Catarina despertou com um sobressalto. Mirando o teto, agradeceu por ter conciliado o sono depois de rolar na cama por horas a fio, pensando, sem chegar a uma conclusão prática para sua nova situação. Infelizmente as horas dormidas não mudaram sua realidade. Ao levantar logo sentiu retornar o vazio em seu peito.
― Uma hora há de passar ― murmurou, tocando a sineta para que Jena fosse atendê-la.
Depois de suprir suas necessidades matinais, Catarina decidiu escolher o que usaria naquele dia. Queria o melhor vestido. Para a criada pediria que eliminasse com pó de arroz qualquer vestígio provocado pela insônia. Além de descobrir seus reais sentimentos em relação ao conde, aquele encontro em Castle serviu para mostrar que outros tantos viriam, pois faziam parte do mesmo círculo social. Sendo assim, queria que ele levasse dela a melhor imagem.
― Bom dia, senhorita! Folgo em vê-la bem disposta! ― exclamou Jena ao descobri-la ativa.
― Por que o alarde? ― indagou com indiferença, sem olhá-la, separando um vestido dos demais. ― Eu disse que hoje estaria melhor. Venha! Deixe de tanta conversa e me ajude.
― Sim, senhorita! ― Jena se adiantou para obedecê-la.
― Quero que aperte bem o espartilho ― recomendou. ― Esse vestido pede que a cintura esteja bem acentuada. Também desejo que faça um penteado bonito.
― Sempre faço os melhores que sei ― disse a criada, ajudando-a a vestir o espartilho.
― Pois eu quero o melhor ― insistiu Catarina.
― Alguma ocasião especial?
― Uma despedida especial ― revelou num murmúrio, prendendo a respiração para que Jena puxasse as fitas do espartilho o máximo que pudesse. ― Hoje, preciso ser inesquecível para alguém.
― Não sei a que se refere... Fala do conde que chegou ontem à tarde?
― Falo de quem não é da sua conta ― replicou, alisando sua cintura. ― Apenas aperte isso.
Jena passou a vesti-la em silêncio, com habilidade. Ao sair para o corredor Catarina se sentia linda e confiante no vestido verde claro. O cabelo a criada tinha prendido num coque de cachos enrolados que dava a ela um ar nobre, seguro. Nas mãos enluvadas levava seu chapéu de palha para que pudesse circular pelos jardins. Quem a visse notaria a tranquilidade necessária para a ocasião, mesmo que ela não a sentisse.
Ao entrar na sala de jantar descobriu ser a penúltima a chegar. Sua mãe, Marguerite e Logan já estavam acomodados e servidos. O duque lia um jornal que logo baixou para olhá-la. Com o canto de uma sobrancelha erguido, analisou-a de alto a baixo.
― Bom dia a todos! ― falou Catarina, dirigindo-se para a cadeira que o lacaio puxava.
― Há algum evento esta manhã? ― Logan indagou depois de cumprimentá-la.
― Perguntava-me o mesmo ― comentou Marguerite, vendo a irmã deixar o chapéu na cadeira ao lado. ― Pretende ir à cidade?
― Não seria má ideia ― opinou Elizabeth. ― Ontem vi uns cortes de tecido numa das lojas, mas estava fechada. Gostaria de voltar e comprá-los.
― Pois não pretendo ir a lugar algum que vá além dos muros desse castelo ― ela revelou e, despretensiosamente, indagou: ― O conde não se juntará a nós?
― E quem segura aquele homem? ― Logan meneou a cabeça e esboçou um sorriso antes de voltar sua atenção ao jornal, dizendo: ― Alweather teve o desjejum antes de todos e foi cuidar de Sand Storm.
― Sand Storm...? ― Catarina repetiu, unindo as sobrancelhas. ― Onde ouvi este nome?
― Aqui mesmo ― elucidou o duque, virando as folhas do jornal. ― Ontem à noite e no baile de máscaras.
