— Meu Deus! Você é muito louca. E se o Gabriel descobrir? — Letícia curvou-se diante da tela do notebook, vendo a planilha que eu construía. Tinha que entregar ao advogado de seu noivo ainda naquela tarde. Era uma corrida contra o tempo. As coisas pareciam se apertar como em um labirinto confuso.
Eu estava no meio dele, sufocando, sem tempo para raciocinar. E quer saber? Eu mesma não sabia onde eu estava com a cabeça para roubar um dos fazendeiros mais ricos e famosos do país. Minha mão tremia diante da minha ousadia.
— Ele não vai descobrir — falei, tentando me tranquilizar. Interiormente, repeti: "ele não vai descobrir"; meus olhos quase parados nos números.
— O smoking de quatro mil, você colocou nove e quinhentos? Caroool? Ele vai foder com a nossa vida.— Calada! Você me colocou nessa, não vou sair sem nada. — falei.
Eu jamais seria tão cara de pau a ponto de criar uma planilha superfaturada e torcer para que o homem abrisse a carteira sem questionar. Não era nenhuma santa, já havia aplicado outros golpes, mas não contra alguém tão abastado. Com esse casamento milionário, esperado pela sociedade e mídia há meses, eu já estaria com a vida totalmente ganha. Bastava criar um espetáculo, e então minha agenda estaria lotada de contatos dos famosos. Todo mundo desejaria o casamento igual ao do Gabriel Barbosa. A pequena e novata empresa de organização de festas a qual sou sócia ocuparia um lugar de respeito no hall da fama.
E eu só tive essa sorte porque a noiva é minha amiga. Mariana, a dona da empresa, e eu quase morremos de gritar quando Letícia me procurou. E foi sorte de ela ser Fisio do cara e ele se interessar pela mesma, e parecia que estava mesmo muito interessado. O partidão cobiçado por 90% do público feminino nunca tinha colocado uma aliança no dedo, mas, com Letícia, estava disposto a fazer um show de matrimônio. Todavia, para meu desespero, vi meu sonho caindo feito um castelo de cartas. Letícia apareceu com a ideia mirabolante de fugir com o amigo gostoso de Gabriel.E ela estava firme nessa decisão. Quase fiquei de joelhos e implorei para ela fazer isso depois do casamento, mas quem pode mandar no coração? Ele cancelaria todos os preparativos, e eu não seria lembrada nunca mais. Pelo contrário, o nome da nossa pequena empresa estaria na lista negra dos ricaços, e o meu nome seria gravado como a cerimonialista pé-frio.
Com contas para pagar, um pai alcoólatra e uma mãe doente morando em uma casa hipotecada, a melhor solução era reviver meu lado pilantra e tirar um pouco do bolso do fazendeiro e torcer para dar certo. Voltei aos valores do smoking e abaixei para cinco mil. Não poderia colocar valores exorbitantes, para não levantar desconfiança.— O que você acha de colocar sete mil em cada presente dos padrinhos? Custou três. — Olhei para Letícia mesmo sabendo que ela não me daria essa resposta.
— Eu não sei. Quero estar bem longe quando a bomba explodir. Mariana vai querer te matar, pois será a empresa que ficará com a culpa.
— Fique tranquila, Mari disse que está pensando em dar uma pausa e tentar outra coisa. Vou aconselhá-la a fechar por uns tempos. E eu estarei bem longe. — Recostei na cadeira e
repassei meu plano infalível. - Vou pagar a hipoteca dos meus pais e fugir para São Paulo, ficar uns meses por lá.— Eu tinha ciência que poderia dar uma merda gigantesca se ele descobrisse e resolvesse processar a empresa de eventos. Mas ele não ia descobrir, na verdade ele só dava a ordem para liberar o valor, quem estava à frente de tudo era o advogado, que, por sua vez, não me perguntava muito sobre meus atos, apenas liberava os depósitos.—Eu vou avisar ao Gabriel essa noite — falou, sem demostrar qualquer emoção. — Ele é um homem bom, honesto, muito trabalhador e rico. — Ela pensou um pouco antes de continuar, e eu esperei com a mão parada no teclado do computador. — É bonito, além de ser um animal delicioso na cama.
