JAKE
Layle não respondeu a minha mensagem, talvez ela já tenha desistido de mim, não poderia culpa-la, eu já tinha errado muito, eu já tinha adiado de mais, até mesmo alguém forte e insistente como ela desiste. Não dormi bem e acordei cedo, já que o campeonato começava hoje. Estava terminando de vestir meu uniforme quando minha mãe entrou:
-Nós vamos assistir a estreia de vocês hoje, seu pai tá mais ansioso que você.
-Eu não tô ansioso.
-Eu sei, você deveria estar, não é só porquê ganhou a bolsa que pode relaxar, dê o melhor de si.
-Eu não ligo pra essa bolsa. Não ligo pra esse campeonato, não ligo pra mais nada envolvendo essa escola.
Minha voz saiu alterada, nem eu tinha percebido o quanto estava frustrado. Estava decepcionado comigo mesmo, fracassei em tudo que tentei fazer e muita gente se machucou por causa disso, mesmo assim, eu ia viajar e deixar tudo pra trás como se nada tivesse acontecido.Como se pudesse ler meus pensamentos minha mãe sentou na minha cama e pegou a foto minha e da Layle que estava na mesinha ao lado. Ela ficou observando a foto e eu tenho certeza que trouxe muitas recordações pra ela:
-Quando vocês eram crianças, fomos em um parque e tinha um senhor vendendo colares de conchas e dizia que eram conchas de uma ilha perdida e misteriosa, você ficou fascinado, acreditou em tudo que ele disse, aí você comprou um pra Layle, e prometeram um pro outro que um dia iriam até essa ilha. Se lembra disso?
-E se nossos pais não deixassem, iríamos fugir e viver escondidos naquela ilha, me lembro perfeitamente.
Minha mãe começou a rir com a lembrança e eu acabei rindo também, muitas vezes eu me esqueço dessas lembranças da minha infância, mas foram momentos do qual eu não me arrependo:
-Será que vocês ainda vão encontrar essa ilha?
-Eu duvido muito.
-Espero que encontrem, prometeram um pro outro que iriam até lá, não é algo que se esquece, e isso não vale só pra você. Ela também deve se lembrar, mas não vai saber o caminho sozinha.
-Aonde a senhora tá querendo chegar?
-Desculpa, mas é um caminho que só vocês dois podem encontrar.
Ela saiu e me deixou sozinho, queria acreditar no que ela disse, mas sabia que minha vida e a da Layle tomariam rumos bem diferentes. A dela estava ligada a uma boa faculdade e um emprego dos sonhos alcançados com mérito próprio, já o meu, acho que de uma forma ou de outra sempre estaria ligada ao futebol, e enquanto eu conseguisse jogar bem ia conseguir algum diploma, e talvez pudesse me aposentar antes de me arrepender, que droga de futuro.
Terminei de calçar as minhas chuteiras, me despedi dos meus pais e saí pra escola, como Davie não ia jogar no primeiro jogo sabia que ele não ia chegar cedo. Assim que botei os pés na escola o treinador Benner veio reclamar comigo:
-Está atrasado Willians.
-A abertura do campeonato só vai ser daqui a três horas, por que temos que tá tão cedo aqui, não tem quase ninguém na escola.
-Quero meus atletas bem alongados e preparados pra nossa vitória. Pro campo agora.
Não questionei, fui pro campo e como esperado a maioria dos jogadores já estavam lá, não cumprimentei nenhum, apenas passei por eles e fui pro meu lugar me alongar, o que me consolava era saber que depois desse campeonato eu esperava nunca mais ver eles, mesmo assim Sidney insistia em lembrar a minha existência ali:
-O que aconteceu com você ontem? Não atendeu telefone e não apareceu pra beber com a gente, pensei que tinha amarelado.
-Fui dormir cedo ontem.
-E o que aconteceu com o Davie?
-Foi agredido por alguns garotos de outra escola que estavam zoando ele por ser gay, ele revidou mas estava em minoria.
