Capítulo IV_ A Estratégia

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Eu ainda estava fraco, e ele ainda estava na minha casa. Eu tinha de bolar alguma coisa, pra me livrar logo desse cara. Para minha "sorte" ele não estava no seu melhor dia também. E então, decidi que era melhor, eu sair de casa, avisar aos guardas que vi um estranho lá dentro, me afastar ao máximo, e torcer para aquele delinquente não me ver. Foi a melhor ideia que pude bolar numa situação como essa.

Peguei minha mochila e coloquei todo o meu dinheiro dentro. Informei ao estrangeiro que ia comprar mantimentos, e sai pela porta da frente da minha singela casa, de dois andares, teto arredondado, uma sacada, janelas redondas e um jardim fértil com ervas medicinais e plantas mágicas. Na verdade não estava muito confortável em deixá-lo lá, ele pode querer explorar a casa, ficar mexendo em minhas coisas pessoais, só de pensar que ele poderia estar na minha biblioteca, já começo a me arrepiar.

E então, me aproximo de um dos soldados de Carsis, mas conhecidos por, a guarda carsisriana. Suas vestes, além de ser amarela e laranja como a flor de nossa bandeira, também havia detalhes, ou no caso a falta deles, significando que eram da mais baixa patente. A única arma que tinha era para tonteio. Não era lá grande coisa, mas tinha de servir, minha ingênua esperança simplesmente torcia para dar certo. Coisa que minha consciência lá no fundo tinha a impressão de uma grande probabilidade de derrota do meu cauteloso plano.

- Com licença soldado, quero informar lhe dê algo suspeito.

- Diga me, do que se trata?

- Eu vi um, estranho sorrateiro, correr para minha casa, eu fui descuidado e deixei a porta sem proteção. Temo que ele ainda esteja lá dentro.

- Eu posso resolver isso senhor, não se aflija.

Estou mais aflito com o que pode dar errado, e não com o que já deu. Por exemplo se aquele cara me ver e dedurar, eu tô ferrado. Sorte a minha saber o truque do fantasma, também conhecido como encanto invisível, dura em média quarentena e cinco minutos, variando por tamanho e peso. Para mim, ele dura quarentena e sete minutos. Deve ser tempo o suficiente para o soldado entrar na minha casa, algemar e prender o cara, e talvez até vê-lo na sela, para ter certeza de que o plano deu certo.

Assim, meu plano foi posto em prática. O policial se dirigiu a minha casa, e eu entrei numa esquina vazia, e conjurei o encanto "ivisibols un tate, encant no voz, nunt farô..." A mesma frase é repetida três vezes pra fazer efeito, que além de deixar invisível, também oculta voz e cheiro, mas o tato permanece, assim como as assombrações, que batem portas e derrubam objetos. Por isso do nome, bom, isso e o fato de que um morto o criou no além túmulo. Voltando ao assunto, eu estava encantado e pronto para prosseguir.

Eu segui o guarda dentro de minha própria casa, ele entrou dizendo "olá, eu sei que está aí", sinceramente, eu esperava mais discrição da parte dele, porém o trabalho é dele. Subimos as escadas, e sinto um frio no estômago, quando chego perto da porta de minha biblioteca, e ouço um som, o guarda se vira e abre a porta. E o idiota, está de pé, se apoiando nas costas da cadeira com uma mão, e um abridor de cartas na outra. Eu reparei que tinha tinta fresca no recipiente, e algumas manchas recentes em minha mesa de madeira escultural, era revoltante. Mesmo assim, me deixou curioso pra saber, com o que havia desperdiçado minha tinta. O soldado não teve trabalho, o cara cambaleou assim que ele pegou a arma (de tonteio). Apontando sua arma falou, "solta o abridor garoto, você não vai conseguir nada com isso". O engraçado é que, ele soltou mesmo, talvez tenha percebido que estava fraco de mais pra arrumar encrenca, ou algo assim.

Então, fomos a delegacia. E eu ainda tinha vinte e nove minutos. O colocaram na cela quatro (eu particularmente não gosto de número par). A questão é, eu estava me lixando, para onde ele ia, só queria saber o que ele carregava, e o que escreveu. Eles também não se atreveram a tirar o amuleto mágico do rapaz, fora isso tudo estava sendo guardado, eu tinha de ser discreto. Só que, em um vilarejo pacato como Carsis, era óbvio que não tinhamos muitos crimes, e aquele jovem tinha sido o primeiro preso em cinco semanas, o último foi um ladrão de cartas. Os guardas ficaram tão empolgados com um novo caso, que começaram a olhar as coisas do jovem de imediato, enquanto ele murmurava que um homem morto havia deixado entrar na casa. Meu plano funcionava bem, mas eu tinha de achar o bendito papel, por questão de princípios. Quando levantaram o casaco, um papel dobrado caiu no chão, eu me abaixei e o abri lentamente, os guardas não perceberam, mas tive a impressão de que Caldeufir reparou o estranho movimento do papel, tanto que ele disse olhando para o papel "o que pretendem encontrar aí, alguma espécie de complô, escondido entre minhas coisas." Ele voltou o olhar para os guardas, e continuou "Até onde eu sei, só estou sendo acusado de invasão, e claro, o medalhão." E depois tornou a olhar para onde eu estava. Aquilo me distraiu por um estante, até que um guarda o mandou calar a boca. Eu olhei para o papel, e na primeira linha "análise da missão. Nada nunca é o que parece." Parece idiotice, mas eu não podia ficar sem essa informação, então usei o melhor feitiço de cópia de mensagens, muito utilizado pelos escribas, tenho sorte de saber dessas coisas. Pus a mão direita sobre o papel, e absorvi cada palavra, com o feitiço "copios". Com isso, pode-se retirar textos inteiros, e passear para outros lugares, eu uso para repaginar livros, quando as folhas estão gastas.

Enfim sai da delegacia, com minutos suficientes para chegar em casa. E foi o que fiz, entrei, limpei os sapatos, subi as escadas, entrei em minha preciosa biblioteca, peguei uma folha em branco e passei o feitiço "copios". Em questão de segundos o texto ganhou forma, e estava pronto pra ser lido.

Crónica Dos Magos: Relíquia Dos MortosOnde histórias criam vida. Descubra agora