Sete

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Inglaterra, 24/08/1827.

Hoje completa duas semanas que estou presa em 1827, talvez eu devesse simplesmente parar de contar, afinal acho que não voltar para casa nunca.

Eu não consigo dormir porque não paro de pensar nisso, só a ideia de ficar nesse tempo para sempre é aterrorizante. Por isso escapei do meu quarto no meio da noite e fui para o jardim, agora estou sentada em um dos balanços da grande árvore que fica na entrada da casa.

Esse seria um bom momento para tomar o meu vinho barato. Deus, como eu sinto falta da minha casa. Nunca dei muito valor para grande parte das tecnologias, mas agora que não tenho nada, sei como elas são incríveis.

É tudo tão mais fácil no século XXI, lá a gente tem energia, chuveiro elétrico, internet, celulares e uma infinidade de outras coisas que as pessoas do século XIX sequer poderiam pensar na existência. Não tenho nem palavras para dizer o quão difícil é viver sem internet.

Sinto falta até das pequenas coisas... Principalmente dos condicionadores! Meu Deus, o meu cabelo está tão maltratado.

Mas uma parte boa da falta de eletricidade é também a falta de claridade, aqui eu consigo olhar as estrelas. Sempre gostei de fazer isso, acho que por esse motivo fugi essa noite. Eu precisava respirar e me acalmar, olhar para esses pontinhos brilhando no céu sempre me acalmaram, desde criança.

Essa foi a razão de, com cinco anos, eu ter decidido me tornar astronauta, mas obviamente não rolou. Eu acabei trabalhando com contabilidade em uma empresa, disso eu não sinto falta.

— Eu te vi pela janela — eu realmente não estava esperando que alguém aparecesse aqui, por isso quando escuto alguém falar, quase caio do meu balanço, mas me ajeito rápido e o olho assustada para a direção da voz. Levo um segundo para reconhecer a silhueta de William. É impressionante como ele tem passos leves, nunca o escuto chegando e é exatamente por isso que me assusto todas vez. — Atrapalho?

— Você quase me fez ter um ataque cardíaco, Will!

Ele sorri satisfeito, vive me assustando e parece gostar muito disso. Maldito.

Como não respondo sua pergunta, William deve supor que a resposta é "não", já que se senta no balanço ao lado. E a resposta é essa mesmo, gosto de sua companhia.

— Então, o que você está fazendo aqui fora? — Pergunta.

— Olhando as estrelas — digo e depois olho para o céu. — Tem muita luz e muita poluição na minha época, lá é praticamente impossível ver alguma.

— Acredito que a senhorita não deveria estar aqui fora sozinha, pode ser perigoso.

Sei que ele só está preocupado que algo ruim aconteça, afinal estou sozinha de camisola no meio do jardim, mas não consigo não ficar irritada.

— Eu não sou indefesa, porra.

Acho que essa é a primeira vez que William me escuta realmente falando um palavrão, se ele não tivesse me irritado eu provavelmente teria rido de sua reação.

— Você tem a boca muito suja, Catarina — ele responde.

Dou um sorriso malicioso.

— Ah, sim, as mulheres também xingam, sabia? Inclusive, no meu tempo nós temos muito mais liberdade.

Minha intenção ao vir aqui era me acalmar, mas estou tão irritada com tudo. Nem é totalmente culpa de William eu também ter me irritado com ele. Acho que por mais que eu diga que está tudo bem, eu não estou tão de bem assim com o fato de que estou presa nesse lugar estranho.

Através do Espelho (COMPLETA)Onde histórias criam vida. Descubra agora