Capítulo 4

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Após contar a ele (que não havia se apresentado, mas pela voz eu imaginava que era o Noah) sobre os problemas com o currículo, fui levada para dentro da casa. A decoração era moderna e bem planejada, parecia coisa de novela. Havia uma escadaria no centro da sala que dava origem a dois corredores no primeiro andar. Aquela era a casa que qualquer pessoa sonharia em ter.

Ele me guiou para uma sala, uma espécie de escritório\biblioteca. Lá encontrei com a Sra. Moscovis.

- Mãe, esta é uma das candidatas ao emprego.

- As entrevistas já foram encerradas – Disse ela, olhando por cima dos óculos de leitura. A Sra. Moscovis era uma mulher jovem, tinha no máximo 40 anos, a idade que minha mãe teria se estivesse viva. Era alta, magra e tinha os cabelos castanhos presos em um coque bagunçado que eu desconfiava ter sido feito agora. Apesar de jovem, tinha uma aparência cansada.

- Por favor, mãe – Disse ele e em seguida se aproximou dela e sussurrou algo em seu ouvido.

- Está bem – Cedeu – Espere lá fora, filho.

Ele se dirigiu para fora da sala, mas não sem antes de me lançar um olhar que eu não consegui decifrar.

- Então, qual seu nome? - Perguntou fazendo sinal para que eu sentasse na cadeira à sua frente.

- Elisabete Oliveira – Seu olhar endureceu com minha resposta.

- Filha de Eleonor Oliveira?

- Sim – respondi com um sorriso – A senhora a conheceu?

- Não exatamente. Digamos que ela já teve uma pequena ligação com a família.

Abri a boca para questionar isso, mas fui interrompida:

– Quantos anos você tem, Elisabete? - Perguntou, segurando papel e caneta, pronta para anotar tudo.

- Tenho dezesseis – respondi, mas meu cérebro ainda questionava todas as possibilidades de uma relação que minha mãe poderia ter tido com essa família.

- Bastante nova. Então... Qual o motivo de você querer este emprego?

- Preciso de um emprego para cuidar do meu irmão. Depois que minha mãe morreu tudo ficou mais complicado. Há dias que praticamente não consigo pôr comida na mesa. Mas se a senhora me der esse emprego tudo vai mudar.

- Entendo, entendo. - Ela claramente não entendia. Nunca passou necessidades na vida - Qual a experiência que você tem com crianças?

- Cuido do meu irmão desde que eu tenho 10 anos e ele 4. Também já cuidei de várias crianças da cidade para ajudar as mães.

- Até que é bastante experiência para alguém da sua idade.

Fomos interrompidas por uma batida na porta e Noah entrou segurando a mão de uma criança que eu imaginei ser Alice.

- Sinto muito por atrapalhar mãe, mas ela insistiu em vir até aqui.

- Essa é a moça bonita que você falou? - Perguntou Alice, sua voz de criança era extremamente doce.

Olhei para Noah e nossos olhares se encontraram por dois segundos. Ele estava constrangido, isso era inegável. Fui a primeira a desviar o olhar, mas pelo canto do olho percebi que ele ainda me olhava.

A Sra. Moscovis pigarreou desfazendo o silêncio desconfortável causado pela pergunta de Alice – Elisabete, receio que nossa entrevista já tenha acabado. Vou pedir para o motorista lhe levar para casa. Está tarde para ir andando desacompanhada.

- O turno do Mário já terminou, mãe. Eu posso levá-la em casa.

- Não – disse desesperadamente – Não precisa, muito obrigada, mas não precisa disso. Não quero atrapalhar. - Tudo o que eu menos queria era ficar num carro sozinha com Noah.

- Você não vai atrapalhar – Insistiu – Eu não estava planejando fazer nada agora. Vamos – Disse já pegando minha bolsinha de couro desgastado e se dirigindo à porta.

- Muito obrigada por tudo, Sra. Moscovis. - disse apertando sua mão e ela deu um sorriso meigo assentindo.

- Tchau, princesa – Me despedi rapidamente de Alice e recebi um sorriso.

Saí pela porta seguindo Noah, estava praticamente correndo para acompanhar seus passos largos.

- Eu realmente não preciso que você me leve em casa – Disse, tomando minha bolsa de volta.

- Tudo bem, então eu só vou passear com o Almofadinhas. Vem garoto – Ouvindo isso, o cachorro avançou na direção do dono, abanando o rabo.

Saímos da casa ao mesmo tempo. Estávamos caminhando quando Noah quebrou o silêncio que havia se instaurado entre nós.

- Sobre o que a Alice disse... Sinto muito se ela te deixou constrangida, ou alg...

- Você não deveria estar indo para o leste? - Interrompi.

- Por que acha que eu deveria estar indo para o leste? - Perguntou enquanto sua sobrancelha esquerda se erguia.

- Por que o leste é a parte da cidade frequentada por pessoas como você. - Respondi de uma forma que pareceu um tanto rude.

- Pessoas como eu? - Indagou, fingindo estar ofendido.

- Você entendeu o que eu quis dizer. Pessoas ricas não frequentam o oeste.

- Diferentemente do que algumas pessoas pensam, acho um erro terrível o fato dessa cidade se dividir entre moradores do leste e moradores do oeste. Somos apenas moradores. Apenas pessoas.

Parei ao ouvir isso. Eu concordava plenamente, é claro, mas fiquei abismada com sua opinião, considerando que ele fazia parte da família mais rica da cidade. Provavelmente ele só disse isso para ser educado afirmei em pensamento.

- Então quer dizer que você frequenta o oeste? - Perguntei em tom duvidoso.

- Sim, eu e esse cão pulguento – Disse afagando a cabeça do cachorro.

- Prove. - Pedi e ele me olhou como quem dizia é sério isso?

- Toda sexta-feira a Conceição serve torta de cereja no café dela, por isso é meu dia preferido na semana.

- O que? Não acredito que você frequenta o Café da Conceição! - exclamei – Eu não vou com tanta frequência, mas nunca te vi lá.

- Faz 1 ano e meio que eu não vou mais lá. Eu ia com meu pai – Disse baixando os olhos.

- Sinto muito – murmurei, contendo uma vontade enorme de dar um abraço nele e dizer que estava tudo bem.

Ouro e EsmeraldaOnde histórias criam vida. Descubra agora