Eu queria muito esquecer tudo.
Talvez essa seja a desculpa que daria pra Dra. Gomez na nossa próxima consulta, quando ela perguntar o porquê de eu ter bebido tanto.
Nós fizemos um pacto, desde que eu não mentisse pra ela, ela não envolveria meus pais na conversa - a não ser que ela visse que a coisa estava feia.
Era o típico papo psicológico e até eu me sentia como uma adolescente perfeitamente normal - isso de certa forma me confortava, porque eu sabia que não tinha nada de normal em beber na minha idade.
Eu tinha plena consciência do que estava fazendo, tinha consciência do quão horrível foi pra minha mãe chegar em casa no sábado à tarde e me encontrar desacordada no chão do quarto com muitas latinhas de cerveja ao meu redor.
Não é como se eu tivesse passado mal ou desmaiado, eu só estava dormindo depois de ter ficado a madrugada inteira bebendo e tentando esquecer.
Eu queria esquecer tudo que tinha acontecido e toda conversa com Sue. Eu queria esquecer Sue e tudo que ela me fazia sentir.
Eu sempre ouvi dizer que muitas pessoas, ao beberem, esqueciam de praticamente tudo, mas só depois de ficarem extremamente bêbadas e foi isso que eu fiz. Eu só não contava que não importasse quantas latinhas eu tomasse nada mudava.
Assim que eu recobrei a consciência - depois de ter sido arrastada até debaixo do chuveiro e tomado um banho de água gelada, minha mãe cuidou de mim como ela havia tantas outras vezes ultimamente. Sua presença era reconfortante, mas ao mesmo tempo eu me sentia péssima e queria chorar, principalmente por estar fazendo ela passar por tudo isso, mas não o fiz, não consegui, acho que não tinha mais lágrima nenhuma pra cair.
Depois de terminar de me arrumar, nós duas sentamos na minha cama, lado a lado. Ela não me olhava e eu estava encarando minhas próprias mãos sem saber o que dizer.
Até que ela finalmente disse:
- Eu te dei espaço suficiente durante essas semanas, deixei você escolher o que queria fazer, mas agora as coisas não vão ser mais assim. Você vai voltar a falar com a Dra. Gomez.
Eu não a contrariei, eu sabia que isso era a única coisa que iria confortá-la naquele momento.
Então fazia exatamente três semanas que eu tinha voltado a ir às sessões. Elas aconteciam uma vez por semana toda segunda-feira, assim que eu saía da aula.
Hoje era quinta-feira. Infelizmente não era qualquer quinta, era dia de ação de graças. Aquilo na verdade tinha sido um dos tópicos da minha sessão desta semana, por dois motivos: era a primeira vez que veria meu pai em meses e porque seria a primeira vez que teríamos uma festa com todo mundo em casa, incluindo Austin e Sue - como um casal oficialmente.
Não era como se eu não tivesse que lidar com eles quase todo dia na escola, mas eu me tornei especialista em evitá-los, principalmente Sue. Eu não estava fugindo da realidade - era o que eu dizia para Dra. Gomez em nossas conversas - eu só estava me preparando para aceitar aquilo.
Foi na sessão desta semana que percebi que a raiva de Sue estava mal direcionada.
...
- Por quanto tempo mais você vai ficar sem falar com ela?
- Sei lá, pra sempre?
- É isso que você quer? Nunca mais falar com ela?
- Não.
Eu estava sentada na poltrona que, por sinal, era extremamente confortável e ficava de frente a poltrona da Dra. Gomez. Ela, naquele momento, me encarava com seus olhos de raposa, completamente atenta a todo e qualquer movimento que eu fizesse.
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O primeiro amor
RomanceEmily Dickinson acredita piamente em três coisas: a santidade das árvores (especialmente seu amado carvalho), seus poemas e que um dia ela beijará Sue Gilbert. Desde que viu seus olhos castanhos deslumbrantes na terceira série, Emily está apaixonada...