POV- Bryan
Depois de respirar por um tempo, deixei Hannah encostada em uma parede e decidi analisar o lugar onde estávamos. Estava escuro, sem nenhuma fonte de luz, então peguei meu comunicador e liguei a lanterna. O prendi na orelha pra não ter que ficar segurando. Estávamos em um túnel, e o lugar onde a porta tinha aparecido era um beco sem saída. Eu conseguia ficar de pé, mas mesmo assim o túnel não era muito aberto. Se eu esticasse os braços pro lado, conseguia encostar as duas mãos nas paredes.
Pelo que pude sentir, as paredes eram feitas de terra. Peguei meu comunicador pra tentar avisar alguém. Sem sinal. Tudo bem, estávamos presos debaixo da terra em algum lugar dos Estados Unidos sem ideia de como sair.
- Hannah.- chamei. Ela estava sentada apoiando a cabeça na parede. Ela grunhiu pra mostrar que tinha escutado. Era um milagre até que estivesse consciente, mas tinha que tentar.- Sabe onde estamos?
Ela pensou por um momento e chacoalhou a cabeça. Tudo bem. Só tínhamos que andar até achar uma saída. Não era tão difícil.
- Hannah.- chamei de novo.- Sei que escapamos, mas não duvido nada de que os oniah tenham um jeito de fazer a porta voltar aqui. Temos que andar um pouco.
Ela assentiu, mesmo que não parecesse querer se mexer. Estava exausta. O cansaço era visível em seus olhos e mesmo assim ela fazia o possível para parecer bem. Tentou se levantar sozinha, mas quase caiu. Só então ela aceitou a minha ajuda.
Acho que foi a primeira vez que Hannah se permitiu ficar vulnerável assim na frente de alguém. Ela sempre parecia forte, e recusava a ajuda de todos, dizendo que estava bem. Acho que se ela não estivesse tão mal, estaria fazendo isso agora. De algum jeito isso só me fez admirá-la mais.
Andamos, andamos e andamos. Nosso ritmo era lento, mas mesmo assim em pouco tempo já tínhamos aberto uma distância considerável entre nós e a entrada. Os túneis eram todos iguais, e se dividiam em todas as direções. Me perguntei se estávamos em alguma parte do Labirinto. Conforme avançamos, pequenos cristais coloridos começaram a aparecer. No chão, nas paredes e no teto, eles forneciam luz o suficiente para enxergar sem a lanterna. Quando achei que já tínhamos nos afastado o bastante, deixei Hannah sentar e tirei minha mochila das costas.
Peguei um kit de primeiros socorros e comecei a cuidar dos ferimentos dela o melhor que conseguia. Hannah aproveitou nossa parada pra descansar. Seus machucados não eram muito sérios, mas eram muitos. Hematomas, cortes e ralados, tantos que não sabia como ela ainda andava. Como se isso fosse pouco, ela ainda estava com o tornozelo torcido e alguns ferimentos internos que eu não tinha como curar. Tentei fazer meu melhor, e evitei lhe dar muitas amoras.
- A gente tem que ir.- fazia tanto tempo que não ouvia nada sem ser nossos passos que me assustei com a voz dela. Hannah estava rouca e falava com dificuldade, mas isso não a desestimulou.- Temos que seguir em frente.
- Tem certeza que não quer descansar?- perguntei.
- Temos que ir. Posso descansar depois. Ainda estamos muito perto.
Assenti. Sei que qualquer pessoa normal que estivesse na minha situação teria protestado e insistido pra Hannah dormir e descansar. Mas eu não era uma pessoa normal. Além disso, eu pude ver nos olhos da Hannah que ela não queria ficar parada sem fazer nada. Ela não queria ser o motivo da gente não avançar. Não queria ser um peso. Uma preocupação. Se era o que ela queria, eu ia fazer isso.
A ajudei a se levantar e voltamos a andar pelo túnel. Passei meu braço pela sua cintura e ela se apoiou em meus ombros. Ela mancava e o esforço que o simples ato de andar a causava devia ter sido o suficiente para me fazer parar. Mas não foi. Podia ver junto com a dor e o cansaço a determinação que ela tinha em continuar andando. Um passo depois do outro.
