Eu estava sentada ao lado de Carlos na beira de um píer tentando capturar alguns peixes para o almoço da semana.
De repente, olhei para ele e pensei em como eu tinha sorte por tê-lo. Era a segunda vez que íamos pescar sem a nossa mãe e eu sabia que assim como eu, ele estava pensando nela, em como ela fazia falta, em como tudo era mais leve quando ela estava por perto.
- A mamãe dizia que a quinta era o dia preferido da semana dela porque ela vinha pescar com a gente antes do trabalho – Soltou ele e eu dei um sorriso ao lembrar disso.
- Ela dizia que era um momento de paz – Foi minha vez de relembrar.
* * *
Eu tinha 12 anos e Carlos tinha 6, estávamos um de cada lado da nossa mãe, sentados naquele mesmo píer. A brisa da praia fazendo nossos cabelos voarem.
- Mamãe, todos os meninos pescam com os pais. Por que o meu pai nunca veio pescar comigo?
Nosso pai havia nos deixado quando mamãe estava grávida de Carlinhos, lembro do dia em que acordei e não vi meu pai em casa. Mamãe me disse que ele tinha ido ver a vovó, mas ele nunca mais voltou. Ele mandava cartas para mim e meu irmão no natal, mas nunca nos visitou. Depois que eu completei 10 anos as cartas deixaram de vir. Mamãe não gostava de falar sobre o papai, eu sabia que ela guardava mágoa dele. E eu também guardava.
- Não que eu não goste de pescar com você, quer dizer, eu amo pescar com você – Acrescentou notando a expressão vazia no rosto de mamãe.
- Também amo pescar com você, meu anjinho – disse passando a mão pelos cachos dourados de Carlinhos.
* * *
Estava na cozinha preparando um dos peixes que conseguimos, quando Carlos perguntou:
– Por que você vai pra esta entrevista de emprego?
- Eu preciso de um emprego para comprar as nossas coisas. Se eu conseguir o emprego, nosso almoço não vai mais se resumir em arroz e peixe ou ovo.
- Quando eu estiver bom, também vou arrumar um emprego, eu sou o homem da casa, tenho que cumprir os meus deveres.
- Você não vai trabalhar anjinho, tem só 10 anos. Você precisa estudar, isso sim. Além disso, não existem diferenças entre homens e mulheres na questão de responsabilidades.
- Mas eu estou de férias, Bete.
- Claro, mas em fevereiro nós vamos voltar à escola.
- E você? Como vai trabalhar e ir à escola?
- Não sei, mas eu ainda nem sei qual será o horário. Na verdade eu não sei nem se vou conseguir o emprego. - Mas ele estava certo. Como eu conciliaria os estudos e o emprego?
Deixei isso para lá e voltei a preparar nosso almoço, era um peixe tilápia, arroz integral e alface.
* * *
Às 14:30 eu já havia tomado banho e estava escolhendo minha roupa. Não que eu tivesse muita opção, mas eu queria passar uma boa impressão. Optei por uma calça jeans um pouco desbotada, uma regata branca que caía bem no meu corpo e uma jaqueta lilás. Minha mãe sempre dizia que ela ficava bem com meu cabelo castanho.
- Carlinhos, estou indo para a casa dos Moscovis – Disse, enquanto calçava o melhor sapato que eu tinha – Se comporte, se acontecer alguma coisa pode bater à porta da Conceição. Quando eu voltar, preparo o nosso jantar.
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Ouro e Esmeralda
RomanceElisabete Oliveira é uma garota de 16 anos que mora em uma pequena cidade dividida entre a parte rica e a parte pobre. Pensando em seu irmão mais novo, sua única família, Elisabete aceita um emprego de uma das famílias mais ricas da cidade. Acredita...