Capítulo 34 - Kian

1 0 0
                                    

— Para começar, o que está fazendo aqui? — ela pergunta.
— Laura e principalmente Ement não paravam de me mandar resolver as coisas com você, sinceramente eu pensava em você todo santo dia desde que terminamos e eles não ajudavam muito já que sempre que nos víamos eles me mandavam ir atrás de você. — ela torce o nariz e me encara. — De qualquer forma, estou aqui para fazer isso, mas não quero fazer aqui, — passo a mão na parte traseira do meu cabelo enquanto espero ela falar algo.
— Estou hospedada no Zerma-
— Eu também. — a interrompo.
— Certo, então podemos ir. — ela passa o braço em volta do meu depois que eu pego sua mala de mão e começamos a caminhar. — Então, Laura disse onde eu estava e em que hotel?
Sei que ela está ansiosa para a conversa e está tentando fingir naturalidade, é estranho como mesmo depois de todo esse tempo sem nos vermos conseguimos agir normalmente perto um do outro.
— Sim, ela me disse para vir, disse : adiante as coisas seu imbecil, vá atrás dela na Suíça. E foi o que fiz, ela também me disse que não seria fácil me redimir porque eu realmente te magoei. — ela está olhando para frente enquanto falo e abaixa a cabeça antes de me responder.
— Sim, ela tem razão. — ela me olha e então se solta do meu braço. — Fiquei tão balançada com aquela mensagem e com você aqui que acabei esquecendo tudo que aconteceu, mas a ficha caiu de novo, — ela me dá um sorriso triste. — espero que realmente tenha uma boa explicação para me dar, eu… eu estou cansada de tudo isso.
— Eu sei… — paro de caminhar e ela faz o mesmo. — Eu realmente quero que a gente possa voltar a ser como éramos antes…
— Eu duvido que isso vá acontecer, não é como se fosse se resolver tão facilmente. — ela me interrompe. — Sinto sua falta, mas não quero mais segredos ou mentiras, não quero viver ao lado de alguém que não conheço.
Pego sua mão e aperto. — Eu sei disso, estou disposto a me abrir, ser sincero e fazer isso funcionar, não posso e não quero estar longe de você.
Ela aperta minha mão de volta e seus olhos procuram os meus, então sorri e voltamos a andar perto um do outro até o hotel. Quando chegamos ao hotel ela faz check-in e subimos para o quarto dela.
— Bom, acho que agora pode começar, sou toda ouvidos. — diz assim que fecha a porta atrás de si.
Me sento em uma poltrona perto da janela e ela caminha até a outra em frente a minha e se senta.
— Você provavelmente vai pensar que sou louco ou acreditar assim que eu terminar, mas estou disposto a correr o risco… — sei que ela vai acreditar, mas não posso parecer lunático enquanto ela ainda não sabe.
— Certo… — ela diz hesitante. — pode começar então.
— Eu não queria que fosse a Itália porque… — respiro fundo antes de continuar, porque todas as memórias começam a invadir. — o meu pior trauma está marcado por aquele lugar.
— Certo, me explique direito, estou aqui para ouvir o que você tem a dizer.
— Eu vi o meu primeiro amor morrer em Verona, o homem que supostamente deveria se casar com ela e fazê-la feliz a matou, ele descobriu que estávamos juntos durante todo aquele verão e nos viu juntos no último dia que ela passaria em Verona com a tia , ele esperou que eu fosse embora para entrar na casa e matá-la, eu havia esquecido meu chapéu e voltei para pegar, quando cheguei no quarto a encontrei agonizando e sangrando muito, estava chorando, eu corri e a peguei nos braços e a levantei, eu precisava chamar ajuda, mas ela me disse : “não, não vai dar tempo, apenas esteja comigo até que eu me vá.” Eu fiz o que ela pediu, fiquei com ela até seu último suspiro, mas antes que ela se fosse para sempre, eu prometi, — preciso tomar outra respiração antes de continuar —  prometi a ela que a encontraria de novo um dia, que esse não seria nosso fim. — levanto meus olhos para avaliar seu rosto e ela está quase chorando, mas respira fundo e entrelaça as mãos.
— Isso é horrível, — sua voz falha. — quando isso… quando aconteceu?
— Em 1800. — digo.
