EMILY

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Primeiro fecho a porta para abafar o som dos gritos no andar debaixo. Depois fecho os olhos e prendo a respiração. Logo escuto apenas as acusações do meu cérebro contra mim mesma e então esqueço o que acontece ao meu exterior.

Desde quando completos meus dezessete anos, há seis meses, ganhei de presente a briga incansável dos meus pais. Tenho evitado estar envolvida tanto quanto posso – mas perto o bastante para saber que as alfinetadas entre os dois no café da manhã são frustrantes o suficiente -, por isso, mal sei o motivo, e talvez nem eles mesmos saibam. Mas eu sei quão egoísta tem sido a atitude dos dois, pois nem se quer se importam com o quanto isso afeta Randy, meu irmão mais novo, ou a mim. De qualquer forma, é improvável que eu me choque com o divórcio deles, porque há tempos estou preparada pra isso.

Mas, afinal, ao fechar meus olhos, não são eles que me preocupam.

Tenho uma lista de problemas, tirando, claro, o último ano do ensino médio e a pressão perturbadora sobre a universidade, onde eu sei que não estou preparada para estar.

Hoje, por exemplo, sentada em frente ao meu computador, as notícias da morte da minha melhor amiga enchiam as páginas de notícias.

Morte essa logo após a nossa briga dentro do carro. Com ela me contando sua realidade, que por ignorância eu não aceitei.

Como pude?

A ficha ainda não caíra.

Assassinada tão cruelmente...

Meus olhos se enchem de lágrimas.

Eu não posso me conformar com isso. Eu não podia ter brigado com ela. De certa forma, eu sei que também a matei: com acusação, com repreensão.

Os fatos chegam e me enforcam com tremenda brutalidade. E lembrar era a pior parte.

O corpo estuprado, totalmente ensanguentado, jogado em uma caçamba de lixo...

Meu corpo se arrepia enquanto escuto meus pais brigando no andar de baixo. O sol se põe.

Não é legal quando uma garota morre.

Não é legal quando uma garota morre estuprada.

𓆚

JENIFFER BONINI ERA MINHA melhor amiga desde a primeira série.

Ela dissera para mim, certa vez, quando a questionei sobre estar sumida e com intensas olheiras cobrindo os olhos, que estava trabalhando em um restaurante e por isso estava tão cansada. Eu perguntei: por que não me contou antes? E ela disse que saberia que eu ficaria preocupada. E, apesar, de fato, ter ficado preocupada com sua saúde ou qualquer coisa do tipo, fiquei animada com o passo que ela havia dado, considerando sua história de vida.

Certo dia, disposta a fazer uma surpresa para ela, busquei o endereço do restaurante onde ela disse que trabalhava e fui até o estacionamento espera-la, mas ela não apareceu. Entrei no restaurante e perguntei ao gerente se ele podia me dizer se Jeniffer trabalharia naquele dia, e ele me disse que ninguém com aquele nome trabalhava lá. Foi quando soube que Jeniffer escondia algo e decidi segui-la.

Quem procura, acha.

E o ditado se fez certo.

Vi Jeniffer com um sobretudo (provavelmente escondendo os lingeries que exibiria mais tarde), entrando em uma boate. Liguei em seu celular e pedi para ela me encontrar lá fora.

Ela não demorou a me encontrar. Seu rosto estava pálido, raivoso, triste, descoberto. Uma mistura de todas as sensações e sentimentos que queimavam seu coração.

Não olhe para trásOnde histórias criam vida. Descubra agora