capitulo 11

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Karol


Ainda pensando no que Madame me
falou, cheguei ao ensaio e fui me trocar.
Ela tinha razão. Existia essa coisa, esse
algo. Eu sabia que Ruggero  estava
escondendo algo. Esta aura misteriosa,
seu ar de convencimento. Era bom
demais para ser verdade. Pensativa,
tomei um susto quando senti alguém
parado atrás de mim no vestiário. Estava
meio vestida, colocando as meias
quando ouvi a voz autoritária de simon
— O que aconteceu ontem? Não
quero mais desculpas, tem a ver com as
merdas dos desmaios, não tem? – ele
exige, encarando-me tão profundamente
que pensei que poderia ver minha alma.
— Não... simon, tenho uma coisa...

tomei uma injeção e fiquei mal, não sei
como... – Merda... preciso de uma boa
desculpa. Simon nunca foi alguém fácil
de enganar, e ficaria ainda mais em cima
de mim se desconfiasse de que algo está
acontecendo.
— Que diabos você está falando,
garota? Você está doente? Por que o
hospital não nos notificou? Que tipo de
injeção você tomou? – Ele parecia
preocupado mesmo com aquele jeito
rígido.
— Alergia – falei rapidamente,
abraçando a primeira ideia que surgiu na
minha cabeça e tentando controlar meu
tom de voz, como se fosse algo mais
corriqueiro e não uma mentira para
esconder algo maior — criei um tipo de  alergia severa e preciso tomar injeções
semanais, ontem tomei minha primeira
dose e fui derrubada. Posso conseguir
um documento no hospital confirmando
isso. Não conseguia levantar...
— Que alergia faz isso com alguém?
– uma chamada “tumor”, talvez.
— É uma coisa feia, cria feridas na
pele – falo, aumentando ainda mais a
mentira. Não faço ideia se exista alguma
alergia que faça isso, mas preciso deixar
a coisa feia o suficiente para que Simon
não faça muitas perguntas.
— É você tinha feridas e estava aqui?
Que merda, você poderia deixar meus
outros bailarinos doen...
— Não! – Gritei, interrompendo-o –
não chegou a aparecer. Foi
diagnosticada a tempo, a questão é que
uma vez por semana posso não aparecer.
Sinto muito, simon.
— Isso não é bom... – Ele parou,
colocando a mão nos olhos, como se
estivesse se esforçando para colocar o
pensamento em ordem – me traga um
atestado. Não é como se você fosse
nossa primeira bailarina, no final das
contas. Uns dias não farão diferença.
Simon me encarou firmemente e
fazendo um pequeno aceno, como se
tudo estivesse resolvido e ele estivesse
me liberando, saiu do banheiro. O peso
da mentira era infernal. O meu
rendimento caía mais e mais, e não
havia ensaio que eu não pensasse em
largar tudo e me entregar às dores, os
músculos contraídos e o tremor.
Derrotada sobre tudo que aconteceu
no ensaio, chego em casa para a última
tarefa do dia: arrumar minha casa e
deixar meu lar por um mês. Fiz uma
mala e estava na tarefa de reunir alguns
produtos de higiene quando a campainha
tocou. Em vez de Albert, vi Ruggero  pelo
olho mágico, vestido em mais um
conjunto de roupas sociais. Com um
terno preto de corte impecável que
destacava seus cabelos escuros, os
olhos verdes e o maxilar marcado.
Abri a porta, saudando-o
discretamente, e o vi caminhar para
dentro da minha sala, olhando
curiosamente cada detalhe da minha
casa. A construção não era pequena para  os padrões da Califórnia, dividida entre
pequenas caixas de fósforos e mansões,
mas Ruggero  parecia dominar cada canto
do lugar, fazendo as coisas parecerem
menores. Imaginar Ruggero  em minha cama
delicada era como tê-lo brincando de
bonecas.
— Só preciso pegar a bolsa no meu
quarto, a mala que vou levar é essa –
disse, apontando para o canto da sala –
depois podemos ir.
— Só isso?
— É um mês, não um ano. Não tenho
porque levar mais do que isso.
Dei de ombros, subindo as escadas
para pegar minha bolsa enquanto via o
olhar descrente de Ruggero . Quando desci,
fechei a casa e o encontrei ajeitando a

bagagem no porta-malas de seu carro. A
viagem até o apartamento de Ruggero  foi
tranquila, apesar do nosso silêncio. Não
acreditava que estava fazendo mesmo
isso, iria mesmo até o final.
Ruggero  morava em um duplex perto de
Santa Mônica. Um lugar espaçoso e
moderno em que ele vivia sozinho. Nós
subimos da garagem privativa e a
primeira imagem que tive da sala
enorme foi sua decoração estéril. A
vista era espetacular, apesar de tudo,
principalmente à noite com as luzes do
lado de fora.
— Isso é lindo! – falei, deixando
minhas coisas de lado e apontando para
as janelas de vidro que iam do chão ao
teto.
— Sim, é – ele responde
simplesmente. Seu tom de voz é
engraçado e quando me viro para ele,
Ruggero  está me encarando em vez da
paisagem, como se estivesse falando de
mim e não do que consigo ver do lado
de fora — Vem cá.
Como se um fio invisível nos
conectasse, caminhei para Ruggero , indo
de boa vontade. Não quero pensar nesta
ligação que sinto, que me coloca de zero
a cem tão rápido só de vê-lo, tocá-lo, ou
sentir seu cheiro. Não quero racionalizar
isso, como fiz muitas vezes em minha
vida, quero apenas sentir. Ruggero  me faz
bem mesmo com a forma que cheguei até
aqui, o dinheiro entre nós. Ele é sério,
quase não conversa, mas me faz bem, um sentimento raro desde que fui
diagnosticada com o tumor.
Parei à sua frente, olhando-o
profundamente. Ruggero  me puxou para seu
colo, entrelaçando minhas pernas em seu
quadril e chocando nossos lábios,
rápido e selvagem. Nós terminamos nus,
entrelaçados, suados e respirando
pesadamente sobre a cama.
— Bem, karol , esse é seu quarto –
diz Ruggero  com um sorriso suave. Abri
meus olhos, observando a decoração
simples e o teto alto, confusa porque não
me lembrava de como chegamos até ali.
O rosto risonho de  Ruggero  era
contagiante. Era o sorriso mais bonito
que eu vi. Eu estava muito ferrada
mesmo.

Ruggero

Acordei sozinho e karol  foi a
primeira coisa em que pensei assim que
abri os olhos. Ela estava sendo
mal sucedida em não fazer barulho com o
impacto do que pareciam panelas caindo
no chão. Estava conhecendo a cozinha,
aparentemente. Ontem à noite, tinha
outras prioridades em vez de mostrar o  apartamento, mas gostava de ela estar
tão à vontade.
O duplex era um grande loft, sem
paredes. No segundo andar dois quartos
e no primeiro, a sala, a sala de jantar e a
cozinha, em estilo americano, com uma
bancada grande e espaçosa. Karol
estava abaixada, catando coisas no chão
enquanto resmungava baixinho uma série
de palavrões.
— Algum acidente?
Ela se levantou rápido, como se
tivesse tomado um susto, e caiu para
trás, sentada, como se os joelhos
tivessem falhado. Aproximei-me, e a
ajudei a se levantar, reparando em suas
bochechas rosadas de vergonha.
— Estava tentando fazer café.

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