Quando finalmente paramos de novo, depois de várias curvas e túneis diferentes, entramos em uma câmara relativamente maior que os túneis, ainda que pequena, pontilhada por cristais brancos. Deixei Hannah deitar e dormir enquanto montava acampamento e preparava armadilhas para proteger nosso perímetro. Quando terminei, sentei para descansar e olhei os cristais à minha volta. Era lindo. Já tinha uma vaga ideia de onde podíamos estar e ia discutir as possibilidades com Hannah depois que ela acordasse. Ela parecia tão calma dormindo. Era outra pessoa. Parecia tranquila, inocente e feliz como eu nunca a tinha visto. O passado de Hannah era um mistério para a maior parte dos guardiões, e me perguntei o que aconteceu para fazê-la deixar de ser a garota que eu via agora.
POV Hannah
Eu tinha sete anos de novo. Estava encolhida em um beco escuro tremendo de medo. Achava que ia morrer. Que minha sorte tinha finalmente acabado. Então ela apareceu. Cabelos ruivos ondulados compridos e olhos tempestuosos. Bem mais velha que eu. Aos meus olhos ela parecia uma deusa. Não vi o que ela fez direito. Estava surpresa demais. Ela agachou na minha frente e estendeu sua mão.
- Vem, vamos embora daqui.
Quando peguei em sua mão, o cenário mudou.
Agora tinha quinze anos. Estava em um morro no meio de uma campina, lugar que reconheci como sendo a base temporária dos guardiões montada entre o Acampamento Júpiter e o Meio-Sangue, criada para atrasarmos os romanos e dar mais tempo pros gregos se organizarem durante a guerra dos Gigantes. Mesmo assim, éramos forçados a recuar mais a cada dia. Era difícil impedir a legião de avançar sem nos revelarmos.
- Eu volto logo tá?
A fala me tirou dos meus pensamentos e me fez focar na pessoa na minha frente. Não. De todas as memórias que eu podia lembrar porque justo essa? Não podia rever essa cena, não de novo. Não depois de me esforçar tanto para esquecer. Mas agora não podia fazer nada.
- Eu vou te esperar.- respondi. Mas não era eu. Estava presa em meu próprio corpo sem poder fazer nada, só olhar. Ele apertou minha mão uma última vez e correu para se juntar ao seu grupo. Eu gritava, implorava pra ele não ir, mas ninguém escutava. Queria correr, gritar, chorar, fazer qualquer coisa pra tentar mudar o que ia acontecer. Mas não dava. Ninguém podia mudar o passado.
Perdida em desespero, a cena se desfez em sombras a minha frente, e comecei a recobrar a consciência.
Conforme fui acordando lentamente, ainda num estado de semiconsciência, consegui pensar "Bem, obrigada cérebro, por me fazer lembrar todos os motivos do porquê construí meus muros. Como se eu fosse conseguir esquecer um dia."
...
Acordei com um sobressalto. Ainda lembrava de meus sonhos, e senti que poderia chorar. Mas não aqui. Não com o Bryan olhando. Não tinha chorado enquanto dormia, então podia tentar continuar com a fachada. Mesmo que depois de tudo que passamos ontem, duvido que ele vá acreditar. Respirei fundo e pus a máscara de controle que usei todos os dias pelos últimos dois anos. Olhei em volta. Estávamos na mesma câmara que eu lembrava vagamente de ter entrado ontem. Era mais alta que os corredores, de terra com cristais brancos iluminando tudo. Bryan estava de costas pra mim e aparentemente ainda não tinha percebido que eu tinha acordado.
- Bom dia.- disse, chamando sua atenção.
- Bom dia.- ele sorriu.- Quer comer?
Assenti e ele me passou uma maçã e uma barrinha de cereal.
- Como você tem toda essa comida?- perguntei enquanto comia.- Era pra ser uma missão de duas horas.
- Gosto de estar preparado para tudo. Incluindo ficar perdido em túneis subterrâneos.
- Ainda sem sinal?- perguntei, mesmo sabendo a resposta.
- Nada. A única coisa que nossos comunicadores podem fazer agora é mostrar o horário e servir de lanterna. E antes que você pergunte, são 08:37.- ficamos em silêncio por mais um tempo, e podia ver que ele debatia se me contava ou não alguma coisa. Esperei.- Hannah, eu tava pensando ontem, e eu tenho uma ideia a respeito de onde a gente tá.
