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O casarão amarelo se destacava na neblina. O céu estava da cor dos restos da lenha que queimara na lareira até restar apenas pó. Os relâmpagos partiam o céu como estrelas cadentes.

O som estrondoso do trovão avisava que uma tempestade estava a caminho, e de fato vinha uma estrondosa tempestade a caminho, uma que marcaria para sempre uma vida.

No interior do belo casarão amarelo, subindo as escadas de mármore até o segundo andar, virando a esquerda, seguindo pela extensão do corredor, havia uma porta com um ''K'' grande e rosa. Atrás desta porta, havia um quarto todo rosê, cheio de pelúcias, brilho e bonecas.

Num tapete enorme em formato de coração se encontrava a pequena Kate. Cachinhos dourados como o sol, pele rosada, bochechas grandes, vestindo um vestido verde-escuro com mangas bufantes que realçava os seus belos e grandes olhos.

Suas íris eram uma mistura de verde com amarelo, atentas no cabelo preto da sua amada boneca, penteava os cachos da boneca com muito cuidado para não estragar.

Os seus pais estavam discutindo no andar debaixo, mas a pequena não se importava porque pensava que eles iam fazer as pazes e ficaria tudo bem.

Estava começando a se preocupar quando percebeu que nem o som do trovão podia abafar a briga. Gritos e choros começaram a ecoar pela casa, tentava não pensar muito no que ouvia e focar apenas na sua boneca.

Escutou passos apressados na escada enquanto sua mãe gritava ''o que vai fazer?'' e ouviu o seu pai responder '' saia da minha frente, Sofia!''

Kate se agarrava na sua boneca torcendo para aquilo acabar, o pai dela gritou ''você me traiu! A sua filha irá pagar caro!''

A porta fez um barulho terrível quando foi arrombada. A pequena e frágil garotinha estava muito assustada quando falou: ㅡ Papai? O que foi? ㅡ o homem de cabelos grisalhos travou os dentes com força como se quisesse quebrá-los.

ㅡ Não sou seu pai! ㅡ Sofia, a mulher de cabelo castanho mel agarrou-se no braço do homem em súplica.

ㅡ Edgar! Eu imploro, deixe ela fora disso! ㅡ gritava em meio às lágrimas que escorria dos seus olhos.

ㅡ Você me fez gastar dinheiro com essa praga! ㅡ esbravejou a empurrando para o lado.

Edgar não enxergava mais a criança como a sua filha, mas sim como um parasita que deveria ser exterminado.

Puxou o revólver da sua calça com esse pensamento em mente, segundos depois, som de tiro ecoa pela casa de uma maneira que nem a tempestade conseguiu esconder. Vizinhos chamaram a polícia, mas era tarde demais.

O corpo da jovem de 16 anos dá um sobressalto na cama, com o coração dolorido de tanto palpitar.

Mais um sonho, ou melhor... uma lembrança que apavora sua mente. Não é apenas um pesadelo; é um resquício de um passado que a assombra constantemente.

Sua mão tremida tenta afastar os fios ondulados grudados pelo suor e pelas lágrimas. A porta se abre com um barulho alto, revelando um homem de estatura mediana e cabeça raspada.

Sua visão embaçada se torna um pouco mais nítida ao encarar o rapaz, que a olha com preocupação. Ele já sabe o motivo do grito, mas mesmo assim...

 Kate  chama baixinho. Ela desvia os olhos para baixo, enquanto seu corpo continua a tremer.

 Está tudo bem, estou aqui  diz ele, se aproximando da cama com lençóis escuros.

Minha tormentaOnde histórias criam vida. Descubra agora