_____________Diferente do meu pai, mamãe não tinha um dia específico para ser visitada no cemitério. Então, escolhi o dia trinta para ir vê-la, já que os que deveriam ser lembrados nesse dia eram os criminosos — não que mamá fosse uma —, as almas perdidas, qual ela também não se encaixava e o último, orfãos, solitários e esquecidos.
Como ela mesmo dizia, era uma mulher orfã, desde que o pai a expulsara de casa, ao engravidar. Então, tendo em vista essa informação, o dia trinta de outubro, era o que lhe caia melhor.
Eram duas horas da manhã. Quis vir um pouco mais cedo, para poder passar mais tempo com ela do que com meu pai. Não que eu gostasse mais dela. Nada disso. Mas acho que, mulher tem mais coisa pra conversar. Ou melhor. Eu tinha mais o que falar para ela.
Faço a mesma coisa do que fiz com meu pai, arrumando um altar em seu túmulo com suas comidas favoritas e me sento sobre minhas pernas, apoiando as mãos nas coxas e solto a respiração que estava prendendo, sem perceber.
Diferente da vez em que fui ver o senhor Moore, a madrugada estava fria. A grama estava molhada como da outra vez, mas o vento estava cortando de um jeito assustador. Poderia até ouvir seu assobio em minha orelha, avisando que eu deveria ter colocado mais peças de frio para ir até ali. E não haviam muitas pessoas por aqui também. Digamos que, nem sempre os criminosos são bem lembrados pela família e orfaos não tem uma para que se lembrem dele. Os solitários, eram, como a palavra já diz. Sós.
Respiro fundo, começando a me recordar das coisas que passei com a mamá, tentando tirar os monólogos sem fim que eu mesma inventava em minha mente, tudo isso para fugir de lembranças indesejáveis, que me traziam pesar, para deixar que as boas viessem.
Uma mulher de sorriso fácil era o que ela era, diria eu, olhos amáveis e mãos delicadas, todas as vezes que fazia algum carinho em sua única filha, ou a olhava com ternura.
Seus últimos dias não foram fáceis. Nem pra ela, nem pra nós que acompanhamos de perto, sua família, como também os médicos que se apegaram muito a ela. Uma mulher que transparecia paz, até nos piores dias de sua doença. Eram o que diziam, algo que por muito tempo pensei que fosse dito da boca para fora, apenas para romantizar a força de vontade de viver que Fridah Moore tinha. Alguma coisa muito poética e falsa.
Pessoas que sofrem de câncer. Qualquer tipo deles. Merecem o maior amor do mundo, digo isso por experiência própria.
Mamãe, mesmo nos dias em que estava presa a uma cama de hospital, fazia questão, com o pouco de força que tinha e toda teimosia de uma mulher mexicana, de passar nas alas das amigas e conversar com elas. Essas, estando muito mais fracas que a minha mãe e que morreriam antes mesmo de Fridah.
Ela era uma mulher generosa. Tinha um coração gigante e um estômago maior ainda e que por incrível que pareciam, cabiam cinco borrifos grandes, devorados um atrás do outro.
Tinha os piores conselhos possíveis, talvez, os mais insensíveis também, mas, eram por mim, considerado os melhores.
A última lembrança que tenho dela, é justamente as de sua morte. A forma em que ela morreu.
Estava magra, não conseguia comer, andar direito, tomava banho uma vez por semana. Seus cabelos já nem existiam mais. Os olhos fundos, como alguém que estava prestes a morrer, ou já havia morrido e era tão insignificante, que esqueceram de colocar o corpo em um caixão feio e enterrar. Esticou sua mão pra mim, as mãos que pareciam desproporcionais ao corpo, marcando muito bem seus ossos grosseiros e espessos. Sua palma fria e mórbida, contra a minha quente e viva. E sussurrou as palavras que me recordo até hoje.
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Como Ser Uma Boa Secretária [Nao Atualizada - 2020]
RomanceSe você recebesse uma proposta que pudesse mudar sua vida, mas que te fizesse casar com seu chefe idiota e egocêntrico, você aceitaria? Cassidy se vê entre a linha ténue de se livrar de todas as suas dividas aceitando a proposta do seu chefe metido...