—Sério? — Eu estava surpresa por ela tocar nesse assunto. Letícia sempre desviava de falar sobre a intimidade dela com o jogador milionário, dizia até que havia um contrato de sigilo que a impedia de falar sobre isso.
Agora, ter a chance de saber um pouco dos bastidores do romance me deixava estranhamente eufórica.
—Ele é diferente dos outros homens nesse aspecto... gosta de dominar. — Pensou um pouco novamente e continuou, o olhar longe: — Ele tem tendências dominadoras entre quatro paredes. — Meu corpo estremeceu ao ouvir.
—Segundo ele, teve que me treinar para que eu pudesse satisfazê-lo, e não posso negar que foi bem prazeroso. O cara faz coisas que impressiona qualquer filha de Deus. Abandonei a tela do computador e olhei, interessada, para ela.
— E por que vai deixá-lo? — Perguntei
— A gente não manda no coração, Carol. —Deu de ombros, pronta para explicar mais uma vez o que já tinha me contado. —Infelizmente, mesmo tendo Gabriel,o sonho de qualquer mulher... meus olhos seguiram para outro lado. Estou completamente apaixonada pelo Matheus. Vamos embora daqui. Ele tem uma pequena fazenda em Minas, com o pai dele.Assenti, acreditando nela, mesmo sem compreender de verdade como poderia fazer uma escolha tão descabida. Era um abismo de diferença entre os dois. Letícia nunca foi apegada a bens materiais. Outra ficaria com Gabriel só pela boa vida, mas eu achei certo ela acabar com o casamento, impedindo que ambos sofram mais.
— Ele gosta de você? O Gabriel? — Era algo que eu sempre quis perguntar, porque ninguém nunca acreditou de verdade nesse relacionamento. Letícia é bonita, com sua pele acetinada e o corpo em forma, mas a classe social diferente dava margem a dúvidas.
— Ele é um pouco frio no quesito sentimento. Sempre distante, me procurava só quando queria sexo. Mas, no fundo, quero acreditar que ele gosta de mim. Não sei se é amor, mas ele
disse que eu alimentei o desejo dele de se casar e que será uma coisa boa para o pai. — Ela puxou uma cadeira da minha mesa de jantar e se sentou ao meu lado
— E às vezes acho que ele só quer mesmo se casar para dar esse evento como presente para o velho. — Ela suspirou e prosseguiu, levemente entristecida. — Hoje seria o jantar que ele me apresentaria à família Barbosa
— Caramba! Será um grande golpe no ego dele. — falei— Sim.
— E você é a cara de uma esposa perfeita. Cabelos longos, sempre composta, trabalhadora, pai e mãe evangélicos... — Enumerei as qualidades de Letícia, desejando não comparar comigo mesma, de cabelos tingidos de louro, roupas de gosto duvidoso, muitas compradas em brechó, e com pai problemático.
— Uma filha fornicadora e fujona. — Fez um bico de deboche. — Meus pais vão morrer de desgosto.
— Mas o importante aqui não são seus pais, mas sim sua alegria. — falei.
— Então, compreende que estou deixando um casamento de conveniência de lado para seguir minha felicidade?
— Sim, eu acredito em seus sentimentos. Agora me deixe, que eu tenho que terminar isso urgente. — Letícia riu e se aproximou mais para ver meu trabalho criminoso.
Eu era uma pessoa muito má, mentindo e roubando um homem inocente. Já tinha feito umas artimanhas parecidas quando trabalhava em uma loja no centro da cidade, aumentando por conta própria o preço das roupas para ter meu próprio rendimento. Sempre deu certo, fui considerada a melhor vendedora. E espero que esse golpe também dê resultado."
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MINHA REFÉM
FanfictionCarol não gostava de rótulos como ladra ou golpista, ela preferia dizer que escolhia sempre o caminho mais curto para o próprio sucesso, para se dar bem, não importando o que precisaria fazer. Seu novo emprego de cerimonialista lhe dava a chance de...