EMILY

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Continuo ignorando as mensagens de Johnatan, que de repente parece desesperado e arrependido pelas merdas que falou. Não me importo, não quero saber nada sobre ele.

Estou ao lado de Randy – que parece estar há vários quilômetros daqui, perdido em seus pensamentos. Tento chamar um táxi para nos levar de volta para casa quando um trailer estaciona de vidros abertos na nossa frente.

Meu pai.

- E aí – ele diz, sorrindo, tirando os óculos escuros que antes escondiam seu olhar cansado.

- Pai? – Randy volta do planeta Marte com um semblante confuso e de sorriso nos lábios.

- Vamos, eu levo vocês pra casa – meu pai diz, se jogando sobre a marcha do carro e abrindo a porta.

AINDA NÃO SEI O que sentir ao vê-lo e ao estar com ele desde que descobri seu caso com Jeniffer. Isso era nojento ao mesmo passo que me fazia querer chorar. Com quantas outras garotas menores de idade ele já não teria transado? Tento ignorar esse pensamento. Randy está aqui, não posso transformar isso numa separação entre os dois.

Estamos na fila de um drive-thru, acabamos de pedir o de sempre: Mega-buguer com molho extra, batatas grandes e Coca-Cola sem gelo, mas bem gelada. Sei o que acontecerá depois: vamos parar estrategicamente no estacionamento gratuito do shopping e vamos devorar todos esses lanches.

Relembrar desse ritual que não será mais frequente na minha vida quase me faz chorar.

Meu pai estaciona o carro e entrego o saco de papel para ele e Randy, no banco de trás.

- Como vocês estão? – meu pai pergunta, antes mesmo de abrir seu saco de lanches. Por algum motivo, sou pega de surpresa.

- Estou bem – digo, com sinceridade – Quer dizer, ainda não tive chance de me despedir da Jeni, o velório dela parece ser... complicado e vai demorar ainda. – Sob a menção do nome dela, agora reparo ele engolir seco.

Meu pai não diz nada. Acho que prefiro assim.

- E você, Randy? – Ele pergunta, olhando pelo retrovisor.

Randy engole o lanche com a ajuda de um gole de Coca antes de responder.

- Ah – dá de ombros – Acho que estou bem, sei lá.

- Que bom – meu pai responde, balançando a cabeça. Percebo que ele quase não come.

- E você, pai? – pergunto – Como você está?

Ele solta um riso abafado antes de continuar. Que droga! Seus olhos estão cheios d'água?

- Estou bem – ele responde, mas sei que vai continuar, então espero, beliscando uma batata – Quer dizer, aprendendo, né – sorri, mas não da maneira como sorríamos quando saímos os quatro para um dia de sol na praia. Agora ele sorri de maneira triste como se fosse o último sorriso que daria na vida – Acho que a mãe de vocês já deve ter falado, mas nós terminamos.

- Sim, ela falou – murmuro, abaixando a cabeça.

- Mas está tudo bem. – Ele diz – Minha relação com a mãe de vocês não tem nada a ver com a nossa. Ainda vou buscar vocês na escola sempre que eu conseguir, nos veremos sempre que der, e assim que eu tiver um lugar novo pra ficar, vocês vão me visitar.

- Pai? – Randy o chama, ele encara pelo retrovisor – O que aconteceu?

Meu pai dá um longo e pesado respiro antes de responder.

- Adultos são... complicados, vocês vão entender isso um dia, quando tiverem casados, namorando, sei lá – mais um sorriso, de esperança dessa vez. – Mas não importa agora. Quero que vocês fiquem firmes. A gente continua sendo uma família e eu vou amar vocês pro resto da vida – ele sorri ao dizer isso, mesmo que seus olhos estejam tristes.

- Eu também amo você – digo, triste.

- Também amo você, pai – Randy sussurra, sua batata intocada.

- Pra onde vão agora? Querem ir pra casa? – meu pai pergunta.

E nós vamos cantando Faroeste Caboclo até parar em frente ao portão.

Quando saio do trailer, me despedindo com um beijo, vejo por fim o carro virando a esquina.

Tenho a impressão de que essa seria a última vez que overia.

Não olhe para trásOnde histórias criam vida. Descubra agora