EMILY

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- Boa noite – Jorge diz – Espero não ter atrasado.

Sua voz era baixa e rouca. Quente como fogo. Sorria com malícia e gentileza e sua pele parecia tremer sob a baixa luz.

Minha primeira sensação é de tremor. Meu pai havia acabado de sair de casa, eu havia acabado de descobrir isso, e agora, um cara estranho entra pela porta com naturalidade e se apresenta como meu padrasto?

Muita informação pra processar.

Era como se, naquela semana, eu estivesse fazendo parte de um filme de baixo orçamento de sessenta minutos, onde tudo deveria acontecer rápido para que houvesse tempo de o roteiro contar a história toda. Mas a merda do roteirista não havia deixado espaço para que eu respirasse e absorvesse os acontecimentos.

Fecho os olhos e contenho o nervosismo. Apesar disso, aquele homem era deslumbrantemente bonito. Não, esqueça o bonito. Ele era lindo, tão lindo quanto a noite que caia lá fora.

Durante alguns segundos, ficamos todos apenas olhando para ele enquanto meu coração se retorcia em mil nós e minha pulsação acelerava. Não sabia se era por ter de lidar com minha mãe namorando um galã de filmes de romance erótico ou pelo fato de tudo ter acontecido rápido demais. A julgar por seu sorriso galanteador, não parecia bem o homem fiel que minha mãe sempre sonhara, mas, aliás, meu pai também não fora, certo? E minha mãe, afinal, muito menos, porque, como diabos ela teria conhecido, se apaixonado e aceitado namorar com um cara dentro de um dia? Não, não, ela certamente o conheceu quando ainda estava com meu pai.

Jorge era alto, pelo menos com um metro e noventa. O cabelo escuro como os meus, desgrenhado de uma maneira elegante. Na luz forte da casa, seus olhos verdes escuros brilhavam intensamente como esmeraldas, e a barba por fazer parecia brilhar.

Encaro Randy que analisa Jorge com tanto ou mais cuidado do que eu. Mas ele não só o encara como se estivesse parado em frente a um deus grego, como o julga como um deus. Conheço meu irmão, sei que está furioso e enciumado.

O olhar de Jorge viajou até a mesa e cruzou os olhos de Randy, que o consumiu como fogo.

- Meu pai acaba de sair de casa e você quer colocar outro homem aqui dentro? – Randy se vira abruptamente para minha mãe. Seu tom de voz era profundo e ameaçador, beirando a fúria.

Randy nunca fica furioso.

Minha mãe olha para Jorge e respira profundamente antes de responder. Ela para e pensa em todas as palavras, buscando as certas.

- Queridos – ela começa, ignorando os olhos de Randy – quero lembrar a vocês que eu e o pai de vocês nos separamos e daremos entrada no divórcio em breve. Quero contar, também, que além de esconder outro filho e esposa, ele roubava meu dinheiro... o nosso dinheiro, pra sustentar outra família – ela olha para Randy como se quisesse dizer que meu pai havia arrumado um jeito de substituí-lo. Não é verdade, Randy, quero dizer, ele pode até ter outro filho, mas você é insubstituível. Minha mãe sorri, não como se sentisse vitoriosa, mas numa tentativa de esconder a vontade de gritar.

Minha mente nunca havia ficado tão bagunçada. Assassinato, estupro, traição, padrasto, meu pai e seu caso nojento com a minha melhor amiga. Eu precisava de ar.

Não era novidade que meu pai traía minha mãe, ele sempre fora assediado pelas alunas, e embora eu acreditasse que ele nunca faria algo desse tipo, hoje, quando li o diário de Jeniffer, não restava dúvidas de que eles haviam ficado.

Hoje, pela primeira vez, fiquei com um homem mais velho. O meu professor de educação física.

Ricardo me chamou. Eu estava indo para sua sala, conversaríamos sobre minhas notas naquele bimestre, já que elas se encontravam abaixo da média.

Não olhe para trásOnde histórias criam vida. Descubra agora