Capítulo 45

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Sentia as mãos tremerem, os joelhos falhando e uma dor de cabeça, devido a uma mistura de fome, fraqueza e cansaço, me tirando o pouco de foco que eu tinha.

Estava caminhando ao lado de Narcisa, algo que não me reconfortava nem um pouco. Minha coluna estava curvada, meu pescoço inclinado para frente. Tenho certeza que se algum conhecido me visse no estado que estou na rua, não me reconheceria.

Caminhamos por um corredor, era longo e largo, mas tão vazio que deixava um toque de terror no ar. Fomos até a escadaria extensa e Narcisa me segurou pelo cotovelo para que eu conseguisse subir sem fraquejar e rolar escada abaixo. Ela não estava muito feliz em ser minha "babá", mas obviamente essas tinham sido as ordens de Voldemort, e ela não é tola ao ponto de desobedecer.

Narcisa- Faça mais força, se continuar como um peso morto não vamos conseguir subir todos os degraus. - Sua voz era firme, mas tinha uma doçura que só a voz de uma mãe tem. Apoiei o outro braço no corrimão para ter mais equilíbrio e fiz uma feição de cansaço forçada.

Celina- Agora sou um peso morto. Em alguns segundos estarei morta. - Ela hesitou um pouco, não me queria morta, mas não lutaria por mim. Ela se importava comigo, mas quando passei a ser o alvo de Voldemort, perdi qualquer importância. Mesmo sabendo que Voldemort a havia ordenado que me banhasse e acompanhasse até o salão de minha morte, sei que parte dela fazia isso por Draco, pelo seu filho. 

Narcisa- E se não andar rápido estaremos as duas mortas. - Se não fosse pelo meu estado e a situação na beira da morte, riria a plenos pulmões. Mas esse não é o caso.

Por fim chegamos no último degrau da escadaria. Virei um pouco o pescoço e olhei por cima do ombro, vendo o andar debaixo silencioso. Eu provavelmente voltaria morta. Provavelmente não, com certeza.

Nunca pensei que morreria assim, por um dos bruxos mais poderosos, em uma mansão abandonada de madeira escura e velha que rangia ao toque do vento. Se algum dia já quis morrer, hoje não sei mais. Não estava com medo da morte, porque minha alma foi assassinada no dia que fui trancafiada naquela masmorra. Agora restava só osso e carne em mim, e medo não se encaixava em nenhum dos dos dois.

Senti uma mão forte agarrar meu braço e me despertar dos pensamentos de morte. Olhei para ele e não vi seu rosto. Estava com um pano cobrindo a face, um pano vermelho feito sangue vivo. Encarei o guarda um pouco, usava o mesmo estilo de roupa dos outros guardas, mas algo nele me parecia diferente. 

Narcisa- Daqui pra frente vai sozinha. - Sua voz ecoou menos firme, um pouco trêmula até. - Não posso entrar ao seu lado. - "Não posso" é diferente de "não quero". Mesmo eu sendo completamente insignificante para ela, mesmo sendo uma completa estranha, percebi tristeza em seus olhos. Era uma mãe e me imaginou como sua filha. Seu olhar preocupado, com medo, era exatamente igual ao de uma mãe. Naquele momento era como se tivéssemos o mesmo sangue, como se eu tivesse saído de seu ventre e ela não quisesse me mandar para a morte.

E então, nas poucas frações de segundos que ela me olhou, deixei meu coração tomá-la como mãe. Nunca seria uma mãe para mim, mas naqueles míseros segundos, considerei seu olhar triste como uma carícia de amor. 

Ela me deu as costas, mesmo hesitante, e começou a dar passos largos. O som de seu salto contra a madeira ecoou pelo corredor do andar de cima, onde estávamos, e me vi na obrigação de perguntar algo. A dúvida era grande demais para eu carregar comigo morta.

Celina- Aquele quarto - Tomei coragem para falar, mesmo com a voz rouca quase inexistente. - O quarto com um berço, era para mim, não era? - Ela parou de andar, mas continuou de costas para mim. Abaixou a cabeça, não esperava que essas fossem minhas últimas palavras para ela antes de morrer. - Queria um neto, um neto que sairia do meu ventre. Por que?

An angle in hell // Um anjo no infernoOnde histórias criam vida. Descubra agora