Uma Surpresa

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Dia 7

Lena Wilson

Distrito 6

              Sentada de costas para uma árvore, Lena analisava o estranho formato da pedra alguns metros a sua frente. Não estava exatamente cansada ou faminta ou mesmo com medo. Estava com tédio.

              Não sabia se tinha corrido na direção oposta a todos os tributos ou se já havia morrido e estava presa em uma espécie de dimensão solitária. Desde o seu encontro com o assustador felino negro há quatro dias, Lena tinha passado por situações desagradáveis, porém nada em comparação ao que esperava passar dentro da arena.

              Ela havia ficado presa em uma estranha poça de lama movediça, da qual conseguiu sair após vinte minutos arrastando-se pela raiz de uma árvore próxima – aquilo lhe tinha sido particularmente angustiante, a ideia de ser encontrada por um tributo enquanto estava presa e indefesa, lhe aterrorizou até o momento em que conseguiu escapar. Além do infortúnio com a lama, Lena também tinha sido picada por uma grande e esquisita formiga, o que fez a sua mão coçar e inchar de imediato, tornando-a incapaz de usar a alabarda com a mesma aptidão. Isso a chateou ao ponto de fazê-la encarar uma câmera em uma das árvores, erguer a mão doente e soltar: "Ei vocês! Se querem realmente que eu brigue pra valer aqui dentro, consertem isso". Ela achou que não tinha servido de nada, ou que os gamemakers a haviam tirado do ar, mas após quinze minutos, um paraquedas prateado contendo o remédio para o seu problema pousou aos seus pés.

              Não esperava ganhar um paraquedas tão cedo. Na verdade, não estava contando com um. Não tinha sido exatamente simpática durante o seu tempo na Capital. Nas entrevistas mal sorria e falava pouco, além de ser fria e objetiva, até demais, em suas respostas. Talvez as pessoas tivessem interpretado mal a sua falta de entusiasmo para os jogos, imaginando que ela fosse, na verdade, uma grande jogadora cheia de estratégias, ainda mais com toda a produção de sua equipe de preparação que a fez parecer uma jovem mulher sexy de poucas palavras. Lena duvidava disso, mas sabia que se existia alguém a quem deveria agradecer, essa pessoa seria Theo, o seu jovem mentor. Ele sabia como fazer as coisas andarem, tinha uma boa lábia e raciocínio. Ele havia ganhado os jogos seis edições antes daquela, quando tinha seus dezesseis, e naquele ano ele estava bastante confiante de que um dos seus voltaria vitorioso, por isso estava se dobrando para apoiá-los na hora da necessidade.

              Lena espreguiçou-se. Era o sétimo dia na arena e ela estava se mantendo bem. Tinha racionado bem a comida que havia conseguido na cornucópia e há dois dias havia encontrado essa árvore carregada de simpáticas frutas roxas. Quando a encontrou, ela analisou um dos frutos por um breve tempo, o partiu e cheirou o seu interior rosado, parecia saboroso e doce e então, impulsivamente, levou um pequeno pedaço a boca. Nesse mesmo instante, ela arregalou os olhos se dando conta da estupidez que tinha cometido. Aquilo poderia ser venenoso, com toda aquela cor e aroma, mas ela não conseguiu resistir, parecia tão suculento... Isso fez com que aguardasse aflita por algum tipo de efeito colateral que, no fim das contas, não veio. Certificada de que não era veneno, Lena colheu uma dúzia dos frutos, os guardou em sua mochila e, na tarde daquele dia, empoleirou-se no galho de uma árvore e os saboreou enquanto ouvia o silêncio, isso até ser assustada pelo tiro do canhão, o quarto após a cornucópia. Aquilo a fez ficar pensativa durante todo o resto da tarde, até chegar a noite e avistar o rosto de Jaina, a garota do 10, ser projetado no céu.

              Lena respirou fundo e olhou para a copa das árvores acima de sua cabeça, tudo parecia tão tranquilo. Os patrocinadores não deveriam estar felizes em ver o seu dinheiro ser jogado fora. Pra falar a verdade, eles deveriam estar, assim como ela, com um imenso tédio, e no caso deles implorando aos gamemakers que fizessem as árvores caírem ao seu redor.

              Mas não foram árvores caindo que a tiraram do tédio, porém sim uma figura truculenta que a puxou pelo rabo de cavalo e a prendeu numa chave de braço. Lena foi pega mais do que surpresa. Tentou alcançar a sua arma, mas não conseguiu, sentiu-se enforcar e foi aí que se posicionou de joelhos e, com esforço, usando o resto de suas forças, conseguiu atirá-lo por cima de suas costas derrubando-o no chão com violência.

              Finalmente ela conseguiu reconhecer o garoto do 11 que, com olhos muito vermelhos, parecia extremamente transtornado.

              Enquanto tentava segurá-lo contra o chão, Lena aplicou-lhe socos que pareciam ser inúteis, já que ele não parava de revidar. Jogando-a bruscamente para trás, o rapaz livrou-se de sua retenção. Lena bateu de costas contra a grande pedra que analisava mais cedo, e isso a desnorteou por completo. Ele correu e agarrou o pescoço fino dela com as suas duas mãos, ela se debateu e quando achou que aquele era o seu fim, enxergou um punhal atravessar o coração dele. O canhão disparou e o garoto caiu revelando o seu assassino. Ela não reconheceu de imediato a figura em sua frente, mas era ele. Samuel. O seu parceiro de distrito, vestido em preto assim como ela e letalmente armado. Além da leve mochila em suas costas, ele segurava um punhal longo e carregava em seu cinto duas facas e uma grande foice brilhante.

               Ela se arrastou assustada para longe dele e para perto de sua alabarda, tentando desesperadamente ficar de pé.

              – Ei! Ei! – ele começou levantando as mãos.

              Ela parou o encarando sem fôlego por um longo momento, até que ambos entenderam e lentamente abandonaram a defensiva.

              – O que diabos aconteceu com você? – ele perguntou a olhando de cima a baixo. 

Civilians - Uma fanfic Jogos VorazesOnde histórias criam vida. Descubra agora