capítulo XI_Turista

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- E é aqui que nos separamos. Você segue o seu caminho, que eu sigo o meu.

- Tá, tudo bem. Então, eu já vou indo... E, obrigado pela carona, sei que não tinha a intenção de me trazer aqui, mas valeu.

- De nada, e adeus... E espero, nunca mais encontrá-lo em vida, e se eu tiver sorte nem na morte.

- Você é rude feito um parvo. E sinceramente espero o mesmo.

A "despedida" foi cheia de espinhos, e finalizada com um olhar determinado do garoto se cruzando com meu olhar de superioridade sobre o rapaz, que andava ingenuamente em direção ao centro. Pobre garoto, vai ser devorado pela cidade grande.

Fico aliviado, por me livrar desse fardo. Agora me ocupo com os itens faltosos do meu estoque, uma distração cotidiana.

Não esperava encontrar nada além de materiais de boa qualidade, na Rua kalêpa no distrito de Garin, conhecida por todo lugar por sua grande variedade de comércios, todas as suas ruas estão repletas de lojas e barracas com produtos locais e de fora, um lugar perfeito para comprar tudo o que preciso para meu estoque. Mas para a minha surpresa, esse dia não estava sendo nem meio normal, eu me encontrei com alguém que não via a anos, seu nome é Dayla, sua pele é de um moreno bem alaranjado, e seus longos cabelos ondulósos e rosa, preso com uma fita roxa, seus olhos amarelos, que mais parecem pequenos sóis, nariz empinado e sua boca em tom de vermelho quente e uma cicatriz acendente do lado esquerdo do rosto. Vinha andando em minha direção, com suas roupas em tons de inverno, como azul e roxo, blusa escura de gola alta e sem manga, um short claro com muitos bolsos, e um lenço azul esverdeado envolto ao pescoço com suas pontas ao vento.

Quando me dei conta, ela já estava segurando meu braço e olhando bem nos meus olhos.

- Lorrem...- esse é um apelido que ela me deu a muito tempo - Não acredito que é você! Já faz o que, uns cinco anos não é? - Ela falava enquanto apertava meu rosto com suas mãos ásperas.

- Foram só quarto anos e meio. - Falei meio desajeitado, por ela ainda brincar com meu rosto.

Ela parou por um instante, e depois sorriu.

- Essa cicatriz é nova? - falei apontando para a bochecha esquerda dela - não me lembro dela.

- Ah sim, eu ganhei faz alguns meses, numa briga com um mercenário que se chamava... Destruidor ou algo assim...

- Um mercenário é... Mas diz aí, quem venceu?

Eu perguntei mesmo já sabendo a resposta, porque desde que a conheci eu nunca a vi perder pra ninguém, nem sequer uma vez.

- Eu, é claro - ela jogou o cabelo pro lado - nunca deixaria alguém com um nome ridículo desses manchar meu título, Dayla a Invencível Caçadora de Recompensas ou A Caçadora Invencível, pode escolher.

- Caçadora de Recompensas, basicamente mercenária não é?

- Exatamente isso.

- Eu achei que estivesse na guarda, se me lembro bem, você foi aceita pouco antes de me mudar.

- Foi sim, e se me lembro bem, você não tinha barba.

- Não muda de assunto.

- Tá bom, te conto se me pagar o almoço.

- Fechado!.. você não gostou da barba, não é mesmo?

- Não é que eu não goste, e que prefiro sem. Mas a barba é sua faça como quiser.

Não é que eu faça tudo que ela sugere, mas eu confio em seu julgamento estético, por isso pretendo fazer a barba mais tarde.

Eu terminei de fazer a compra do estoque, e Dayla me acompanhou o dia todo. Já era quase meio dia, e como havia prometido a levei à um restaurante para lhe pagar o almoço. Pegamos uma mesa no canto ao lado da janela, e sentamos um de frente pro outro, ela pediu uma cerveja roxa e três tipos de carne diferentes, já eu pedi um vinho azul, uma salada fresca e o prato da casa, que não questionei seu conteúdo, só vou descobrir o que é quando me servirem.

Estávamos devidamente servidos de álcool quando resolvi reinvindicar minha parte do acordo.

- E então, o que aconteceu afinal?

Ela bebeu um longo gole da cerveja, respirou fundo e sorriu.

- É bem simples na verdade, eles eram fracos de mais. Devo ter dado uma surra em cada comandante, e daí eu cansei.

- Cansou ou eles te chutaram, por ser tão violenta?

- Um pouco dos dois - falou pouco antes de virar a caneca de cerveja

- Tá zuando né? E precisava fazer esse mistério todo.

- Claro que sim, queria que pagasse o almoço. E aliás, é você que continua sendo movido por essa sua enorme curiosidade.

- E o que tem de mais?

- Nada, além de acabar te botando em uma fria, como a do assalto a um certo burocrata... Você lembra não é?

- Esse não dá pra esquecer, os segredos daquele cofre eram formidáveis.

- Você lembra que a gente foi preso né? Tudo por que o nosso contratante fez merda.

- Um pequeno contratempo...

- Pequeno! Ficamos trancados por três sóis até você bolar um "plano genial" pra sairmos de lá.

- De fato... mas a culpa não foi da minha curiosidade, foi do ladrão, um terrível amador.

- claro, só que foi você que decidiu ir junto com o "Sr. amador" para ver os segredos do cofre.

Nós nos encaramos e começamos a rir, esse é com certeza o momento mas agradável que tenho em tempos. E claro, foi drasticamente interrompido quando um dos garçons tropeçou, fazendo cair uma bandeja de bebidas ao meu lado, assim sujando minhas roupas. E logicamente que me queixei.

- Que droga de espelunca, com seus garçons de quinta. Mancharam minha roupa!

- Me-me, me desculpe senhor, não foi minha intenção.

- Ora seu...

- Calma aí Lorremzinho, respira fundo e da um jeito nisso no banheiro, sem drama, eu resolvo com ele - Dayla me interrompeu  para que eu não fizesse nenhum escândalo, e confesso que estava prestes a fazê-lo.

Acalmei minha respiração, e sai bruscamente da mesa, fui ao banheiro me limpar, e cá estou, escrevendo para aquietar os nervos.

Crónica Dos Magos: Relíquia Dos MortosOnde histórias criam vida. Descubra agora