Capítulo 16: Amargo e Doce (1)

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Grachev chegou a tempo. Ele era um homem que tinha por volta de cinquenta e poucos anos, de cabelo ruivo acastanhado com alguns fios grisalhos nas têmporas, aparentando ser puro e amigável. Ele era de fato um doutor muito gentil e deu a Anna uma pomada para passar em seu ferimento.

Após a sua saída, Karenin e Anna estava sozinhos no quarto. Pensando que a pessoa mais apropriada para ajudar Anna com a aplicação da pomada fosse a sua empregada, ele perguntou, “Eu deveria chamar Anushka?”, assim que ele terminou de falar, o frasco com a pomada foi estendido para ele.

“Isso também faz parte de um relacionamento romântico, aumentando o contato físico, se familiarizando um com o outro, e…”.

Anna não terminou a frase, apenas abaixou sua cabeça e sorriu.

***

Mais tarde, quando Karenin havia terminado de discutir com o mordomo as coisas que deveriam ser resolvidas, se virou para entrar no vagão do trem, e viu a pessoa que estava esperando por ele.

Apesar do vento que passava por ele – Novembro ainda estava frio, sentia que em seu coração, a primavera já havia chegado na forma de uma mulher segurando a própria saia. Ela estava espalhando sementes de esperança em uma terra anteriormente congelada, esperando que as flores desabrochassem.

Sim, estava casado, e essa era uma sensação muito boa.

***

Era a segunda vez em que Anna pegava um trem nesta época. A primeira vez tinha sido tão rápida, quase parecia que estavam com pressa. Agora, contudo, pareceu diferente. Apesar da agenda deles, sentia como se tivesse tempo suficiente para fazer uma pausa, para respirar o ar frio e refrescante..

Quase como se seus sentidos estivessem em sintonia com os do seu marido.

Como agora, sentando em um pequeno vagão, quando Anna olhou para seu marido.

Ele estava sentado de uma forma mais relaxada do que quando o fazia em sua mesa de trabalho, mas ainda parecia mais elegante que uma pessoa comum, constantemente mantendo a compostura de um oficial do governo.

“Você tem algo para perguntar? Anna.”, Karenin desviou o seu olhar dos documentos, seus olhos azuis voltados para ela.

“Não”, Anna sorriu.

Karenin voltou a olhar para os documentos. Cinco minutos depois, o olhar dela ainda se encontrava fixado nele. Ele ajustou a sua postura e se virou mais uma vez…

“Você tem certeza de que não tem nenhuma pergunta?”.

“Eu não tenho”, ela respondeu um pouco rápido demais, antes de mudar a sua resposta, “Na verdade, talvez apenas uma”.

“Você pode perguntar”, Karenin marcou a sua página com o dedo, e levantou a sua cabeça. Falou calmamente, sem nenhuma alteração em seu tom, não parecia nem um pouco rígido. Talvez fosse porque seus olhos azuis estavam atentamente a olhando por baixo dos seus longos cílios, e mesmo assim essa atenção não escondia quaisquer indícios de implicações interrogativas.

“Notei que você não usa óculos”, ela ressaltou.

“Não preciso de um”.

“Eu…”, Anna lambeu seus lábios, então sorriu timidamente, “apenas estava pensando sobre como você ficaria usando óculos”.

“Não acho que teria qualquer diferença”, Karenin olhou para baixo novamente, sinalizando que a conversa deles deveria ser adiada até novas ordens.

Anna lamentou.

Ela apoiou seu rosto em sua mão direita e olhou para a janela assim que o outro se virou. Mais uma vez, havia sido deixada aos seus pensamentos.

Eles haviam deixado Petersburgo não mais que duas horas atrás. A sem fim subida e descida das montanhas, que antes davam um pouco de empolgação, agora estavam apenas começando a entediar-la.

Uma pena, ela pensou.

O céu estava azul claro. Contra isso, as bétulas brancas eretas como sentinelas. Elas não pareciam especiais agora, mas quando a primavera chegasse, seriam lindos verdes salpicados.

Ela dobrou suas mãos, inclinando sua cabeça, e sorrindo enquanto olhava para o calmo cenário a sua volta.

Depois de crescer acostumada com os costumes da sociedade moderna, sua vida ali havia inicialmente a deixado perdida sobre o que fazer, mas agora, tudo parecia estar bem.

O que falhou em se dar conta foi que, apesar da decisão de parar de incomodar seu futuro marido, Karenin já havia perdido o seu foco.

Ele inclinou sua cabeça em direção à Anna. A luz do sol que brilhava sobre a curva do nariz realçam sua elegância. Os cílios dele não estavam grossos ou enrolados. Semi-cerrados, eles revelaram um azul como o céu envolto por baixo de suas pálpebras.

Esteve olhando para sua esposa por um longo tempo. Por conta disso, percebeu o momento em que a mesma adormeceu. Ele sentiu seus lábios se curvarem levemente com a imagem dela descansando tranquilamente.

E então levantou-se, seus longos dedos pegando firmemente o cobertor de flanela que estava próximo, antes de colocá-lo suavemente sobre ela.

Sentando novamente, a observou para ter certeza de que não havia acordado, então moveu seu olhar e começou a mergulhar em seus documentos.

Anna acordou atordoada, incerta sobre quanto tempo havia dormido.

“Eu dormi?”, sua ação imediata foi de esfregar seus olhos para tirar o sono, mas parou quando um lenço lhe foi oferecido. O olhou interrogativamente.

“Doutor Grachev tinha me dito que usar isso poderia diminuir minhas chances de infecção por doenças, especialmente nos olhos”. Ele explicou calmamente, e ela concordou. E então pegou o lenço e esfregou seus olhos com ele, dando ao outro um leve sorriso.

“Ele está certo. Você tem um ótimo doutor!”, o elogiou.

Karenin não respondeu a esse elogio. Em vez disso, apenas olhou para seu relógio, antes de abaixar seus documentos.

“É hora de irmos comer”, ele informou.

“Boa ideia. Estava ficando com fome”. Anna aprovou bastante essa proposta. Karenin assentiu concordando também e pareceu estar se abrindo aos poucos.

A Noble Marriage (Novel)Onde histórias criam vida. Descubra agora