XXIII

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"Don't stand too close

Don't fall too hard

I hate to hurt you, baby

But I break things"

Break Things - Kylie Morgan

"Você vai ter os recursos e pessoal necessário para enterrar o irmão em tantos processos que ele terá que implorar para nos vender sua parte do rancho." As palavras do meu chefe ecoam na minha cabeça a noite toda. Eu sei o que isso significa. O que eu vou ter que fazer.

Enterrar Graham em burocracias. Processos sem sentido, com o único sentido de fazê-lo gastar um dinheiro que nós sabemos que ele não tem, quando o único objetivo real é ganhar o processo em nome de sua irmã para que ele seja obrigado a aceitar vender o rancho ou então comprar a parte de Betty, o que nós também sabemos que ele não tem dinheiro suficiente para fazer.

Literalmente pressioná-lo tanto até que ele não tenha escolha.

Quando Graham entra no quarto aquela noite, finjo já estar dormindo e me enrolo nas cobertas para que ele não possa me puxar para perto. Como posso deixar ele me abraçar quando planejo destruí-lo? Tirar dele algo que ele já me disse tantas vezes amar tanto? O que será de nós dois se eu fizer isso?

Acordo cedo no domingo e me distraio arrumando as roupas de volta na mala, para não ter que conversar com ele. Sei que estou evitando-o, mas não sei como encará-lo.

É quase hora de almoçar quando desço. Os meninos estão outra vez fazendo churrasco, mas as meninas agora estão na beira do lago, aproveitando o sol. Apesar de estar usando um biquíni por baixo do vestido solto não me junto a elas, fico nas mesas de madeira, observando Graham.

— É bom ver ele tão feliz assim novamente — Gabby comenta.

— Quem? — pergunto confusa.

— Graham — responde. — Eu conheço ele e Betty há muitos anos, estudamos todos juntos no ensino médio.

— É mesmo?

— Sim. E eu posso garantir, não o vejo assim desde que... bom...

— Desde que Harper morreu — completa Betty. Ela se senta ao lado de Gabby e me entrega uma cerveja. — Eu também noto isso. Todos os dias, quando vejo o meu irmão, eu quase nem me lembro de quem ele tem sido nos últimos anos. — Ela pega minha mão sobre a mesa. — Graças a você.

— Eu não fiz nada — digo. Não sei o que nada daquilo significa. Graham tinha dito que estava apaixonado por mim, eu sabia disso. Sei que tenho sentimentos fortes por ele, diferente dos que eu tenho por Patrick. Mas não sei o que isso pode significar. Não é como se ele tivesse se afastado de todas as mulheres do mundo após perder Harper. Sara Jo, em seu biquíni minúsculo saindo do lago como uma modelo, era a prova viva disso.

— Não acho que você precisou fazer nada — explica Gabby.

Como se sentisse que estamos falando dele, Graham me abraça por trás, me trazendo um prato de comida.

— Eu queria que meu marido fosse tão preocupado assim — ela brinca. — Mas aparentemente ele decidiu me deixar morrer de fome — E sai da mesa, fingindo estar brava com Blake.

Graham ocupa o lugar de Gabby a minha frente quando ela se levanta para falar com o marido.

— Tudo bem com você? — pergunta. É claro que ele percebe que tem algo errado, que estou evitando-o.

— Sim — minto.

— Você dormiu cedo ontem.

— Estou com um pouco de dor de cabeça. — Não é bem mentira.

Aaron se junta a nós, se senta ao meu lado. O rosto de Graham se fecha na hora, como se a simples presença dele o incomodasse.

— Conseguiu falar com ela? — Betty pergunta de Cal.

— Sim. Tudo certo, ela e Cowboy ainda não destruíram a casa.

— Bom. — Ela ri. Um riso genuíno, de uma mulher apaixonada. Se eu percebo, é claro que seu irmão também percebe, o que parece irritá-lo ainda mais.

— Então, Graham, ouvi dizer que vocês vão vender o rancho? — Aparentemente Aaron deve ter algum desejo suicida, por que escolhe o pior assunto para abordar.

— Não é da sua maldita conta.

— Certo. — O moreno ergue suas duas mãos ao ar, se rendendo. — Só achei que a Stella aqui teria mais sorte para convencê-lo agora que vocês estão dormindo juntos.

Eu vejo a cena que está prestes a se desenrolar. Graham pulando sob a mesa para cima de Aaron. Socos. Mas antes disso acontecer, as palavras saem da minha boca:

— Cala a porra da boca, Aaron. — Eu me surpreendo com as minhas próprias palavras, e acho que Graham e Betty também. — Qualquer que seja o joguinho que você esteja fazendo, pare — mando. — Ou você vai se ver comigo. E se você magoar Calamity, eu garanto que você vai se arrepender.

— Uau, bem que o Patrick disse que você era a pessoa certa para passar a perna nesses caipiras — ele sussurra para mim, baixo o suficiente para que Graham e Betty não possam escutar.

Eu me assusto com suas palavras. Peço licença e me levanto da mesa. Não sei aonde estou indo, não sei o que estou fazendo, apenas entro na casa em direção ao quarto.

— Stella. — Reconheço as passadas na madeira antes de ouvir a voz de Graham me chamar. — Princesa, você está bem?

— Estou bem — minto. Me sento na cama e deixo meu corpo afundar no colchão.

Não sei o que deu em mim. Eu não grito com as pessoas. Eu não ameaço as pessoas. Mas as coisas que eu disse a Aaron, são verdadeiras. Se ele machucasse sua filha, eu acabaria com ele, custe o que custar. Mas o que mais me atormenta são as palavras que eu recebi de volta. "Bem que Patrick disse que você era a pessoa certa para passar a perna nesses caipiras". O que diabos ele queria dizer com isso?

— Você não está bem — ele percebe. Se ajoelha aos meus pés na cama, assim ficamos quase na mesma altura e não tenho escolha se não encará-lo.

— Não.

— O que foi? Fale comigo — pede.

— Se você soubesse que algo ruim vai acontecer comigo e você fosse culpado por isso, você faria?

Ele parece confuso, mas responde com certeza:

— Não. Eu nunca faria algo ruim para você.

— Mas se você não fizesse, alguma outra pessoa faria, de qualquer jeito — explico.

— Princesa, eu não estou te entendendo — diz. — Mas eu sei que eu nunca faria nada que pudesse magoá-la e faria qualquer coisa para impedir que qualquer outra pessoa fizesse.

Suas palavras acabam com as minhas dúvidas. Me deito na cama e deixo as lágrimas escorrerem. Sinto o corpo pesado de Graham rastejando ao meu lado. Quando ele se deita comigo me permito apoiar meu rosto em seu peito.

— Obrigado — ele diz.

— Pelo que? Por não ter te deixado arrebentar a cara de Aaron? Talvez ele mereça.

— Por isso. Por tudo. Por existir.

Levanto meu rosto um pouco porque quero ver a reação em seus olhos azuis quando digo:

— Estou enlaçada por você também, caubói.

Enlaçada por vocêOnde histórias criam vida. Descubra agora