― Parem! ― Henry gritou para os soldados que ainda batiam espadas ao longo da praia.
Ouvindo a luta ao seu redor, ele mantinha o ensanguentado florete pressionado contra a garganta do jagter van mense; em sua língua, caçador de gente. Arfante e muito ferido o homem atirou longe a espada que Henry acabara de quebrar e se ajoelhou sem se importar que o fizesse nas fracas ondas. Ambos tinham roupas e cabelos molhados por terem tropeçado na areia irregular durante seu embate.
Estavam num ponto isolado de Hamburg, cidadezinha em formação na província do Cabo Oriental, África do Sul. Os soldados e o capitão ― descaracterizados do tradicional Exército inglês por usarem fardas ocres, acessórios e coldres de couro escuro ―, tinham chegado àquele ponto depois de seguirem pistas e denúncias sobre um grupo de quinze traficantes que viajavam por rotas clandestinas levando homens, mulheres e crianças em seu poder.
O destacamento flagrou os criminosos na praia isolada quando terminavam de embarcar a carga a ser levada ao grande veleiro que os aguardava. Mesmo distante Henry reconheceu a rápida embarcação que zarpou pouco depois de os soldados serem recebidos a tiros. Estes revidaram, mas restou o combate direto em que o som das espadas, dos gritos e das blasfêmias quebrou o silêncio do cenário paradisíaco.
Henry recebeu um tiro de raspão no braço direito o que não o impediu de duelar com fúria e vencer. Agora, lutando para recuperar o fôlego e com a mão livre a apertar um corte no peito, ele acuava seu rival. Sem deixar de encará-lo, tornou a gritar para os homens ao redor:
― Rendam-se, antes que todos sejam mortos! É inútil resistir, seus desgraçados. Vejam! Seu líder se entregou. Estão em minoria. Acabou!
Não demorou até que os seis traficantes olhassem para Henry e confirmassem suas palavras. Ao verem o líder subjugado, atiraram as espadas na areia molhada e caíram de joelhos diante dos soldados antes de levarem as mãos à cabeça. Satisfeito, ignorando o cansaço e os ferimentos espalhados por seu corpo, Henry fincou seu florete na areia e seguiu em direção a eles. Com seu franco enganosamente aberto, o caçador de gente se atreveu a atacá-lo.
Antes que seus homens o alertassem, Henry sacou a pistola que carregava às costas e virou, fazendo mira. Sabia que esta poderia falhar, pois ele várias vezes caiu no mar. Sempre se ergueu com agilidade, mas se a pólvora estivesse molhada, ele morreria. Não naquele dia!
Com um disparo certeiro o conde alvejou o crânio do traiçoeiro rival e, ainda em posição de tiro, ficou a vê-lo tombar para trás e cair na água com boca e olhos abertos.
― Gek kaptein! Gek kaptein! ― gritaram os soldados africanos, agitando no ar suas espadas e mãos livres. ― Mal Engels! Mal Engels!
― Com vosso perdão, é mesmo um inglês maluco, capitão ― disse Ferrels, soldado que ao longo dos anos se tornara braço direito de Henry, tão cansado quanto o superior que passava à sua frente. ― Um dia acabará sendo morto, senhor, se continuar a baixar a guarda daquele jeito.
― É provável ― Henry retrucou friamente, desviando dos mortos, espirrando a água do mar tingida de vermelho enquanto caminhava para o barco em que os escravos foram amontoados. Passando ao lado dos soldados africanos que ainda o exortavam por seu último feito, chamou aquele que lhe servia como interprete: ― Siga-me, Akin!
O moçambicano, negro alto e forte, marchou atrás de Henry depois de embainhar a espada. Tão contrito quanto Henry, Akin se acercou do barco de cinco metros e correu o olhar pelos trinta nativos raptados que se espremiam como podiam. Todos os encaravam com seus olhos negros arregalados, expectantes. Não tardou a falarem todos ao mesmo tempo. Esquecido de seus ferimentos, Henry levou as mãos ao quadril e ordenou:
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Rosa Escarlate [DEGUSTAÇÃO]
RomanceHenry Farrow, oficial da infantaria, herdou título e fortuna do avô paterno tornando-se o quinto conde de Alweather. Libertino experiente, sem vínculos afetivos com a abastada família, de "sangue sujo" graças à veia paterna e pouco familiarizado a p...