CAPÍTULO I - FRANÇA ANTÁRTICA, 453 ANOS ATRÁS

273 9 7
                                    


- Você ainda vem aqui, meu filho? - disse uma voz bem atrás de uma frondosa árvore.

- Ainda usa de alusões, meu Pai? - respondeu outra voz, porém, esta parecia indiscutivelmente fria.

Era uma noite fria, porém, enluarada. Pequenos casebres emanavam uma luminosidade fraca ao longe daquele gigantesco morro rochoso. O jovem de cabelos negros e rosto perfeito de Anjo, virou-se para fixar um olhar cauteloso à árvore.

- O senhor não deveria andar por aqui com esse tipo de traje. Smoking não faz parte da vestimenta do século XVI.

O homem riu. Seu rosto de mármore polido fitou o garoto que deveria ter seus quase dezoito anos. Ambos eram tão parecidos que quem os visse diriam ser pai e filho.

- E você acha que eu vou me vestir como você, meu filho? Você não envergonha só a nossa raça, vestido assim, envergonha a mim também. Você é um Príncipe...

- Não sou um Príncipe. O senhor que é - o garoto saiu de cima da pedra onde estava e caminhou alguns passos à frente. - Estas roupas remendadas me fazem sentir como um deles...

- Mas você não é, Gustav - rosnou o homem. Seus olhos negros confundiam-se com a noite. Ele alisou a barba rala por alguns segundos, demonstrando indignação. - Você nunca será um deles, porque você não nasceu como eles nasceram.

- Eu sei, não é preciso o senhor me lembrar disso - rebateu Gustav. Ele se olhou dos pés à cabeça. Sua roupa nada mais era do que uma calça feita de linho, uma camiseta de manga longa e uma botina surrada. - E não me chame de Gustav. Para eles eu sou Pedro.

- Você se parece a um camponês, vestido desse jeito - disse o homem, aproximando-se devagar de Gustav. - E não me diga que escolheu esse nome por causa daquele Apóstolo medíocre a quem você tem uma certa adoração?

Gustav não respondeu, então o homem prosseguiu:

- Você é uma afronta para todos nós...

- Você foi banido dos Céus pelo Criador. Quis ocupar o lugar Dele. Quis ser igual a Ele. O que mais é vergonhoso? Eu ser diferente de você, ou você ter sido expulso e achincalhado por todos como um Grande Traidor?

- Não fale assim com o seu Pai. Eu lhe dei a vida Gustav; posso tirá-la se eu quiser. Mas nunca farei isso, pois você é a única coisa a quem verdadeiramente...

- É muito difícil sair de sua boca a palavra amor, não é mesmo?

- Na verdade, não. Muitas acham que sou horrível, sem amor, sem compaixão. Transformaram-me num monstro durante milênios. Mas como esquecer de que eu fui o Anjo mais belo de todos? Se Ele é puro amor, então acho que Ele pôs amor nos seus, não concorda, filho?

Gustav meu a cabeça.

- Olhe para mim - Gustav voltou-se para seu pai. - Não quero vê-lo mais aqui. Tenho uma missão para você.

- Missão? - perguntou o garoto, espantado. O homem afagou os cabelos do filho, que se desvencilhou para o lado.

- Sim, preciso que você vá para a Europa, porém, séculos mais adiante. Não quero que retorne mais para o passado. Isso aqui está te deixando muito mal. Este lugar, chamado de Brasil, ainda é uma terra de bárbaros e pouco habitada. Quero que frequente lugares refinados que lhe farão bem. Lá, será muito bom para você, disso eu tenho certeza.

Gustav baixou a cabeça.

- Não quero que fique magoado comigo por querer o seu bem. Mas este lugar, ao qual todos chamarão de Rio de Janeiro, ainda não está a sua altura. Além do mais, estamos pisando em um local que para eles é santificado e ao qual não me agrada muito.

A grande baía cintilava ao longe, como um grande espelho.

- Sinto a presença do Filho do Criador neste lugar - desdenhou o homem. Ele estendeu a mão e, então, disse: - Venha, meu filho.

Gustav estendeu a mão também. Repentinamente, ele estava com vestes novas e modernas. Logo, os dois desapareceram do cume daquele morro.

Enviada - Série EternosOnde histórias criam vida. Descubra agora