Minha tormenta

26

Dentro do quarto escuro de hotel, Charles tentava acalmar o caos habitual de sua mente com uma xícara de chá, embora preferisse o velho e bom café sem açúcar. A melodia suave de uma música instrumental ecoava pelo cômodo, criando um contraste quase cruel com os pensamentos tumultuados que nunca lhe davam trégua.

O celular começou a vibrar incessantemente sobre a mesa à sua frente, interrompendo aquele raro momento de calmaria. Ele franziu o cenho, colocou a xícara sobre o pires com um leve tilintar e pegou o aparelho.

(Ligação)

ㅡ Espero que seja importante ㅡ disse ao atender, a impaciência evidente em sua voz.

ㅡ Uns filhos da puta quase me mataramㅡ respondeu Michael, carregando cada palavra com ódio, mesmo que sua voz saísse rouca e ofegante.

O alerta foi imediato. O corpo de Charles enrijeceu, sua mente processando as palavras com velocidade.

ㅡ Você está bem? ㅡ perguntou, tentando mascarar a sensação ruim que crescia em seu peito.

ㅡ Vou viver ㅡ garantiu Michael, aliviando Charles por um breve instante, até continuar, hesitante: ㅡ Mas...

Charles sentiu o estômago revirar. Ele sabia que aquele "mas" não traria boas notícias.

ㅡ Perdi Kate e Vini de vista.

A informação o atingiu como um soco. Sua respiração acelerou, e ele precisou segurar a xícara com força para evitar que caísse. Antes que pudesse responder, vozes exaltadas no corredor o distraíram.

Do outro lado da porta, a voz desesperada de Vini ecoava, misturada com a de John, que questionava repetidamente:

ㅡ O que aconteceu?

ㅡ Kate sumiu! ㅡ gritou Vini, a voz embargada e rouca pelo choro.

O mundo de Charles parou. O celular escorregou de sua mão e caiu no chão com um baque surdo.

(Fim da ligação)

Sem hesitar, ele se levantou bruscamente, cruzou o quarto em passos largos e abriu a porta antes que os dois o fizessem.

Vini estava no corredor, os olhos vermelhos e inchados, o rosto tomado pelo desespero. John, ao lado dele, parecia um fantasma, tão pálido que parecia à beira de desmaiar.

Charles respirou fundo, obrigando-se a manter a postura. Aproximou-se de Vini e segurou seus ombros com firmeza, mas sem agressividade, como se quisesse ancorá-lo à realidade.

ㅡ Se acalme ㅡ disse, a voz baixa, porém firme, numa tentativa de transmitir tranquilidade, mesmo que ele mesmo não a sentisse.

Vini soluçou, engolindo em seco. O choro tornava difícil que ele articulasse as palavras.

ㅡ Por favor, me conte o que aconteceu. Preciso saber de tudo. ㅡ Charles olhava diretamente nos olhos do rapaz, tentando puxá-lo para a racionalidade.

Vini assentiu com a cabeça, os movimentos frenéticos. Ainda tremendo, começou a falar:

ㅡ Tá bem... A gente tava numa cafeteria. ㅡ Ele parou para puxar o ar, como se organizar as palavras fosse um esforço enorme. ㅡ Eu esqueci meu celular na mesa quando saímos e voltei pra buscar.

Charles permaneceu imóvel, mas seu olhar o incentivava a continuar.

ㅡ Kate... ela disse que ia me esperar na praça em frente. Mas quando voltei, não a encontrei. Procurei por todo lado, gritei o nome dela, mas nada.

John finalmente quebrou o silêncio, a voz suave e um pouco trêmula:

ㅡ E depois?

ㅡ Um morador de rua viu... ㅡ Vini fungou, lutando contra as lágrimas. ㅡ Ele disse que viu uma garota loira entrar num carro. Tinha mais dois caras com ela, e... ㅡ Ele engoliu em seco, sua voz falhando. ㅡ Um deles estava armado.