Sua expressão se fecha e ela franze o nariz.
— Kian, eu pedi que fosse sincero, está achando que tenho cara de palhaça?
— Não, não estou, foi por isso que eu disse que quando eu terminasse de falar tudo você me acharia um lunático ou acreditaria em tudo, me deixe terminar, por favor.
— Tudo bem, vá em frente. — ela diz e se acomoda na poltrona de forma mais relaxada.
— Isso aconteceu em 1800, eu a conheci durante o verão em Verona, ela estava prometida a casamento para Lourenço Bianchi, mas queria passar o verão com a tia preferida antes de começar a vida de casada, não previmos que nos apaixonariamos, mas aconteceu e infelizmente isso foi nossa desgraça. Minha alma tem vivido presa sempre reencarnando e procurando por ela, eu sempre me lembro de tudo, de todas vezes em que a reencontrei e outra vez ela foi tirada de mim, depois de dois séculos de agonia eu tinha desistido de reencontrá-la, quando reencarnei dessa vez não movi um dedo para encontrá-la, eu viajei a Europa toda e vivi intensamente até sofrer um acidente e ficar desaparecido por dois dias, pensei que morreria sozinho antes que me achassem, sem poder dizer a todos que tenho nessa vida que os amava, mas me encontraram, com um ferimento na perna e quase morrendo de desidratação, depois disso resolvi recomeçar e aproveitar o máximo até que o ciclo voltasse a se repetir, então eu resolvi começar outra vida em outro continente, fui para Nova York com Ement e comecei os negócios. Não estava empenhado no meu outro propósito até te encontrar...
— Você agiu estranho naquele dia, parecia ter visto um fantasma… — ela para e me encara com os olhos arregalados.
— Sim, porque eu a conheço de outras vidas, no momento em que a vi eu percebi que reencontrei um fantasma muito antigo, reencarnada e sem lembrar de nada como das outras vezes, então estava tudo de volta em minha vida, tudo que eu tinha desistido de lutar. No começo eu disse a mim mesmo que não ficaria perto de você, que não faria isso de novo, mas eu não consigo, simplesmente não consigo, eu te amo há tanto tempo, estou tentando acabar com o ciclo há tanto tempo… — minha garganta começa a fechar e eu tento respirar o máximo que consigo, Tovell está pálida e não diz uma palavra enquanto ouve tudo que falo — ainda assim, ignorei meus extintos e me aproximei de você, então seus pesadelos começaram, sabe o que significam?
— Eu os tinha antes de te conhecer, um deles me fez parar de dirigir, eram tão intensos e reais quando eu estava dormindo, mas ficavam confusos quando eu acordava, esse é o único que consigo lembrar com clareza, eu estava dirigindo e outro carro bateu em mim, meu carro capotou três vezes antes de parar e começar a pegar fogo, eu tentava sair, mas não conseguia, depois havia uma voz me chamando desesperadamente e tentando me tirar de lá então eu acordei.
— Essa foi a forma como morreu 25 anos atrás, a última vez que te vi morrer de novo, seus pesadelos são suas lembranças de como morreu em cada vez que nos encontramos no passado e você se lembrou da primeira vez que nos conhecemos e eu prometi reencontrá-la, sempre que você descobre e se lembra de tudo o ciclo se repete e eu não consigo ficar com você, mas estou disposto a mudar isso dessa vez, se você deixar.
— Eu… não sei, isso parece tão irreal. — ela diz e se levanta, cruza os braços em cima dos peitos e começa a andar pelo quarto.
— Eu sei, mas por favor, me deixe cuidar de você dessa vez, ter certeza que o ciclo não vai se repetir e nos libertar disso, só quero amá-la completamente sem impedimentos ou morte uma vez. Estou te implorando. — levanto da poltrona e me ajoelho na frente dela que parou de andar e agora me encara a seus pés.
Seus olhos começam a encher de água e ela tropeça para longe de mim e bate na parede então escorrega até se sentar, aperta os olhos e segura a cabeça, ela repete o processo mais duas vezes antes de levantar a cabeça e dizer:
— Eu lembro.

Mistérios de uma vida roubadaOnde histórias criam vida. Descubra agora