Capítulo 12.5 - A Colega de Quarto

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tt: awnchickens

N/A: então, esse é um capítulo um pouco diferente do que vocês estão acostumados. Vocês não queriam flashbacks e cenas do passado? Pois bem, veio aí. No final conversamos. Boa leitura!

***

Agosto, 2012 – Miami

Camila

— Você pegou tudo? — minha mãe perguntou pela milésima vez quando me abaixei para alcançar a bolsa da Nike jogada no asfalto. A academia de polícia não permitia mais do que uma mala simples de objetos pessoais. O objetivo não era ficar confortável. Mas sim ter apenas o necessário para sobreviver pelos próximos sete meses.

— Sim, mãe. Peguei. — Eu inclinei o corpo na direção do chão, enrolando a alça entre os meus dedos e me levantando para encarar os olhos analíticos de Sinuhe Cabello.

Eu queria que ela estivesse orgulhosa. Mas nós duas sabíamos que nada daquilo fazia parte dos seus planos para a minha vida.

— Eu ouvi dizer que eles estão com a Olivia no time de instrutores desse ano. Ela é uma das melhores agentes com quem eu trabalhei. Quando vocês se encontrarem, envie os meus cumprimentos.

Minha mãe ajeitou o terno que cobria o seu corpo, um hábito herdado da sua posição permanente como agente especial no escritório do FBI em Miami. Até nos dias de folga ela se vestia como se estivesse prestes a encontrar J. Edgar Hoover* em pessoa.

— Eu já disse que não quero nenhum privilégio por ser sua filha. Ou filha do meu pai. — Eu acrescentei, sem conseguir ignorar a sombra de tristeza que cruzou os olhos castanhos parados na minha frente. Já fazia mais de dez anos. Mesmo assim, sempre que ele surgia nas nossas conversas, minha mãe ainda me olhava como se tudo tivesse acontecido ontem.

— Você é uma Cabello, Camila. — Ela segurou os meus ombros e deu um sorriso que não deixava claro se odiava ou gostava desse fato. — Muitas pessoas vão te conhecer aí dentro. Quer você queira ou não.

— E você não parece muito feliz com isso. — Ela deu um passo à frente e repousou as mãos no meu rosto.

— E você não pode me culpar. Eu vi muitas pessoas morrendo nesse trabalho. Eu perdi o seu pai para esse trabalho. Você não pode me culpar por não querer te ver seguindo essa tradição de família.

Era o mesmo discurso que eu ouvia desde que tinha terminado o ensino médio. Eu deveria pensar em outras opções. Tentar outras carreiras que não envolvessem sair todo dia de casa com uma arma na cintura e um alvo no peito. Mas aquilo corria no meu sangue. Alguns chamados eram impossíveis de não serem atendidos. Esse era um deles.

— Eu fiz tudo que você pediu. Eu fui para a faculdade. Eu me formei com as melhores notas.

— E mesmo assim, você ainda quer ser uma policial. — Minha mãe me interrompeu quando entendeu para onde aquela conversa estava indo. — Eu sei. — Ela deu dois tapas leves na minha bochecha. Um gesto de carinho, não de punição. — Você é uma mulher adulta. Eu não posso mais interferir nas suas escolhas. Só volta inteira para mim. Hoy y siempre.

O mesmo medo que habitava os seus olhos desde que eu tinha decidido brincar de polícia e ladrão pela primeira vez aos seis anos ressurgiu. Aquela era a vida dela. A vida do meu pai. A vida do meu avô e do meu bisavô antes dele. Mas minha mãe não queria aquela mesma vida para mim.

— Mãe, é só o treinamento. Eu posso ser horrível e nem chegar no final. — Mas ela sacudiu a cabeça.

— Você não vai ser. — A sua afirmação saiu enfeitada por um sorriso de quem, pela primeira vez, desejava ver sua filha não suceder em alguma coisa. Ela se inclinou e deixou um beijo na minha testa. — Ele estaria orgulhoso de você. Todos eles estariam. — Apesar das suas incertezas, ela sabia exatamente o que eu precisava ouvir.  Aquilo era o mais próximo que eu conseguiria de uma bênção. — Agora se despede da sua irmã e anda logo antes que eu desista de te deixar ir.

Fire & BloodOnde histórias criam vida. Descubra agora