― Ah, sim... Aquele cavalo que ganhou de sua madrasta! Por falarmos dela, por onde anda a duquesa viúva?
― Não tenho a mínima ideia ― Logan respondeu, desinteressado. ― Há anos não a vejo e como nosso vínculo deveria ter se desfeito desde a morte de meu pai, não faço questão de saber.
― Curioso ― comentou Elizabeth. ― Deram-se tão bem por tanto tempo depois disso. Por acaso aconteceu alguma coisa para que a amizade se desfizesse?
― A vida apenas seguiu seu curso, mamãe ― Marguerite falou pelo marido, sorrindo para a ele. ― Duas mulheres não comandam a mesma casa e, como Logan falou... O vínculo entre eles demorou a ser desfeito. Sequer há laços de sangue a uni-los, portanto...
― De fato! ― aquiesceu a baronesa. ― A duquesa viúva era ainda muito jovem. Decerto deve estar à procura de outro marido.
― Decerto que sim! ― Foi Catarina quem encerrou o assunto que se estendia além do necessário. Voltando-se para o duque, perguntou: ― O conde comprou seu presente, não é mesmo?
― Sim, ele é o novo dono de Sand Storm e quer usá-lo como montaria até West Sussex. Como acabei por negligenciar seu treinamento, o frísio se tornou um pouco arisco. O conde está tentando amansá-lo.
― Eu poderia ver isso? ― Catarina pouco se importou se pareceu ansiosa. Queria estar perto de Henry o máximo que pudesse. ― Considera seguro?
― Se deixar as armas aqui, posso levá-la até ele ― disse Logan, zombeteiro.
― Armas?!
― Logan! ― Marguerite simulou repreendê-lo e disse à irmã: ― Meu marido a provoca, pois considera que ontem à noite você duelou com o conde. Bem, confesso ter tido a mesma impressão.
― Se o fiz, foi sem notar e hoje saberei me comportar. Sem armas, prometo!
― Sendo assim, termine seu café da manhã ― Logan anuiu. ― Minha sogra será bem-vinda caso queira se juntar a nós, quanto à minha esposa...
― Ficarei aqui, cuidando de nossos filhos. Eu não me esforçaria dois dias seguidos, querido ― Marguerite o cortou, acariciando a barriga; mania tola, Catarina pensou.
Logan assentiu olhando-a duramente, porém logo suavizou a expressão, sorriu satisfeito e voltou a ler o jornal.
― Agradeço, mas ficarei com minha filha e meu neto ― Elizabeth se esquivou do passeio e recomendou à filha caçula. ― Vi que trouxe seu chapéu, mas leve também uma sombrinha. Não quer manchas em seus braços ou em seu colo.
― Assim farei ― prometeu, agradecida por sua mãe permanecer no castelo.
Quando todos silenciaram, ela bebericou seu chá preto com os olhos postos no cunhado e na irmã. Por vezes ambos se procuravam com o olhar, sorriam como se tivessem dito mil palavras e voltavam ao que faziam. Os duques eram felizes e cúmplices, era notório.
Depois de picada pelo bichinho do amor, Catarina desejava ser capaz de ao menos retribuir com afeto os sentimentos vindos de seu marido. Talvez assim ela vivesse em paz como a irmã, não num inferno como sua mãe. Para tanto, decidiu que não daria esperança a Benedict antes de acreditar que ele pudesse ocupar o espaço de Henry Farrow, aquele que inconscientemente ela sempre esteve esperando.
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E agora, Catarina? Depois de farpas trocadas, tem jeito como?
Estão gostando? Me contem... :)
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Rosa Escarlate [DEGUSTAÇÃO]
RomanceHenry Farrow, oficial da infantaria, herdou título e fortuna do avô paterno tornando-se o quinto conde de Alweather. Libertino experiente, sem vínculos afetivos com a abastada família, de "sangue sujo" graças à veia paterna e pouco familiarizado a p...