Capítulo 16, ou um perfeito cavalheiro

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Sophie estava sozinha, outra vez.

Sentada em sua cela no escuro Beckett, agora Bridgerton, só conseguia pensar na ironia que era sua vida. Ela cresceu feliz, e se viu sozinha, achou que havia se encontrado e ficou sozinha mais uma vez. E quando finalmente encontrou conforto no seio familiar dos Bridgertons, Araminta fez tudo ruir tão rapidamente que não pôde acreditar. Talvez esse fosse seu destino, ficar sozinha pela eternidade.

Os ratos ao seu redor propiciavam uma companhia quase perfeita para a melancolia em que se encontrava, e com certeza lembravam-na de o de era seu lugar. De qual era o alcance real de seus sonhos.

Sophia Maria Beckett Bridgerton, condessa de Kent, havia simplesmente voltado a se chamar Sophia Maria Beckett, e naquela situação ninguém dava atenção para o que dizia. Não importaria se ela gritasse "eu sou uma condessa". Não importaria quem ela tinha se tornado, se estava grávida do Conde de Kent. Ali ela não era ninguém.

De repente o barulho de sapatos ecoou no corredor e Sophie sentiu todo seu corpo se arrepiar.

– Ora, ora, finalmente você está no seu lugar.

Araminta.

~

Benedict chegou em casa logo após o baile e correu em direção ao quarto. Lorde Kilmartin era realmente um homem muito gentil e de excelentes modos, mas nada poderia suprir a saudade que ele sentia de sua esposa naquele momento. Sophie era tudo que ele queria, Sophie era tudo que ele precisava. E ela não estava lá, a única coisa que restava no quarto era o belíssimo vestido de baile que ela usava e que agora servia como uma espécie de cobertor extra para a cama.

– Sophie! – gritou Benedict pela casa. – Sophie!.  Sophie cadê você meu amor?

Ele sentiu que as lágrimas estavam vindo, ele sentiu o bolo se formando em sua garganta.

– Sophie! – disse com uma voz mais suave ao perceber uma luz vindo de seu escritório.

Benedict odiava admitir, mas aquilo lhe havia dado um pouco de esperança. Correu em direção a porta e a abriu com toda a força do mundo, torcendo mentalmente para que a esposa estivesse lá.

E a decepção tomou conta de seu corpo.

Ela não estava lá.

O bolo que se formava em sua garganta transformou-se em uma bigorna e seu peso machucou o corpo de Bridgerton. Ele analisou a cena delicadamente em busca de alguma pista, então percebeu que sua gaveta estava aberta e alguns papéis estavam em cima da mesa. Papéis contendo os dados dos pagamentos realizados a Siena Rosso a pedido de Anthony.

– Não, não, não, não – disse Benedict seguidamente tentando não se entregar àquele sentimento.

– Benedict, o que está acontecendo? – perguntou Eloise da porta.

– Sophie, ela sumiu.

Ele pegou um casaco e uma cartola que estavam pendurados em seu escritório.

– Onde você pensa que vai? – perguntou Eloise quando Benedict marchava em direção à porta.

– Eu vou atrás da minha esposa.

– Onde? Benedict, nessa chuva? 

– Eu seria capaz de encontrá-la em qualquer lugar, Eloise. Nossas almas estão interligadas.

– Sim, mas isso não faz de você um cão farejador.

– Eu não posso ficar aqui parado e esperando.

– Por favor, Benedict!

– Boa noite, Eloise – ele disse enquanto saia pela porta.

~

– O que você quer, Araminta? Não acha que já sofri demais? Não está satisfeita? Seu plano deu certo, estou mais uma vez no lixo, estou mais uma vez no fundo do poço. O que mais você poderia querer? – falou Sophie segurando o choro.

Araminta se aproximou da grade para ver a desgraça de Sophie mais de perto. Cada toque do salto na pedra do piso fazia com que Sophie sentisse um calafrio diferente percorrendo seu corpo. De repente, Araminta soltou uma risada aberta, como uma vila de desenhos animados.

– Eu quero ver o seu fim, eu quero ver você, condessa de quinta categoria. Aliás, falsa condessa. Pagar por tudo que você fez. Quero ver sua pele branca, frágil e delicada queimar na Austrália... se bem que, eu prefiro não ver. Mas, queria ter a consciência de que este seria seu fim definitivo.

– Falsa condessa? – indagou Sophie levantando-se e assumindo sua postura mais austera.

– Ora, bastardinha, é isso que você é. Um lixo, uma filha de prostituta que conseguiu usar seus truques entre os lençóis de seda perfeitos do ingênuo Conde de Kent. Você não tem sangue bom. Você não tem sangue puro.

Um barulho irrompeu no corredor, mas passos mais calmos atingiram a altura da cela de Sophie.

– Com todo o respeito, ou não. A única pessoa neste recinto que não tem um sangue nobre é a senhora. Já que sendo uma alpinista social, nunca teve qualquer ligação genuína com uma família da alta sociedade. E, minha esposa, muito pelo contrário, é filha do Conde de Penwood – falou Benedict.

~

Benedict corria na chuva como um desorientado, ia de em porta, de estabelecimento em estabelecimento e nada. Nada de Sophie, nada da Condessa de Kent correndo como uma fugitiva no meio de uma chuva que naquele momento se assemelhava mais a uma tempestade.

Ele se sentia vazio, ele se sentia como nunca havia se sentido. Aliás, já havia estado daquela maneira, anos atrás quando Anthony fugiu. Mas, desde que Sophie o encontrou, desde que ela o salvou de si mesmo, desde que conheceu o amor, Bridgerton havia se transformado. E sem Sophie, com essa perspectiva em sua cabeça, o mundo parecia preto e branco, um vazio sem fim, sem uma perspectiva plausível para um futuro minimamente feliz.

Benedict já estava perdendo as esperanças quando um homem em uma taverna o chamou em um canto.

– Eu sei o que aconteceu com ela – disse o homem que estava em um canto escuro. – Eu estava na rua quando a vi. Ela parecia desorientada e profundamente triste. Em meio a tanta água eu ainda consegui perceber que ela chorava.

Benedict engoliu em seco.

– Ela estava fugindo e eu tentei alcançá-la. Mas, do nada uma mulher começou a gritar que ela era uma ladra e um guarda próximo correu em direção a ela – o homem bebeu um gole. – Eu obviamente me escondi, já que se fosse visto estaria tão fodido quanto ela.

A última frase ecoou na cabeça de Benedict. Tão fodido quanto ela?

– Eles a levaram para a cadeia – concluiu o homem.

Benedict ficou com mais frio do que já estava devido à chuva, sentiu a onda de energia ser mandada através de seu corpo, mas manteve-se firme.

– Ãh, é, obrigado... senhor... – começou Bridgerton.

– Duque de Ashbury.

Claro, só um nobre tão excêntrico estaria vestido daquela forma, em um lugar como aquele, em meio a uma tempestade.

– Obrigado, Ash – disse Benedict sorrindo para ele e chamando-o pelo apelido que todos sabiam que era o dele.

– Agora vá salvar a garota, Bridgerton! – disse Ash mais alto que o necessário.

– É hora de finalmente ser um perfeito cavalheiro.

O Novo Visconde (uma história Bridgerton) Onde histórias criam vida. Descubra agora