Não era a mais bonita, tampouco a mais inteligente. Não tinha nada de especial. E nunca achei que tive, pelo contrário. Aliás, não sabia o que em mim havia despertado tamanha adoração nele. Uma mulher comum sem os dilemas necessários para entender suas questões filosóficas, que apenas ama viver, sem se importar com a questão de onde vem, para onde vai ou qual o tamanho do infinito.

Tola e sonhadora, que como qualquer outra, um dia esperava conhecer o amor da sua vida e viver algo emocionante e duradouro. Romântica o suficiente para se imaginar usando um vestido branco e subindo no altar para a promessa de um casamento feliz e cheio de amor, que se via tendo filhos e sendo amada pelo marido. Um homem igualmente comum.

Quanto a última parte, o casamento perfeito, estava com idade suficiente para saber que não teria. Não o teria porque não existe. Na maioria dos dias estaria desejando matar o meu adorável marido, e as crianças me levariam a loucura, embora as amasse. No entanto, ainda acreditava no amor. Não era um ato de fé para mim, como acabara de mentir para Sasuke.

Eu o amava. Por isso chorava.

Não sabia o motivo do meu coração escolhê-lo. Simplesmente sentia que o amava. Quão precipitada me tomava, mas com Sasuke era tudo muito intenso. Não sabia dizer como, onde, em qual instante exatamente, qual o olhar ou o sorriso. Esse tipo de sentimento nos envolve sem hora marcada. Quando se percebe já é tarde demais.

Sempre achei que o amor vinha com o tempo, que era construído aos poucos. Talvez alguns sejam assim. Mas o meu não. O meu era um fora da lei. Intenso, exigente. Suportava-o indulgentemente, segurava dentro de mim, temia admiti-lo. Ele escapava no recuar, no ceder, na esperança e persistência ao lutar por uma causa tida como perdida.

Há pessoas que amam no silêncio e oferecem o conforto de uma vida terna; outras que amam grande, a ponto de não caberem em si, e queimam com toda intensidade da paixão. Que são como tempestades de verão. Sasuke era assim, era a tempestade, enquanto eu não passava de uma neblina no crepúsculo. A diferença é que a tempestade conhece a destruição, a neblina deixa o jardim orvalhado pela manhã.

Não escrevia músicas, não tinha nada de poético, como cada olhar dele parecia ser. Olhos negros. Olhos negros carregam por si toda poesia melancólica. Aquela pronfundidade esmagadora. O incêndio que devasta. Eu era só uma centelha. Atraída pelo brilho da chama, mas humana o suficiente para temer o fogo.

Quando estava com Naruto, achava que o amor seria superar todos os nossos problemas e concluir os planos que tínhamos juntos. As promessas me impediam de deixá-lo, mesmo após a paixão esfriar e nos tratarmos como desconhecidos. Não era. Sabia que não. Era só resistência, uma busca por esse amor que vem com o tempo. Um achismo tolo por observar o casamento dos meus avós. Acreditava que se quisesse ter algo até a velhice como eles, deveria aprender a suportar. Só não havia parado para pensar ainda "Suportar o quê, exatamente?" Suportar os problemas ou a ausência do sentimento?

WonderwallWhere stories live. Discover now