33 | Uma Dose de Ego

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Todo ser humano é composto por vícios. Se houver sorte, então poderá dizer que viu os vícios morrerem antes de si mesmo. Se não houver, os vícios corrompem o ser e o fazer morrer antes por dentro, aos poucos e durante todo o resto de vida.

Chaeyoung concordava com qualquer frase sobre vícios serem destrutivos, mas também concordava que certos deles proporcionavam tanto a criatividade quanto as hipocrisias. Odiava, acima de qualquer outro, o hábito dos homens fumarem em ambientes fechados. Ela própria não negava sua vontade de relaxar com os charutos vez ou outra, e, quando fazia, estava debaixo de seu teto, mas jamais faria algo desse tipo em restaurantes ou cafeterias. Como a maioria era homem, salvos de orientações parentais e dotados de liberdade, pareciam aproveitar os piores locais. Chaeyoung nunca se esqueceu da vez em que, no início da adolescência, visitou um dos restaurantes do bairro com seus pais e havia dezenas de homens fumando após as sobremesas. Aquilo a fez querer vomitar e perder totalmente a vontade de comer, era uma pena que não pensasse o mesmo quando se tratava de álcool.

Obviamente, na teoria odiava todos os vícios, mas na prática já havia percebido o quão dependente estava do álcool. Ele a consumia nos últimos tempos, mas ao menos não prejudicava a vida de ninguém além de sua própria – exceto Mina, algumas vezes. De maneira geral, era uma obsessão egoísta, não havia fumaça ou aroma ruim para compartilhar, existia apenas o líquido forte, sua garganta mais forte ainda, seu fígado sofredor e, como consequência, a criatividade junto a tristeza lhe invadindo. A arte era assim, deveria ser triste para ser bonita!

Em uma manhã ordinária e ensolarada, a coreana estava no refeitório da faculdade em seus poucos minutos de intervalo. Assim como todos os outros dias, deveria estar na biblioteca procurando algo para ler ou folheando o dicionário em busca de descobrir novas palavras, afinal, era o que uma escritora deveria fazer, mas naquele dia em específico, decidiu copiar os outros alunos e perder tempo apenas comendo algo. A mesa menor de madeira no fundo do refeitório estava livre há poucos minutos quando chegou, portanto, decidiu se sentar ali mesmo, já entendendo que: se ninguém se importava muito com ela naturalmente, então no canto do refeitório se importariam menos. Foi inevitável não deixar sua mente se perder após pegar sua bandeja, caminhar entre a multidão e finalmente se sentar sozinha. A unha de seu indicador arranhava repetidamente o mesmo ponto da mesa enquanto seus olhos se prendiam àquele movimento. Pela força da fricção, a madeira escura e suja pelo uso constante já estava gasta, mostrando a camada mais clara debaixo.

Sua garganta, seu sangue, seu corpo e sua mente imploravam juntos por um mísero gole de álcool.

Engoliu em seco percebendo suas pernas se movimentando em tiques, a ansiedade parecia tomar conta de seu peito e todos os ruídos altos do ambiente mal eram captados por seus ouvidos. As vozes dos jovens, o barulho de bandejas e até mesmo o som dos poucos automóveis no estacionamento visto pela janela eram ignorados. Tudo que sua mente conseguia processar enquanto o sol batia forte em seu rosto eram cenas das últimas vezes que teve contato com o vinho. Se enganava pensando que ao chegar em casa beberia um gole singelo, tentando ignorar a ideia de que não conseguiria se conter e em minutos estaria rindo à toa, com vários papéis e caneta nas mãos e em seguida dormindo no chão, impossibilitada de se levantar para ir a faculdade no dia seguinte.

A língua deslizou disfarçadamente de um lado para o outro entre seus lábios, estava decidido: tentaria tomar apenas um gole, ele não iria prejudica-la e guardaria a garrafa logo em seguida.

''Eu prometo que seu bebê não terá os cuidados de uma alcóolatra.''

O barulho incômodo do arranhar cessou de repente ao tirar o dedo dali. Irritada, se ajeitou no banco e cruzou as pernas debaixo do vestido, suspirando alto em seguida e puxando a maçã da bandeja em sua frente. Chaeyoung levou a boca e mordeu pela primeira vez, ignorando o arroz, o feijão preto e as batatas oferecidos aquele dia.

Poeira Cósmica | MiChaengOnde histórias criam vida. Descubra agora