trinta

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— Bem... eu... eu... não sou médica.

Ryan me encara estarrecido. Imagino que ele esperou que eu fosse correndo arrumar as malas e ir até sei lá onde junto dele, para acudir a mulher que me abandonou.

— Você não pode estar falando sério.

Pela primeira vez desde que batera à minha porta, Ryan estava triste. Pelo visto ele tinha total convicção de que eu faria o que ele quisesse.

— Olha, Ryan, Ingrid nunca foi a minha mãe. Ela pode ter sido incrível para você, mas não foi pra mim. — digo, com um suspiro no final. — Então eu não posso simplesmente aparecer, como se nada tivesse acontecido.

Sem nenhum convite, ele se senta no sofá e passa a mão pelo cabelo brilhante e sedoso.

— Entendo o seu ponto de vista. Claro que entendo, mas você precisa ouvir o lado dela. Talvez as coisas não sejam exatamente como seu pai contou.

Estranho aquela frase e o encaro com a testa franzida.

— Como assim? Do que você está falando?

— Eu não sei de nada, prometo. Só soube da sua existência depois que fiz dezesseis. E mesmo assim, mamãe não me contou nada sobre você.

— Então como me achou? — questiono. — Como sabia que eu morava aqui?

— Pouco mais de uma semana, mamãe me gritou, dizendo que minha irmã mais velha estava na televisão. Ela me apontou você, do lado daquele Davies lá, na estreia do filme dele. Sabendo como era seu nome e agora seu rosto, fui em busca de respostas. Um detetive particular encontrou você.

— Ah. Entendi.

Meu telefone vibra em minhas mãos, indicando uma mensagem de John.

— Você veio de carro? — pergunto a Ryan. — Pode me levar a um lugar? Nós podemos conversar melhor lá.

E também pela primeira vez desde que chegou, ele sorriu.

— Claro.

— Deixe só eu arrumar umas coisinhas e já volto.

Indo para o quarto, envio uma mensagem de voz para John.

— Você venceu. Estou indo para sua casa. Chegando aí, explico melhor.

[...]

— Você mora aonde? — pergunto mais uma vez a Ryan, pois estava desacreditada da resposta.

— Malibu. Nós temos uma casa de frente para a praia.

— Uau. Eu acho que nunca fui à praia.

— Bem, sempre tem uma primeira vez. Aqui. Chegamos. — olho para o prédio de John e torno a encarar meu então irmão mais novo. — Não sei se deveríamos conversar na casa do seu namorado.

— Ele não é meu namorado. Esqueci de negar da última vez que falou isso. Na verdade, eu acho que não é. Não conversamos sobre isso.

— Enfim... — ele revira os olhos, diante da minha indagação. — continuo não achando que é legal. Ele não me conhece... pode achar estranho.

— Eu também não conheço você.

Outra vez ele revira os olhos. Parecia que não tinha a menor paciência comigo. Da mesma forma que eu também não tinha com ele ou pessoas idiotas.

É. Ele realmente é meu irmão.

— Que tal nós jantarmos essa noite? Te conto tudo o que quiser saber.

Reflito sobre aquilo. Mais cedo eu não queria ouvir o nome da mulher que me gerou, mas naquele momento, eu conseguia me sentir compadecida por Ryan. Ele parecia amar muito a mãe dele e também parecia um garoto legal, por trás de toda aquela revirada de olhos.

— Tudo bem. — respondo, por fim.

— Pode ser no hotel em que estou hospedado? Não conheço nada por aqui. — afirmo com a cabeça. — Bela vista hotel. Acho que fica uns dez minutos daqui.

— Não, tudo bem. As oito?

— Perfeito.

Descemos do carro e ele me ajuda a tirar a mala que estava na parte de trás do veículo.

— Obrigado, Emma. — ele me puxa para um abraço repentino. — Obrigado por pelo menos me ouvir.

— Tudo bem. Até mais.

Me solto do abraço e entro no prédio sem olhar para trás. Só então consigo soltar a respiração. Eu senti um enorme bolo em minha garganta, com uma vontade gigantesca de chorar.

— Emma? Tudo bem?

Olho para o porteiro, que estava do outro lado do balcão e sorrio, tentando parecer tranquila.

— Sim. Claro. John está me esperando.

Seus olhos velhos e cansados, estavam brilhando e ele carregava um sorriso bobo.

— Ele sempre está. — responde.

Vou para o elevador e não demora para que eu esteja no andar de John. Toco a campainha e espero. Quando ele abre a porta, seus olhos vão direto para as malas ao meu lado.

— John...

— Eu aceito!

— O que? — pergunto.

— Você está aqui com malas. Isso é um pedido de casamento. Eu aceito!

Solto uma risada e empurro-o, deixando as malas perto da porta.

— Tem uma banheira na minha cozinha. — digo, jogando-me em seu enorme sofá. — E acabei de descobrir que meu apartamento não é meu apartamento. E meu irmão resolveu aparecer na minha porta. E me demiti. Tudo isso no mesmo dia.

John ainda estava parado na porta, provavelmente processando a enxurrada de informações que joguei em seu colo.

— Espera aí... o que?

— Qual parte?

— Que tal o começo? Vou pegar um vinho.

[...]

— Nossa... eu não sei como você deve estar se sentindo.

— Ah... normal. — digo. — Saber que a mulher que me gerou está morrendo, não me causa dor. Não como quando foi com meu pai.

— Imagino. E sobre o apartamento, não tenho nenhum problema em você vir morar comigo. Esse apartamento é grande mais para um só mesmo. — John aperta os braços ao meu redor e beija minha bochecha. — Estou ansioso para ter nossas bagunças juntas.

— Eu não vou morar aqui! São só uns dias. Até que eu consiga um novo trabalho e alugue um outro lugar.

— Que você não precisa ter pressa para achar.

Olho para as nossas mãos entrelaçadas e levo minha mente até Ryan. Apesar de ter aceito jantar com ele, eu não tinha certeza se devia me envolver naquilo.

— Você devia ir. — John diz, de repente. Era como se eu tivesse dito todas as minhas preocupações em voz alta. — Nesse jantar.

— Não sei. Não sei como dizer a ele, que não quero contato com Ingrid, sem magoá-lo. Ryan parece ser um cara bem legal. Apesar de toda aquela petulância.

— Exatamente como você.

— Para. É sério.

— Olha, Emma, se eu fosse você, iria nesse jantar. Até vou com você se quiser. Se ele é tão legal como você diz ser, imagino que mereça uma satisfação.

Encaro John e sorrio, ao passar minha mão pelo seu rosto.

— Obrigada por ser tão incrível comigo. Não sei o que seria de mim, se não tivesse conhecido você.

— Nascemos um para o outro, querida. Uma hora iríamos nos encontrar.

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