Capítulo 22: Calvin

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O hospital era mais frio a noite. 

Tive que revirar em minha pequena mala em busca de um casaco descente, visto que o moletom e a camiseta não serviam de quase nada. Eu podia ouvir a chuva quebrando contra o teto do prédio, escorrendo pelas paredes de vidro. A cidade de Chicago não era exatamente o que eu esperava.

Eu esperava algo cheio de vida, movimentado e colorido. Mas, visto de outro ângulo, era úmida e chuvosa demais. Os letreiros pareciam pontos sem vida no céu sem estrelas. 

Jean estava dormindo, a cabeça estava apoiada em ângulos estranhos e desconfortáveis contra o banco duro. Era estranho ver algo assim. Um garoto crescido tentando dormir em um banco que mal consegue acomodar sua estatura. Então, em um gesto de compaixão, guiei sua cabeça para o meu colo. Ele nem mesmo despertou nesse meio tempo, mas pareceu visivelmente mais confortável, e logo, o senti relaxar profundamente.

Olhei ao redor, para os corredores escuros e os bancos vazios. Louis não estava mais aqui. Tinha deixado o hospital a algum tempo, disse que precisava de um banho e se explicar para o namorado, já que o mesmo estava sem noticias a algum tempo. Não dei muita importância para isso, mas uma parte minha não pode evitar em ficar aliviada com o fato de ele ter namorado.

Coisinha egoísta, cutucou a voz em minha cabeça, me lembrando do encontro com Billy a poucos dias atrás. Meu estômago revirava toda vez que esse pensamento vinha a tona.

Eu já tinha falado com Billy. Expliquei o motivo de ter fugido bem no meio de nosso encontro e de ter pegado um avião para Chicago aleatoriamente. Ele aceitou bem, embora a voz deixasse transparecer decepção mesmo do outro lado da linha, mas não me senti mal por isso. Eu tinha deixado claro de que não estava pronto para outro relacionamento, e que nossa saída era apenas algo casual.

De qualquer forma, ainda era um encontro. Mesmo que sem muita expectativa, era um encontro. E isso me fazia sentir meio culpado, mesmo que grande parte de mim dissesse que não deveria.

Eu ainda estava pensando sobre isso quando as coisas começaram a ficar um caos. Um par de enfermeiras e um médico irromperam o corredor correndo. Minha espinha gelou quando me dei conta do quarto de seus objetivos.

O pai de Jason, que até o momento estava dormindo encostado a porta de seu quarto, tinha levantado em um pulo, a camisa amassada e pisando em seu próprio paletó. Suas perguntas pairaram no ar, mas ninguém estava lá para respondê-las. Jean estava acordado, então eu estava correndo, as coisas parecendo borradas a minha volta enquanto isso. O fim do corredor parecia infinito.

A porta estava escancarada, a equipe médica gritando ordens sem parar envolta do corpo entubado de Jason. Eu tentei entrar por impulso, tudo em mim dizendo que eu deveria correr para ele e abraçar o seu corpo até que tudo se resolvesse, mas uma enfermeira me barrou antes mesmo que eu tivesse essa chance. 

''Os rins estão entrando em falência!'', gritou um dos médicos, checando os aparelhos barulhentos ligados ao corpo de Jason. Uma enfermeira correu até a ponta do quarto, trazendo um par de equipamentos até o médico responsável. 

O pai de Jason gritava com alguém, Jean estava procurando por uma entrada e tudo parecia vibrar e gritar ao meu redor. Meus olhos estavam colados nele. No rosto sem expressão coberto por tubos, as mãos envoltas a agulhas e fios... e tudo que eu conseguia pensar era: como seria a vida sem ele?

A maca foi tirada as pressas do quarto, médicos e enfermeiras ladeando a estrutura enquanto gritavam mais ordens e informações uns para os outros. Eu não sabia o que estava acontecendo. Não sabia para onde estavam levando ele. Eu queria ele comigo agora, daria tudo. Tudo para tocá-lo.

Então lembranças vieram, cegando minha visão em conjunto com as lágrimas pesadas. O rosto dele veio em minha mente em milhares de lapsos e momentos. Todos os sorrisos e os olhares, as frases e as promessas. O que eu faria sem ele?

Eu não estava seguindo em frente, sabia disso no fundo. Estava enterrando ele. Enterrando tudo que aconteceu entre a gente ao invés de tentar superá-lo. Porque eu sabia que não podia superá-lo.

E agora, tudo parecia tão sentido. As brigas sem fim, os desentendimentos, a negação.. tudo tão vazio. As coisas que poderíamos ter vivido e aproveitado. As memórias que poderíamos ter criado.. e tudo porque?

Minhas pernas começaram a ficar fracas de repente, minha visão focando na maca enquanto as coisas ao redor iam ficando turvas, e depois escureciam e..

Jean me segurou. Ele estava sussurrando promessas rasas para mim. ''Ele vai ficar bem'', dizia, de um jeito trêmulo. Do mesmo jeito que eu havia dito quando cheguei.

Então tudo ficou sem sentido. As horas se estendiam sem parar, pessoas correndo de um lado para o outro, seguindo suas vidas enquanto eu só conseguia focar no piso manchado por pegadas. 

Fiquei sabendo mais tarde que Jason tinha sido transferido para outra ala do hospital, onde poderia ser mais bem tratado de acordo suas necessidades. Eu não sabia ao certo o que estava acontecendo com ele, sabia que os primeiros dias não seriam fáceis, mas não imaginava que chegaria a esse ponto. E eu estava tão, tão cansado... 


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