Frio o bastante para Arrepiar

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Depois que Jin-ah pediu a Kevin para levar minha unica mala ⎯ Que não estava nem um pouco pesada e que eu mesma poderia ter levado ⎯  para o quarto, ela e eu sentamos no sofá para conversar. Sua sala era diferente de todas as outras que eu já tinha visto. No orfanato não tínhamos uma sala tão grande como aquela.

Lustres de vidro desciam do teto.
Ainda não era noite para saber como ficaria quando estivessem acesos, mas eu tinha certeza que deixaria a casa um pouco mais confortável.

A escada que dava passagem para o andar superior era de madeira escura, mas o corrimão era branco trazendo um contraste. Também nunca tinha visto uma lareira de perto. Apenas em filmes ou em novelas. Agora, tinha uma bem na minha frente.

⎯ O que gostaria de comer no jantar? ⎯  Jin-ah perguntou e tive que parar de olhar para os lados para encará-la.

⎯ Ah, eu posso comer qualquer coisa. ⎯ Fiquei um pouco envergonhada. Até lembrar a única comida que eu nem mesmo podia ouvir o nome que já me dava calafrios. ⎯ Bem, eu tenho uma alergia a morangos.

Descobri minha alergia à morangos quando tinha 12 anos. Era aniversário de alguém no orfanato e por obra do destino, o bolo era de morango. Comi aquele bolo como se fosse a última comida que eu comeria na vida, mas me arrependi amargamente depois de fazer aquilo. Até hoje tenho medo de comer morangos por engano, depois de tudo que passei naquele dia.

⎯ Então posso pedir que sirvam o janta às 20h?

Concordei rapidamente. Para mim, qualquer hora estava boa. No orfanato não tínhamos hora exata para jantar ou almoçar.

Quando Jin-ah saiu da sala fiquei sozinha observando a lareira. Naquela casa, tudo se tornava interessante quando meus olhos encontravam. Porém minha atenção teve uma nova coisa para observar assim que passos na escada encheram meus ouvidos.

Um garoto desceu as escadas, com o cabelo muito bagunçado.

Pasei as mãos nas roupas como se tivesse algo para limpar e me apressei em ir ao seu encontro. Embora eu fosse uma órfã e fosse taxada como mal educada por muitas pessoas pelo fato de não ter sido criada por pais biológicos, eu cresci sabendo o que era a gentileza e a simpatia. Esse estereótipo não valia para mim.

⎯ É um prazer conhecê-lo, Cha Eunwoo. ⎯ Estiquei a mão para cumprimentá-lo.

Seus olhos ainda não estavam abertos completamente. Isso significava que ele realmente estava dormindo e tinha acabado de acordar. Demorou um pouco para ele entender o que estava acontecendo e ficamos nos olhando por praticamente 15 segundos inteiros? Não sei se foi bem isso, pois parei de contar quando chegou no sétimo segundo.

Fui muito precipitada em atravessar a sala correndo para cumprimentá-lo?

Minha mão começou a se cansar já que ainda continuava esticada esperando que ele me cumprimentasse. Mas isso não aconteceu.

Ele passou por mim sem nem mesmo dizer um oi, ou bem vida a sua nova casa.

Me virei para olhá-lo se afastar de mim como se eu fosse um fantasma na qual ele não tivesse visto. Mas ele parou de andar e se virou para mim com os olhos mais abertos dessa vez.

⎯ Você é a nova empregada?

⎯ Eu?

⎯ Pode preparar um suco pra mim? Estou morrendo de sede.

Eu realmente estava parecendo alguém que iria trabalhar na casa dele?

Comecei a achar que estava vendo Sra. Choi na minha frente pedido que eu fizesse coisas aqui e ali o tempo inteiro. Não dava pra acreditar se ele estava falando sério ou brincando com a minha cara.

⎯ Por que você mesmo não faz? ⎯  Encarei ele sem piscar. ⎯  Suas mãos me parecem em perfeitas condições.

A expressão no rosto dele ficou indecisão. Por 0,00001 segundos achei que Eunwoo iria cuspir fogo pela boca.

Tive um pouco de sorte quando Jin-ah apareceu e impediu que eu fosse mandado embora.

⎯  Que bom que já se conhecera. ⎯ Disse Jin-ah, se aproximando de nós dois.

⎯ Ah, sim. ⎯ Respondi sem jeito. Na verdade não tínhamos nos conhecido direito. Ele não segurou minha mão de volta e ainda me confundiu com outra pessoa.

⎯ Bom, espero que possam se conhecer melhor durante o bom tempo que vamos morar juntos.

⎯ Tanto faz...

Ele deu de ombros e foi em direção a cozinha deixando Jin-ah constrangida com seu comportamento. Ela me disse que ele seria um pouco difícil, embora eu tivesse achado que não seria nada demais no começo.

Seria bem mais difícil do que eu pensava.

⎯ Me desculpe, Ye-Jin. ⎯ Jin-ah segurou meus ombros e senti que ela estava se desculpando por ele. ⎯ Irei conversar com ele. Você mora aqui agora e ele terá que aceitar esse fato.

⎯ Não precisa. ⎯ Eu disse. ⎯ Eu sou estranha aqui. Compreendo que seja difícil para ele aceitar. ⎯ Fiquei muito quieta e completei. ⎯ Acho que vou desfazer minha mala.

Comecei a subir as escadas lentamente. Não queria mostrar para Jin-ah que estava um pouco deprimida. Mas a culpa foi minha certo? Talvez ele tenha ficado assustado com minha chegada repentina. Talvez eu tenha feito ele se sentir desconfortável, afinal a casa era dele. Ter uma estranha na própria casa era diferente. Ele devia sentir essa sensação.

Eu não sabia como ele se sentia. No orfanato crianças novas chegavam quase o tempo todo enquanto outras saiam felizes com suas novas famílias. Eu nunca pude dizer que aquela cara era minha e que não aceitava mais ninguém lá. Era uma casa compartilhada e nunca seria apenas minha.

Eu não estava nem um pouco pessimista. Era melhor tentar entendê-lo porque essa era a única forma de uma boa relação no futuro. Além disso, eu tinha certeza que podíamos nos acostumar com isso rapidinho.

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