Capítulo 14 - Contos de Fantasmas

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East Lothian, Escócia. 1651

As três garotas observavam a fogueira, hipnotizadas. Podiam sentir o calor aquecer seus corpos enquanto o vento frio fazia seus cabelos levantarem. A noite estava estrelada, como se todos os astros quisessem ser vistos e ter papel em uma performance majestosa no céu.

O cheiro da sopa sendo preparada pode ser sentido de onde estavam. Uma clássica receita de sua avó, que assumira grandes responsabilidades ao descobrir a doença da filha.

— Ela tem pouco tempo – dissera e curandeira. – Precisa começar a preparar suas despedidas.

Ivette repousava sua cabeça pacificamente na rede pendurada na pequena sala do casebre. O frio a fazendo roer os dentes. Conseguia ver as garotas dali. Três meninas maravilhosas. Seu marido estaria orgulhoso. Com a admiração, o medo pelo futuro das garotas também ganhou espaço. A própria Ivette havia sofrido ao aprender a controlar seus poderes, talvez sua própria doença fosse a punição justa pelas vidas que tirou em seus momentos de descontrole.

— Venha querida – sua mãe se aproximou, com uma tigela e uma colher. – Precisa comer.

Ivette se sentou, devagar. Não podia fazer movimentos bruscos. Quando tocou a pequena tigela, notou que o conteúdo estava muito quente, então começou a soprar e misturar a sopa que tomava desde os cinco anos, enquanto a mãe a observava. Deveria ser ao contrário, ela deveria enterrar sua mãe, e não sua mãe vê-la definhar e pior ainda, suas filhas.

— Mãe, venha nos contar uma história. – Lorraine entrou na sala, como um furacão. – Mãe, eu e Clarice queremos ouvir uma história.

- Sua mãe está repousando agora Lorraine – repreendeu a avó, gesticulando para que saísse dali.

— Tudo bem – Ivette se levantou, com cautela, e a mãe a sustentou imediatamente. – Consigo fazer isso.

Com pequenos passos, Ivette foi levada para fora e se sentou em um pequeno banco ao lado das filhas. A fogueira passou a aquecê-la. Ela adorava aquela tradição, ter as meninas ali, unidas ao seu redor. Sentia como se pudesse protegê-las de todo mal.

A madura Penélope, Ivette sabia que ela precisaria de alguém para lhe auxiliar à medida em que seus poderes crescessem. Já podia dizer que seus dons a permitiriam enxergar através do véu que separa os dois mundos, várias foram as vezes em que a pobre garota acordou aterrorizada alegando ser importunada por pessoas que só ela conseguia ver.

— Bem, eles não podem machucá-la de você não deixar – Ivette dizia, enquanto deitava com a filha, até adormecer. – Diga: "Saia daqui", e eles irão embora.

Enquanto Penélope sofria com seus dons, Lorraine se regozijava. O caos emanava pela meiga menina como impulsos elétricos. Constantemente Ivette a encontrava levitando durante o sono e precisava fazer algum tipo de encantamento para acalmá-la.

Por fim, havia Clarice, a caçula era com quem mais se preocupava. Conseguia lembrar com nitidez quando a garota foi brincar na casa de um amiguinho na vila, perto do mar. A mãe da criança prometeu trazer Clarice de volta no horário combinado, depois de atrasar duas horas. Ivette e o marido foram à procura de Clarice.

A casa estava completamente revirada, móveis quebrados e vasos com pétalas de rosas murchas. A mãe, o pai e o amiguinho haviam sido transformados em pedra e olhavam aterrorizados para a cama no quarto do filho, de onde a pequena Clarice saiu, sorridente e tranquilizada, como se nada tivesse acontecido.

— Eu os ouvi falar mal de você mamãe – disse a pequena, enquanto era abraçada pela mãe.

— Nos conte uma história mãe – implorou Lorraine.

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