Mistérios de uma vida roubada

Capítulo 2 - Kian

Eu não sabia como nem porquê fui parar naquela rua, não percebi quando entrei naquela floricultura minha mente estava inebriada, eu andava quase que involuntariamente.

Mas meu espanto foi maior quando vi a moça que estava atrás do balcão de madeira do lado direito da loja, altura mediana, cabelos pretos e longos caindo em cascata em suas costas, olhos de um castanho dourado e pele branca. Quando seus olhos encontraram os meus eu me senti quase que nostálgico, fazia sentido eu estar ali quando percebi ela vindo em minha direção para me atender, apesar do espanto inicial eu tentei agir normalmente. Passei o resto da tarde pensando nela, em como era surpreendentemente familiar a aparência que possuía, aquela florista me pegou de surpresa, Tovell Allen.

Ainda assim, prometi a mim mesmo que dessa vez as coisas seriam diferentes, não podia deixar que o ciclo se repetisse, aprendi com todas as outras vezes e com todas as minhas tentativas falhas também. Tentarei manter-me longe dela, ela me intrigou, mas não posso, nem quero passar por isso de novo, é desgastante demais.

- Querido Kian, - Ement disse entrando em meu apartamento. - o que te assombra hoje?

Ement Liang meu velho amigo, somos amigos desde o ensino médio, quando decidi me mudar e começar minha própria empresa de investimentos em outro país ele nem ao menos hesitou em me acompanhar.

- Uma mulher, meu amigo. - confesso à ele.

- Isso é novo. Não me fala sobre mulheres há algum tempo, quem é o novo affair? - pergunta ele sorridente.

- Não é nenhum affair.

Ele parece desapontado.

- Não entendo, o que é então?

- A vi pela primeira vez hoje, a mulher mais bonita que já vi. - digo olhando pela grande janela de vidro que me dá uma bela visão de Nova York.

- Isso é um exagero meu amigo, considerando as poucas mulheres que teve a chance de conhecer ou até mesmo se permitiu envolver. - ele se joga em meu sofá e me encara.

Viro meu rosto em sua direção ele está franzindo as sobrancelhas para mim, Ement é descendente de chineses, sua mãe é italiana e seu pai chinês, ele tem o rosto daqueles atores de dramas asiáticos, é um mulherengo nato e para sua sorte um filho da mãe bonito pra caramba.

- Sinto que essa é diferente, ela é a mulher mais bonita que já vi. - repito e volto a encarar a janela.

- Não me faça rir Kian Bertani! - exclama ele, humor carregado em sua voz. - Estamos em Nova York há oito meses e você nem sequer tocou uma mulher desde que nos mudamos. Cheguei a pensar que tinha se tornado celibatário de uma vez por todas.

- Não seja imbecil. - digo me voltando outra vez para seu rosto agora se contorcendo para segurar o riso e soco seu braço.

- Tudo bem, me conte sobre a dona da beleza extraordinária que está tomando conta de seus pensamentos. - pede ficando mais sério.

- Certo, - começo. - ela tem cabelos pretos ondulados e longos, eles chegam até sua cintura, ela é magra, tem uma altura mediana, olhos castanho dourado, seu corpo é lindo, seios pequenos, cintura fina, quadris largos, seu rosto me trouxe certa familiaridade, uma sensação de lar, ela é segura de si mesma, dona do próprio negócio em sociedade com a melhor amiga - assim como nós - pelo pouco que pude perceber em nossos dois rápidos encontros é que sua personalidade é um ponto forte. - digo por fim e espero sua reação.

- Uau, você fala como um romântico de carteirinha. - ele diz sorrindo para mim e afundando um pouco mais no sofá de camurça cinza. - Mas pelo que me disse ela parece ser realmente impressionante. Então o que vai ser? Está entrando nessa?

- Não mesmo. - digo, mas sei que será mais difícil fazer do que falar.

- Certo, eu posso apostar que isso não é definitivo. - ele zomba. - Mas você não gosta de apostas, então vou me sentar e esperar acontecer.

- Eu também não estou confiante em minha palavra desta vez. - digo a ele soltando um suspiro.

- Às vezes penso que você não regula bem da cabeça meu amigo.

- Eu também, Ement.

Passamos alguns instantes em silêncio, passa das sete e meia e estamos esparramados em meu sofá numa noite de terça feira, o dia no escritório não foi exatamente exaustivo, mas também não foi nenhum mar de rosas.

- Acha que conseguiremos fechar com aquela empresa? - Ement é o primeiro a falar.

- É provável que sim, o que acha? - pergunto deitando minha cabeça no encosto do sofá, minha postura está tão errada, mas não consigo me importar agora.

- Aquele velho é casca grossa. - ele está se referindo ao sr. Larsson, um investidor ambicioso, mas difícil de lidar.

- Ele é, mas acho que aceitará nossa proposta de qualquer forma, ele está à beira da falência e se recusa a fazer uma fusão com outra empresa.

- Hmm.

- Como foi o fim de semana? - mudo de assunto porque Ement está claramente entediado.

- Nada que eu queira realmente me lembrar, não que eu estivesse sóbrio o suficiente para fazê-lo mas enfim. - ele está sorrindo maliciosamente.

- Sinto que não vou querer saber mais. Então o que veio fazer aqui exatamente?

- Desde quando preciso de motivos para aparecer aqui? - ele soa indignado de uma forma teatral.

- Faz sentido.

Ele fica em silêncio por alguns minutos.

- Estou indo à essa boate mais tarde, está dentro? - pergunta animadamente.

- Definitivamente não. - respondo apressadamente.

- Posso saber qual é a desculpa desta vez? - eu evito sair todas as vezes que ele me chama, sou uma pessoa mais reservada e não estou sempre com algo casual como Ement.

- Cansado demais, hoje foi um dia longo. - eu volto a me sentar com a postura certa outra vez.

- Essa foi bem deprimente. - ele estala a língua e se põe de pé. - De qualquer forma, estou indo, até amanhã.

Com isso ele vai até o elevador de minha cobertura e aperta o botão para entrar, quando entra se vira para mim e faz um sinal em seguida as portas se fecham e ele se foi. Não menti quando disse que estava cansado, eu realmente estou, muitas coisas acontecendo em um único dia, sei que não dormirei cedo entretanto.