Isso chamou minha atenção. Depois de passar a noite aqui, já tinha certeza que não estávamos no Labirinto. Já tinha ido lá em uma missão três anos atrás, para vigiar um grupo de campistas do meio-sangue que tinha se enfiado lá dentro. Mesmo assim, os corredores de terra não seguiam nenhuma ordem lógica aparente, e não conseguia lembrar de nenhum lugar dos Estados Unidos com túneis longos o bastante.
- Lembra da história que contaram pra nós a um tempo, sobre a antiga central dos guardiões?- assenti, lembrando vagamente da história contada pelos veteranos sobre a base que os guardiões tinham cinquenta anos atrás.- Então, eles disseram que a base era tão escondida que não tinha como chegar a menos que soubesse aonde ia. Também contaram que ela era rodeada por um complexo de túneis que levava a todos os lugares dos EUA. Que ele ficava mais próximo da superfície que o Labirinto de Dédalo, mas que nele dava pra percorrer enormes distâncias em pouco tempo igual ao original. Eu acho que...
Entendi onde ele queria chegar.
- Que estamos nos túneis que formam o labirinto da antiga central.- completei a frase.
- Isso- isso é bom né?- perguntou Bryan inseguro.- Quer dizer, significa que podemos chegar até a nossa central por aqui.
- Não sei.- suspirei.- Se a gente soubesse como se orientar aqui, talvez. Mas não é com isso que eu to preocupada. Lembra das histórias? O motivo deles terem que sair? Tinha algum tipo de parasita pelos túneis, e no fim eles não conseguiam mais resistir. Tiveram que fugir.
Ficamos calados por mais um tempo. Se eu conseguisse descobrir um jeito de saber onde estávamos, ia ficar infinitamente mais fácil sair dali. Uma lâmpada se acendeu na minha cabeça. Tinha uma grande chance de não funcionar, mas estávamos no fundo do poço, não tinha como ficar pior.
- Bryan, me dá seu comunicador.- ele pareceu surpreso pelo meu pedido, mas fez o que eu disse. Peguei meu comunicador e juntei os dois, aumentando o sinal.- Isso. Ainda não dá pra falar com ninguém, mas pelo menos sei onde estamos. Texas.
- Você é um gênio, sabia disso? Acho melhor irmos andando então.
Ele começou a recolher as coisas enquanto tentava me levantar. Quando fiquei de pé, uma dor excruciante no meu tornozelo direito quase me fez cair de novo. Porcaria de tornozelo. Nem quebrado estava, se eu deixasse ele quieto por algumas horas ele logo voltaria ao normal, mas eu não tinha esse luxo. Respirei fundo e me apoiei na parede, enquanto tentava pular em um pé só. Do jeito que era desastrada, ia cair de cara no chão. Bryan notou o que eu estava fazendo e riu.
- Acho melhor eu te ajudar por enquanto.- ele passou o braço pela minha cintura de novo, e agora que não estava quase morrendo que nem ontem, me senti levemente envergonhada por estarmos com os corpos tão colados. "Hannah não seja boba, não tem motivo pra você se envergonhar. Você só torceu o tornozelo e ele está te ajudando a andar. Nada demais." Não importa o que eu pensasse, não consegui impedir meu rosto de corar. Abaixei a cabeça e graças aos deuses Bryan não notou nada.
Começamos a andar e eu me desliguei. Fiquei grata por Bryan não ter insistido para eu descansar. Não queria me sentir inútil. Não queria parecer vulnerável. E ele não disse nada, não perguntou por quê. Não sabia o que diria se ele perguntasse. Continuamos indo na direção que esperávamos ser o Norte. Os túneis eram todos iguais, a única diferença sendo as cores dos cristais de uma área para a outra.
Viramos mais uma curva e suspirei.
- Bem, isso vai ser divertido....
Gente desculpa mesmo pela demora, aconteceu muita coisa nesses últimos dias e não deu pra postar. Mas não se preocupem que eu não vou parar de escrever. É uma das coisas que eu mais gosto de fazer. Vejo vocês semana que vem!
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Guardiões do Olimpo
FanficE se os semideuses não fossem os verdadeiros heróis? E se todos esses anos sempre teve alguém por trás para protegê-los e evitar que eles morressem? E se eles tivessem tido uma pequena ajuda desconhecida, mas essencial? Está na hora de conhecê-los...