Capítulo 2: Jason

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A primeira coisa que eu notei ao acordar, foi que eu não estava em casa. Eu não estava em casa há meses.

Ainda estava com os jeans da noite passada, embora estivesse sem camisa. Descobri mais tarde que a camiseta estava jogada na ponta do colchão, embolada junto a outras roupas (que com certeza não pertenciam a mim) e meus sapatos.

A segunda coisa que notei, foi que uma garota dormia do meu lado.

Ela estava de costas para mim, o que deixava impossível ver seu rosto, mas eu ainda podia notar sua pele escura e cabelos crespos e volumosos, brilhando na luz vermelha de um letreiro ao lado da janela.

A terceira coisa que notei, foi que eu estava com uma ressaca fodida.

Meu cérebro estava praticamente pulsando dentro da minha cabeça, meus olhos em chamas. Eu recebia apertos constantes em meu estômago, praticamente nocauteado e pronto para por para fora tudo que foi consumido na noite passada. 

Nesse caso, não seria mais que líquido colorido e amendoim.

Eu cogitei procurar um banheiro na maldita casa, apenas para lavar o rosto com um pouco de água fria e talvez aliviar meu estômago de merda.

Mas eu não fiz isso, porque fazer isso significaria a possibilidade de acordar a garota desmaiada do meu lado. Encarar alguém com quem eu dormi e nem mesmo lembro o nome com a boca suja de vômito não me parece muito divertido. 

Então, eu juntei toda minha força de vontade e o que eu chamo de Habilidade Ninja para me vestir em silêncio e encontrar uma forma de sair do apartamento. Notei que havia uma carteira em cima de uma mesinha, do seu lado do colchão, e como eu não era o maior fã de chaveiros enormes e rosa, deduzi pertencer a garota.

De acordo com sua habilitação, ela se chamava Emily, mas o melhor disso tudo foi que eu pude descobrir o buraco do inferno que eu tinha me enfiado.

Parks Street, 209, aparentemente.

Não perdi tempo em copiar o endereço para os dados de um aplicativo de carona, devolvendo tudo no mesmo lugar logo depois de feito. Eu quase soltei um suspiro de alívio quando o aplicativo informou que havia um carro para mim em menos de três minutos, mas temi que isso a acordasse também. Mantenha a Habilidade Ninja.

Resolvi seguir minha intuição, sentando minha bunda o mais longe possível de Emily que pude. Fechei os olhos por um instante, desejando que ajudasse contra a maldita dor de cabeça, foi apenas questão de um segundo. 

E foi bem quando o celular começou a latir como uma cadela, informando que o motorista já me esperava do lado de fora.

Meus olhos imediatamente se voltaram para a garota, que não fez mais que soltar um resmungo rabugento e mudar de posição no meio do sono. Pude suspirar aliviado quando isso aconteceu.

Tentei andar o mais fluidamente possível quando levantei, atravessando o quarto, a sala e finalmente a saída, mal notei o que estava atrás de mim, eu simplesmente fui embora sem olhar para trás.

O motorista não se incomodou em olhar para mim quando entrei no carro de supetão, úmido e tremendo pela garoa fria da cidade. Foi preciso apenas que eu lhe dissesse o nome do hotel para começarmos o trajeto, o homem em um silêncio confortável e o único som emitido sendo da música ambiente genérica que vinha do rádio.

Eu estava grato pelo silêncio do homem, não estava com saco para responder as mesmas perguntas de sempre que geralmente vinham dos motoristas. Minha cabeça já latejava até mesmo com o som constante da música ruim, ter que responder a ''O ar está muito frio? '' ou ''Quer uma bala, uma água?'' parecia quase que uma tortura.

Então, eu apenas encostei a cabeça na janela, confortável com a sensação fria que o vidro trazia, observando as gotas grudadas pelo lado de fora serem iluminadas pelas variadas luzes de Chicago, que agora, parecia interminável...

O carro parou abruptamente de repente, me assustando para valer. Eu não sabia se havia cochilado ou coisa do tipo, meus olhos estavam meio apagados antes do carro frear, mas era como se eu ainda estivesse consciente ao mesmo tempo, como se as coisas que eu vi pela janela ainda estivessem passando em passando sem parar.

Acho que eu precisava dormir um pouco.

-Hotel Lenizzer, como prometido.

Pisquei um pouco, consciente da fachada interminável do arranha-céu a minha frente.

Eu paguei o que devia ao homem de maneira mais ligeira que pude, tateando o banco de couro para ter certeza de não deixar nada no carro antes de caminhar para dentro do hotel.

O lugar parecia um mausoléu branco e sem vida, exceto por alguns detalhes dourados que vinham do piso de mármore e das pequenas lâmpadas, espalhadas por todo canto. Não dei atenção aos recepcionistas, familiarizado com o lugar para não me preocupar com esse tipo de coisa.

As vantagens de ser filho do dono.

Entrei em um dos elevadores disponíveis depois do que pareceu ser uma eternidade andando por aquele maldito piso escorregadio da recepção, me encostando na parede fria de metal por algum tempo antes do elevador parar de repente, como o carro que saí a minutos atrás.

Segui para a esquerda, onde o quarto de sempre me esperava, tão cheio de vida e aconchegante como todo o resto do hotel.

Por um momento, olhando o quarto impecável e branco, me lembrei de casa. Em como parecia melhor mesmo com o cobertor de qualidade ruim e o chão gelado. E ao me deitar, de roupa e tudo, pensei em como seria repreendido se ele me visse agora e..

Engoli em seco, me pondo de pé com um pulo. 

Eu estava ficando louco, mesmo com álcool e outras coisas ilícitas que demorariam pelo menos uma semana para sair de meu corpo, eu ainda estava sóbrio o suficiente para pensar nele. 

Marchei para o banheiro, próximo a cama gigante e fofa que eu havia me jogado a pouco tempo atrás. Não demorei para tirar toda a roupa suja e ligar o chuveiro, que era baixo o suficiente para que eu conseguisse dar uma cabeçada no objeto, se quisesse. 

O ar do banheiro logo ficou denso, e as coisas além de um palmo de distância eram difíceis de ver sem certo esforço, a água caia continuamente em meus ombros, relaxando os músculos enquanto encostava a cabeça na parede fria de mármore.

Tentei relaxar a cabeça também, tentei concentrar minha atenção para a água que escorria continuamente em direção ao ralo, tudo em vão.

''Tucker..''

Era como um um filme, um filme de merda que nunca parava de rodar. Juntamente com outras coisas: seu sorriso; seus olhos, seu cabelo... suas lágrimas, sua voz trêmula...

Prendi a respiração ao sentir uma dor aguda em minha mão, nem mesmo havia percebido que estava de punhos fechados.

A água levou sague embora quando desfiz o punho, mas a água não levou junto as memórias.


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