Capítulo XV | Necronomicon

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Albertine acordou sentindo frio. Já era dia, um dia sem sol, e por um segundo, ela não entendeu por que não estava em seu quarto. Porém, logo tudo se endireitou em sua mente e ela lembrou-se, em rápidas passagens, de tudo que acontecera horas atrás. Jeremy não estava lá, somente o casaco que usara na noite anterior jazia na poltrona. Albertine ergueu lentamente o corpo a fim de sentar-se, moveu as pernas para fora do colchão, e logo estava de pé. Sentiu os lábios secos como nunca antes, e uma indescritível sensação de ardor nos olhos, ainda resultante do incidente com o fogo. Esgueirou-se pela porta entreaberta, e logo percebeu que não havia ninguém no corredor. Caminhou em passos silenciosos, e enquanto descia as escadas à sala, ouviu o som abafado das vozes de Jeremy, Rosa e Robert em uma conversa, provavelmente na cozinha. O atraente aroma do café fez o estômago de Albertine incomodar-se pela fome, mas aliviou a consciência da moça sobre a possibilidade de ter excedido seu tempo na cama.

As vozes foram tornando-se audíveis à medida que ela se aproximava da cozinha, e por algum motivo, curiosidade talvez, passou a andar nas pontas dos pés para evitar ser ouvida. Interessou-se em saber o que conversavam sem que notassem.

— Mas como isso é possível? Não havia nada lá? – a voz de Jeremy soou de maneira curiosa e parcialmente confusa.

— Não – respondeu Robert. –Checamos três, quatro vezes. O único motivo que conseguimos imaginar seria uma das lamparinas indo ao chão, derramando o óleo sobre o carpete.

— A lamparina estava muito bem apoiada à escrivaninha. Eu mesmo certifiquei-me disto.

— Até quando ficarão tentando decifrar o indecifrável? – disse Rosa, em meio ao som de alguns objetos encontrando-se. –Pelo menos de uma coisa eu tenho certeza.

— E o que é?- disse Jeremy.

— Você e Albertine precisarão de um novo carpete!

Os três então compartilharam um riso, fazendo a conversa instantaneamente perder o foco. Retornando ao ritmo normal, Albertine esforçou-se para tornar seus passos audíveis e não demonstrar que espionava a conversa.

— Bom dia! – ela disse da entrada da cozinha.

— Bom dia! – responderam todos simultaneamente, parecendo surpresos ao vê-la já acordada.

— Jeremy, por que não me acordou? Não gosto de parecer preguiçosa!

— Achei que precisasse descansar um pouco mais – ele retrucou, levantando-se da cadeira, indo até sua esposa e abraçando-a. - Você está bem? Não se sente mal?

— Só estou um pouco tonta, minha garganta está seca também...

— Você inalou muita fumaça ontem, querida – Rosa inseriu-se à conversa, enquanto enchia um copo com água. –Não é de se estranhar que esteja se sentindo assim.

Albertine pegou o copo de vidro fino e levou-o aos lábios ressecados. A água fresca escorreu por sua garganta, proporcionando um prazer que ela não saberia descrever. Jeremy ainda a abraçava, com os braços entrelaçados na cintura da esposa, o queixo apoiado em seu ombro. Antes que a água do copo fosse completamente bebida, ele levou uma das mãos aos cabelos de Albertine. Entre dois dedos separou uma fina mecha de fios louros e levou-a à frente do rosto; sentiu o cheiro de fumaça impregnado em sua amada.

— Err... querida?

— Sim?

— Eu acho que você precisa de um banho.

Albertine | Por onde seguir quando o amor e a morte cruzam o mesmo caminho?Onde histórias criam vida. Descubra agora