Capítulo 15 - A história de Serena

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Era uma manhã de junho e o inverno já estava dando seus primeiros sinais. O braço de Anne estava quase bom denovo, e já estava há um mês morando com Helena e sua família. Também estava há um mês sem ir para escola, e nem para o escoteiro. A garota saía pouco do apartamento e geralmente desenhava na escrivaninha de Helena. Ficava sozinha em casa grande parte do tempo, e dormia numa cama auxiliar que tinha no quarto de Helena. A garota aprendeu rapidamente a rotina e se acostumou com a dieta vegetariana adotada pela família. Anne já tinha algumas roupas que serviam nela, mas pegou gosto pelas roupas de banda do Freddie, que dizendo ela, eram as roupas mais confortáveis do mundo.
Aquela manhã era uma das que Anne saíra de casa, e estava passeando em um lugar um pouco fora do normal: em um cemitério. Ela simplesmente acordou com vontade de ir lá, sem saber o motivo.
O cemitério em vista se tornou um dos seus lugares favoritos. Lá era bonito, cheio de flores, árvores enormes e algumas capelas. E é claro, túmulos, de todos os tamanhos e formas, e todos com uma fotinha de quem fora enterrado, além da plaquinha com o nome do falecido. Anne imaginava como seria essas pessoas em vida, se perdendo em seus sonhos e devaneios. Um homem idoso que era um avô doente que amava seus netos. Uma mulher jovem com a vida pela frente arrancada por um acidente de carro, uma criança queimado no incêndio da escola. Apesar de assustador, essas imaginações eram belas e poéticas a sua maneira.

Entre tantas lápides nas quais os olhos de Anne corria, uma lhe chamou atenção: a lápide de Serena Martins Alekseeva, uma garotinha loira com os olhos parecidos com os de Dália. O sobrenome Alekseeva era familiar para Anne, mas ela não se lembrava o porquê. Ficou muito tempo sentada lá, olhando aquela lápide. A menina loira se parecia muito com Freddie se não fossem os olhos, que eram cinzentos e menores. O cabelo tinha o mesmo tom de loiro da família de Helena, e aquilo a deixou um pouco pertubada. Ficou ali por horas admirando aquela lápide, mas parecia mais algo hipnótico do que algo que faria normalmente.

Anne voltou para casa pouco antes do almoço, tomou banho e voltou aos seus desenhos no sofá da sala de estar. Era um cómodo bonito, com uma televisão não muito grande, um sofá cinza que ia de ponta a ponta da sala, onde atrás do sofá tinha quadros, nos quais possuiam brasões da família, um dos quadros com o brasão "Martins" e o outro "Alekseeva", e naquele momento, Anne finalmente havia reparado neles e se assustou.
Ela e Helena namoravam há 3 meses, e moravam juntas a pouco menos de um mês, mas ela não sabia seu último nome. Martins é um sobrenome comum, mas Anne nunca viu ninguém com Alekseeva, só Serena, que estava em um túmulo. Anne ficou curiosa com tudo isso, e decidiu que perguntaria sobre Serena, e se ela era da família.

Depois do almoço, Anne foi para o quarto onde Helena estava fazendo seu dever de casa. A menina estava com os longos cabelos loiros em um rabo de cavalo e parecia feliz mesmo resolvendo contas matemáticas. Anne se sentou na cama:
- Amor?
- Fala, Anne. - Helena da uma pausa nos estudos e se virou para Anne.
- Você tem alguma parente chamado Serena?
- Como assim? - O olhar de Helena estava profundo e seu rosto ficou branco.
- Serena, com olhos cinzentos e um cabelo loiro, você conhece? Achei a lápide dela no cemitério hoje.
- E por que você estava no cemitério?
- Eu acho cemitérios facinantes.

Helena saiu da cadeira e se sentou ao lado de Anne na cama. A fita azul de seu olho perdeu o brilho habitual:
- Anne... - chamou com uma voz triste - Vou te contar o que aconteceu com minha outra irmã.
Anne estava séria, e um pouco assustada.
- Isso tudo aconteceu quando eu era bem pequena, não lembro ao certo a minha idade, mas me lembro de tudo. Serena era minha irmã mais velha, e tinha 12 anos na época. Era a garota mais doce e feliz do mundo, até o dia em que foi sequestrada. Aqueles meses que a família passou atrás dela foram intermináveis. Eu era muito nova para entender, mas eu estava sempre chorando, e sempre com medo. Foi quase um ano até que ela voltasse, e no dia que isso aconteceu, ela estava grávida de 9 meses. Todos ficamos muito felizes ao reencontar Serena, mas muito assustados com sua situação. No dia seguinte ela sumiu, e foi encontrada morta, e sem o bebe. Não sabemos nada sobre o bebê, nunca o encontraram.
Anne estava paralizada. "Helena passou por uma situação dessas quando pequena." A mente da menina estava confusa, e assustada ao mesmo tempo.
- Serena se suicidou - continuou Helena com lágrimas nos olhos.
- Desculpa...- Anne estava quase chorando, e abraçou a namorada para tentar acalma-la.
- Não foi sua culpa, você não sabia...
- Mas eu te machuquei...
- Não! Anne você não me machucou, apenas descobriu algo sobre mim. Não foi sua culpa...
- Mas...
- Sem mas, Anne! - A voz de Helena estava firme - Isso não foi sua culpa, e minha dor nunca vai embora, mas eu não quero você se culpando com isso. Tá bom?
Helena deu um beijinho na testa de Anne, que decidiu animar a namorada. Começaria um desenho novo, especialmente para Helena.

Para Anne um arco irisOnde histórias criam vida. Descubra agora