O Felino

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Dia 3

Lena Wilson

Distrito 6

              Lena não tinha exatamente dormido durante as duas últimas noites, apenas havia tirado curtos e perturbados cochilos que sempre eram interrompidos pela imagem do sangue escorrendo por sua alabarda. Não podia se deixar abalar pelo o seu primeiro contato com a morte dentro da arena, aquilo estava apenas começando e se quisesse realmente voltar para casa deveria manter o sangue mais do que frio.

              Não deveria ser mais do que dez da manhã quando ela ouviu o tiro do canhão. O primeiro após a cornucópia. Era impossível não imaginar quem teria morrido e quem o havia matado. Não tinha muita noção de quem ainda restava na competição, mas sabia que Samuel – seu parceiro de distrito –, cinco dos profissionais e o assustador tributo masculino do 8 ainda estavam vivos e duvidava que o canhão representasse a morte de algum deles.

              Ela abriu a mochila e revistou os suprimentos. Ainda restava um pacote e meio de frutas secas e um saco pequeno de bolachas, e sua garrafa de água estava ficando vazia. Ela precisava fazer o caminho de volta até o lago que havia encontrado há um dia e reabastecer, durante esse tempo também deveria procurar por comida já que a fonte tirada da cornucópia não duraria por muito tempo.

              Lena jogou a mochila nos ombros e ergueu-se com a ajuda de sua alabarda. Ainda não havia encontrado um tributo sequer desde a cornucópia, não que estivesse ansiosa por isso, mas ela achava que sua vida na arena até aquele momento estava sendo relativamente tranquila e gostava daquilo, mas sabia que cedo ou tarde os gamemakers tratariam de tornar tudo mais emocionante para a audiência e mais difícil para ela.

              Após uns vinte minutos de caminhada em marcha lenta, Lena chegou até o lago. Antes de se abaixar à margem, ela parou por um minuto analisando as coisas à sua volta. Tudo parecia quieto e do jeito que ela havia deixado na tarde do dia anterior. Atenta ao redor, ela fez rapidamente o que tinha de fazer. E foi ao se levantar que ouviu o som.

              Não era um tributo. Ah não! Aquele som não era humano, se assemelhava a um rugido baixo de algum tipo de animal nada dócil. Ela guardou a garrafa na mochila e posicionou-se segurando firmemente a alabarda com as duas mãos. Conseguia senti-lo espreitando-a de perto e demoraria segundos até atacar. Não sabia o que a esperava e não pretendia ficar ali para descobrir. Sem pensar muito em que direção tomar, ela deu meia volta e correu, mas a criatura não ficou para trás.

              Estava armada a situação. Uma das revelações do 6 estava prestes a virar comida de um animal selvagem e a audiência deveria está polvorosa com essa ideia. Lena não estava conseguindo pensar claramente, apenas palavras feias e insultos surgiam em sua mente, o que não era de ajuda alguma. Ela viu-se em meio a uma pesada e claustrofóbica vegetação cheia de plantas estranhas e espinhos que vieram a danificar o seu rosto, mas isso não foi o suficiente para pará-la, ela continuou até sair em uma pequena clareira rodeada por grandes árvores onde tropeçou perdida.

              Olhando ao redor, ela ergueu-se tomando fôlego. Aquilo ali era um belo palco, perfeito para as câmeras capturarem o seu abate. Lena parou por alguns segundos na tentativa de ouvir algo, mas não havia nada, porém ao virar-se o notou. Empoleirado em uma das árvores, estava uma espécie de felino negro que a encarava com olhos selvagens. Não era tão grande, porém as suas presas, sem sombra de dúvidas, eram bastante afiadas.

              O animal saltou ficando frente a frente com Lena, apenas três metros os separavam. Ela posicionou a alabarda em defesa, aguardando o próximo movimento da criatura. O felino deu uma patada na arma tentando se livrar da mesma, mas Lena revidou a fim de acertá-lo com a lâmina, isso pareceu o irritar fazendo-o avançar de vez pra cima dela. Ela caiu e com toda a força que tinha, usando o cabo da alabarda, protegeu-se contra a mordida do animal. Ela tentou empurrá-lo, mas ele era forte e investia sem parar contra o seu peito usando suas garras afiadas. Aquilo era assustador, muito mais assustador do que a cornucópia, mas ela também não poderia morrer ali, precisava voltar para casa, tinha que voltar e, para isso, precisava se concentrar e vencer aquilo.

              Lena gritou ferozmente e, com esforço, empurrou o animal para longe. Em seguida, erguendo-se rapidamente, o acertou com a lâmina da arma. O animal chiou com o golpe, mas não parou e em sua próxima investida terminou tendo a barriga perfurada pelo espigão da alabarda, que o fez soltar um último e assustador gemido antes de cair morto.

              Tremendo, Lena arrancou a arma do abdômen do animal, respirou fundo e caiu no chão, encarando com fúria uma câmera escondida em uma das árvores. Tinha sobrevivido.

Civilians - Uma fanfic Jogos VorazesOnde histórias criam vida. Descubra agora