8 - Barriga de Aluguel

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Dornelles decidira manter ainda extraoficial suas suspeitas. Sabia que o fato de Giovana, a G-Tox, ter passado dois dias em uma clínica médica cerca de um ano antes de ser assassinada poderia significar nada. Mas precisava checar, estavam sem muitas pistas para continuar e seu instinto sempre o alertara para segui-lo. "Numa investigação, detalhes importam", diria o personagem Jack Reacher, do alto de seu imponente 1m95 de altura.

Encontrar o lugar na internet não foi difícil, tratava-se de uma clínica especializada em atendimento à mulher, com ginecologistas e tratamento para fertilidade, inclusive fertilização in vitro.

Não havia valores destacados no site, mas também não parecia ser o tipo de lugar que celebridades frequentavam. Talvez subcelebridades iniciantes como G-Tox, no caso. De qualquer forma, valia investigar. Achou melhor falar com o delegado antes de botar os pés pelas mãos e comprometer o caso ou mesmo sua carreira.

Cabral estava em sua mesa, sempre cheia de montes de pastas, processos e documentos. Dornelles fez sinal de que queria falar e ele respondeu fazendo sinal para que se aproximasse. O investigador, sem cerimônia e nenhuma enrolação, contou que havia descoberto que Giovana havia passado dois dias sumida e mentira o seu destino. Ela havia estado em uma clínica médica.

- Isso foi há quantos dias? - perguntou o delegado, atento.

- Bom, faz um tempo já... - hesitou Dornelles.

- Um tempo quanto? Semanas?

- Não, na verdade, alguns meses...

- Meses Dornelles? Tá maluco? Quantos? Dois, três?

- Doze...

Cabral, que a essas horas já estava em pé, deu um suspiro e voltou a sentar-se.

- Desculpa Dornelles, mas não tem o que fazer. Não tenho como pedir para quebrar sigilo de um suposto caso médico ocorrido há mais de um ano com uma vítima. Vou justificar como isso? A mídia vai cair matando na gente. - disse o delegado , levantando-se de sua cadeira novamente e apoiando as mãos sobre a mesa, após ouvir os argumentos do investigador.

- Mas Cabral, pensa bem, ela escondeu isso, deve ter um motivo. - tentou ainda rebater.

- Claro que deve, ninguém faz nada à toa. Mas um motivo pessoal, particular, que ela não queria que ninguém soubesse e, principalmente, cara, que não tem nada a ver com o assassinato. Pelo amor de Deus, Dornelles, faz um ano isso.

- Eu sei, faz tempo, mas é a única pista. Se descobrirmos o que ela foi fazer, talvez se eles atenderam a outra vítima...

- Você tá indo muito longe na sua imaginação. Não temos base legal para requerer que uma clínica abra o cadastro de pacientes para gente. Mas faz o seguinte, investiga a outra vítima. Fala com a família, amigos, quem você puder. Se, e é um grande "se", ela tiver sido atendida nessa clínica, seria uma ligação entre as vítimas, aí a gente pensa no que fazer.  

Dornelles, embora contrariado, sorriu, sabia que seria praticamente impossível conseguir os dados dos pacientes tão facilmente. Restava-lhe escarafunchar a vida da outra vítima. Mas, também outra ideia brotava em sua mente. Uma que seu chefe não poderia impedi-lo de colocar em prática. Principalmente porque ele não saberia.

Mandou uma mensagem para a irmã: "Almoço hoje, você escolhe o lugar. Eu pago".

Ela respondeu quase que imediatamente com o endereço do lugar e o horário que estaria disponível. O "eu pago" era um código que ambos usavam quando tinham informações sigilosas a compartilhar. Aprenderam com o pai e usavam ainda hoje quando Dornelles queria vazar alguma informação - o que havia acontecido apenas uma vez, em uma investigação em particular - ou a irmã tinha informações que pudessem ajudar em algum caso, muitas vezes oferecida em troca de exclusividade na futura divulgação.

Não muito tempo depois, encontraram-se em um McDonald's.

Quando Thalita chegou, Dornelles já havia escolhido um lugar, a mesa mais afastada possível do lado de fora da lanchonete, onde tamborilava os dedos, impaciente. Havia pegado apenas uma água para ele - não comeria esse lixo - e um número 3 com milk-shake para a irmã, que também evitava comer junk food, mas tinha uma queda pelo McDonald's, em especial a bebida de Ovomaltine.

- Espero que esse pedido seja o seu, por que acha que vou comer esse lixo? - disse ela, chegando e tirando a bolsa para apoiá-la na cadeira.

- Porque eu sei que você não resiste. Então come logo e ouve o que tenho para dizer, é sério.

- Huuuu, que brabão. Tá bom, manda. - sentou-se enfim, começando a devorar as batatas, que ainda estavam quentes.

Enquanto a jovem comia, Dornelles contou o que havia descoberto e que tinha tido permissão do delegado para descobrir se a primeira vítima também tinha passado pela clínica. Era um tiro no escuro, mas havia uma chance de que isso tivesse acontecido, embora pudesse também não significar nada.

- Já entendi. - disse Thalita, que já havia terminado as batatas e dava a primeira mordida no lanche - Você quer que eu descubra o que a G-Tox fez lá.

- Sim, isso mesmo. Acha que algum contato seu poderia ajudar?

- Não sei, eu conheço uns assessores que podem saber de alguma coisa, tentar pressionar a assessora dela...

- Certo. Tem mais uma coisa.

- O quê?

- Eu quero que você se infiltre na clínica. Finge ser uma paciente, fala que tá tentando engravidar e não consegue, tá interessada em conhecer a fertilização in vitro, algo assim. Eu acho que é o caminho, acho que foi isso que ela foi procurar lá. Pelo menos foi o melhor que consegui pensar.

Thalita mastigou um pouco o lanche, pensativa, engolindo em seguida. Olhou para o irmão.

- Tá bom. Eu topo ser a sua barriga de aluguel... mas isso vai te custar mais do que um lanche...

O Assassino da Rosa de SangueOnde histórias criam vida. Descubra agora