-Temos que descobrir quem são esses caras e dá uma lição neles, ninguém zoa o Davie além da gente.
Não prestei atenção em que disse a última frase, mas todos os garotos do time concordaram, e conhecendo eles era bem provável que realmente fizessem isso.
-Façam isso sem mim.
Disse com o menor desinteresse possível, pude sentir o clima ficar tenso depois, mas não liguei, apenas me concentrei e fazer os alongamentos, o silêncio foi cortado quando o Wendel chegou cumprimentando todos, senti vontade de vomitar só de olhar pra cara dele, peguei minha toalha de rosto e fui em direção ao corredor.
-Eu vou me hidratar.
Não suportava ficar no mesmo ambiente que o Wendel. Assim que adentrei o corredor vi que vários alunos já tinham chegado, inclusive jogadores de outras escolas, um pequeno grupo deles me encaravam como se pudessem me intimidar. Institivamente fui até o bebedor, estava tomando água quando alguém se aproximou e falou comigo:
-Bons jogadores como vocês precisam que te desejem sorte?
Me ergui e vi que era aquele garoto que estava com a Layle no refeitório quando ela brigou com o Wendel, lembrava que Layle já havia me dito sobre ele, ele também era do clube de xadrez, mas não conseguia me lembrar seu nome:
-Não acho que seja sorte que defina um jogo.
-Não deveria dizer isso pra um jogador de xadrez.
-Você nunca falou comigo antes, só estava me perguntando o motivo de ter feito isso agora.
Eu não sabia o que ele queria, sei que não era me desejar sorte, ele me olhava como se me analisasse, escolhendo as palavras certas, Layle também tinha essa mania, será que era coisa de quem jogava xadrez? Ele me interrompeu antes que pudesse concluir meu pensamento:
-Eu fiquei curioso sobre você. Mas não gosto de tirar conclusões precipitadas sobre as pessoas, então quis ver de perto o quão idiota você é.
-Não acha que tá muito cedo pra uma confusão?
-Não entenda errado, eu não quero criar nenhuma confusão, de certa forma eu sinto inveja de você.
-Por que não fala logo o que quer e dar um fora.
-Você e a Layle? O que vocês dois tem?
A pergunta dele foi mais direta do que eu imaginei, eu não sabia ao certo o que responder ou o que ele esperava que eu respondesse. Ele me olhava de certa forma ansioso, no fim eu respondi apenas:
-Somos amigos de infância.
-Entendo, retiro o que eu disse sobre sentir inveja de você, na verdade eu sinto pena.
Ele saiu e eu fiquei pensando sobre o que ele disse, será que ele tinha algum interesse sobre a Layle? Espero que não, eles eram bem diferentes, e ele mal a conhecia, de alguma forma eu não queria responder que eu e a Layle éramos apenas amigos de infância. Me sentia cada vez mais confuso em relação a ela.
Respirei fundo e fui em direção ao banheiro, me recusei a usar o banheiro dos atletas no vestiário, meus pés meio que me guiaram ao banheiro que os outros alunos usavam, mas especificamente me guiaram pra última porta, e pra minha surpresa não havia nenhuma pichação lá, tinham passado tinta por cima. Estava como novo, fiquei mais frustrado ainda em saber que mais uma vez tinham apagado os erros do alunos pra que eles parecessem perfeitos e serem aceitos na bolsa de intercâmbio.
Estava cansado de tudo aquilo, de todo aquele teatro, de fingir que éramos tão bons quanto a escola dizia, estava cansado de toda essa fachada, de toda essa hipocrisia. Não iria mais fugir, independente das consequências, iria encarar aquilo de frente, e descobrir o que mais a escola estava escondendo, pra poder arrancar as cortinas que escondiam o quanto a nossa escola era podre.
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Nas linhas do destino
RomanceDois amigos de infância, que agora estão no ensino médio, correndo atrás dos seus sonhos e metas, enfrentam uma série de problemas que ameaça a amizade deles. Mas o destino é cruel e a vida imprevisível. Acompanhe o desenrolar e desfecho dessa histó...