1. emily dickinson não sabe o que é espaço pessoal (sue pov)

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Tudo que eu sempre quis foi que Emily Dickinson me deixasse em paz.

Tudo começou no verão, antes do início da terceira série.

Meu pai e eu nos mudamos para Amherst, Massachusetts, por conta de seu novo emprego. Ele aproveitou a oportunidade porque parte de nossa família morava na cidade, e assim eu teria com quem ficar caso ele estivesse ocupado.

Mesmo com a promessa de diversão, eu não adorei a ideia a princípio, afinal nunca tinha ouvido algo de bom sobre meus tios. Entretanto aqui estamos nós.

- Chegamos. - meu pai disse animado. Ele saiu do carro para ir conversar com o moço da mudança.

A casa era enorme, considerando que somente eu e meu pai morariamos ali. Pela fachada dava para notar que ela possuía dois andares: no primeiro (térreo), à direita da porta, havia duas janelas grandes e, à esquerda, uma varanda que seguia pela lateral da casa. No andar de cima, notei duas janelas e esperava que uma delas fosse a do meu quarto - eu sempre preferi janelas que estivessem voltadas para a rua. Não que gostasse de bisbilhotar a vida alheia, mas aquilo passou a se tornar um certo tipo de passatempo depois que me mudei pra cá. O estilo da casa era italiano, algo que descobri anos mais tarde, algo que a fazia se destacar diante de todas as casas da região. Estava tão ocupada olhando pra casa que nem me preocupei em sair do carro. Até que meu pai aparece na janela deste e pergunta:

- O que você acha?

- É legal.

- Ei, vamos, Sue. Vai ficar o tempo todo dentro do carro? Por que não, uh, você e eu ajudamos a descarregar a van.

- Ok, pai. - Respondo, enquanto saio do carro e passo a olhar para os arredores da casa.

Nós não temos um jardim, mas a fachada da frente estava muito bem cuidada, com as cercas vivas aparadas e algumas roseiras. Dou a volta pela lateral da casa e, nos fundos desta, encontrei um espaçoso quintal e uma árvore gigante - sua casca era cinzenta clara, firme e lisa. Anos mais tarde, aprendi que seu nome era faia americana, ou, como Emily gostava de dizer, a grandiosa faia por conta de seu nome científico, faia grandifolia. Meu pai disse que esse foi um dos motivos por termos escolhido essa casa: ele iria finalmente realizar meu sonho e construir uma casa na árvore. Me lembro de ficar tão feliz e animada quando ele me disse isso. Sai dali e voltei para frente da casa tentando não focar meus pensamentos nisso, criar expectativas não era algo que eu gostava de fazer.

Sinto que estou sendo observada. Viro para o outro lado da rua e um par de olhos me encaram com muita ansiedade.

Nós ficamos paradas nos olhando pelo que pareceu uma década. Para mim, foi o início do que seria mais de meia década de evasão estratégica e desconforto emocional.

Até que ela finalmente atravessou a rua e se apresentou:

- Olá, sou Emily Dickinson.

Ela estica a mão, mas eu não retribuo. Emily tinha o cabelo castanho amarrado em tranças que desciam em ambos os lados de sua cabeça. Tinha minha altura e eu podia notar pelo seu sorriso que seus dentes da frente eram levemente separados. Seus olhos eram da mesma cor de seus cabelos, mas eles brilhavam tanto que, por um momento, eu pude jurar que eram dourados. Ela era tão enérgica que fiquei em choque. Algo em seu olhar me dizia que ela estava esperando que eu me apresentasse também, entretanto nenhuma palavra saiu da minha boca. E o que estava acontecendo com meu coração? Porque ele estava batendo tão rápido? Aquilo era normal? Achei que fosse morrer. Quando me dei conta, a menina estava mexendo nas minhas coisas.

- Ei, ei, o que está fazendo? - Perguntei tirando da mão dela algumas caixas "Será que a mãe dela não a ensinou como se comportar com estranhos?" Pensei. "Na verdade, eu mesma não estou sendo um exemplo de educação, devia me apresentar".

O primeiro amorOnde histórias criam vida. Descubra agora