quarenta e sete

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De última hora, Ryan decidiu que iria comigo para Seattle, com a desculpa de checar o estado do apartamento que nossa mãe havia me dado. Eu sabia que era para não ficar sozinho naquela enorme casa, que estava ainda maior sem Ingrid e sua risada envolvente, mas aceitei a desculpa dada.

Disse a John que iria trabalhar e mantive o celular desligado até chegarmos. Ele adorava ligar por chamadas de vídeo, para saber o que eu estava fazendo. Parecia até que ele não tinha uma série para gravar.

Na noite passada ele me ligou ansioso para saber sobre a leitura do testamento e eu contei. Apenas a parte de agora eu ser uma pessoa rica. Deixei para contar sobre o apartamento, quando já estivesse em Seattle.

Antes de irmos para o hotel que eu havia reservado, Ryan e eu vamos até o meu antigo novo apartamento. A primeira mudança que noto, é o elevador. Ele sempre esteve desativado. Em todos os anos que vivi ali, jamais tinha visto aquilo funcionando.

— Já é um avanço não precisar subir as escadas. — Ryan brinca, empurrando nossas malas para dentro do elevador.

— É, concordo.

Meu apartamento inteiro parecia novo. As antigas paredes mofadas e rebocadas, estavam todas pintadas de um verde claro. Os moveis eram novos. Era literalmente um novo apartamento.

— Pelo visto mamãe investiu bastante aqui. — ele diz, vendo que tinha etiqueta em algumas coisas.

— E ela fez tudo sozinha?

— Eu não sabia de nada! Mamãe me conhecia o suficiente para saber que eu não conseguiria guardar um segredo de você.

Aceitei aquela resposta, pois era a mais pura verdade. Ryan não conseguia comer um hamburguer escondido de mim. Até parece que ele iria saber de algo tão grandioso e não iria me contar.

Depois de olhar todo o lugar e perceber que agora eu também tinha uma banheira, jogo-me no sofá exausta e faminta.

— Quer sair para comer?

— Não. — respondo, puxando o celular do bolso. — Dei a sorte daqueles abutres ainda não terem me descoberto aqui. Mais tarde eu vou aparecer na casa do John. Não quero que eles estraguem a minha surpresa.

— Mas se incomoda se eu pedir algo? Estou realmente morrendo de fome.

— Claro que não.

Ligo o celular e antes de responder as diversas mensagens de John, ligo para o hotel e cancelo a minha reserva. O apartamento inteiro estava mobilhado para já chegar e morar. Não tinha motivo para ir a outro lugar.

Enquanto Ryan escolhia o que iriamos comer, vou para o meu antigo banheiro e tomo um banho. Tinha uma sensação muito nostálgica em estar ali mais uma vez. Mesmo com tudo estando diferente, diversas lembranças atacavam a minha mente.

Quando ele adentra o banheiro, empurro as malas para o quarto. Estava decidindo qual roupa colocaria para encontrar John, quando a campainha soou.

— Caramba, a campainha funciona. — comento comigo mesma, rindo. — É muita mudança para uma pessoa só.

Abro a porta e me deparo com a pessoa que eu jurei nunca mais olhar na cara. Em suas costas tinha uma mochila de entrega.

— Você voltou? — Lilian me encara de cima a baixo. — Quando vi o endereço, achei que alguém tivesse alugado esse apartamento.

— Não. É meu. Quanto deu?

— Já está pago.

Ela estica a embalagem para mim e eu a pego. Nós ficamos nos encarando por alguns segundos, enquanto eu buscava uma deixa para fechar a porta em sua cara.

— Bem, eu...

— Tenho acompanhado você. — ela diz, me impedindo de me esquivar. — Fico feliz de saber que você e John se acertaram. Alguém tinha que ser feliz.

— Não foi graças a você.

E graças a minha boca grande, lá se foi a minha vontade de fugir daquele assunto.

— Emma, foi sem querer. Eu quis conversar com você para que entendesse isso. Até você me fazer perder o emprego.

— Você tinha me tirado tudo. — murmuro, largando a embalagem de comida na estante ao lado da porta. — Tinha me tirado a única pessoa que me ama. Minha única razão de viver. O que queria que eu fizesse? Ter ligado para o gerente e dito que você havia se relacionado com um cliente, foi o mínimo que pude fazer. Eu estava furiosa.

— Minha mãe estava à beira da morte! Você sabia muito bem que aquele emprego era para custear os remédios e as consultas que ela precisava para continuar lutando pelo câncer.

— Onde ela está hoje?

— Não impor...

— Onde? — pressiono.

— Em uma clínica. Uma agente da prefeitura entrou em contato comigo e...

— Disse que tinha um quarto para sua mãe. — termino e ela pisca algumas vezes. — Que todo o tratamento e acomodação, não seria cobrado.

— Como você...

— Eu arrumei aquele lugar para ela. Sabia que sem o trabalho, ela não conseguiria os remédios. Quem me machucou foi você e não ela.

— Nunca imaginei que você fosse fazer algo assim por mim.

— Faria qualquer coisa por você, Lilian. — digo e olho para trás. Ryan estava me chamando do banheiro. — Bem, isso é passado. Mas não se preocupe, sua mãe terá tudo o que precisa, até estar curada.

Ela solta uma risada, em meio a algumas lagrimas.

— Assim que eu vi nas notícias, que você e John estavam juntos, eu tive uma vontade tão grande de abrir a boca com tudo o que sei sobre você.

— E o que mudou? — cruzo os braços, já irritada com o andamento daquela conversa.

— Não sei. Algo dentro de mim, me levou a não fazer nada. E... ainda bem que não fiz. Enfim, eu preciso ir. Tenho outras entregas para fazer. Obrigada pelo que fez pela minha mãe.

Dou-lhe um sorriso singelo e aceno, quando ela começa a descer as escadas do prédio. Fecho a porta e me encosto nela, encarando o chão.

Lilian foi a melhor amiga que tive na vida, mas na primeira oportunidade que teve de ferrar com a minha vida, porque a dela não estava boa, ela o fez. Não preciso e nem quero pessoas assim na minha vida.

— Ei? — Ryan chama e eu o olho. — Tudo bem?

— Sim... o que queria?

— Era uma toalha, mas depois achei no armário lá. Aconteceu alguma coisa?

Ryan não sabia das escolhas que tive de tomar em minha vida e por mim, continuaria assim.

— Não. A comida chegou. Vamos comer logo, para que eu vá surpreender John.

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