três.

1.3K 211 130
                                    

Coloco a sacolinha da Locadora Caixão no cesto da bicicleta e subo no banco, já começando a pedalar às pressas para a casa do Mateus. Não é longe da locadora, mas estou ansiosa para mostrar os filmes que aluguei, e anunciar a maratona de filmes que teremos de noite.

Ele ainda não sabe que a maratona vai ser na casa dele, mas sei que ele vai aceitar a ideia. Além de desocupado, Mateus também é meio nerd igual Raquel; ele adora essas coisas meio sem noção que ela gosta, tipo os jogos de RPG, super-heróis, e HQs. Sempre que vamos na locadora, eles acabam discutindo sobre o último capítulo de tal coisa que saiu na semana, e eu sempre fico boiando. E como Mateus é apaixonado por ela desde que a gente era novo, às vezes eu fico fazendo brincadeirinhas só para o irritar. "A Raquel sabe que você tá apaixonado em fulana de tal de tal filme?" Ele odeia.

Para chegar na casa dele, tenho que descer por uma rua de calçamento super inclinada, e eu quase sempre me estabaco quando chego no final, até mesmo quando não estou de bicicleta. Dessa vez, com os dentes cerrados e muita força nos braços, consigo frear antes de atingir com tudo a parede da casa no final da rua. Mesmo que eu quase sofra um acidente a cada quinze minutos, ter pegado essa belezinha emprestada foi uma das melhores decisões que eu já fiz na minha vida. Quase sofrer acidentes é mil vezes melhor do que ter ficar andando igual barata tonta no sol quente de Boa-Morte por horas e horas.

Mas meu sonho era realmente ter uma bicicleta só pra mim. Mesmo que Ritinha a tenha ganhado há mais de anos e mal saiba andar, ela odeia me emprestar. Para minha eterna tristeza, enquanto Ritinha tem padrinhos ricos e donos de fazenda, que dão milhares de presentes legais no aniversário e natal, o meu padrinho faleceu quando eu tinha três anos, e eu nunca tive a oportunidade de ganhar nada chique igual à minha irmã. É injusto, eu sei. 

Quando eu chego, encosto a bicicleta na parede da garagem e toco a campainha.  Toco mais umas duas vezes em menos de cinco segundos, e então escuto passos preguiçosos vindo em direção à porta. Seguro a sacolinha apertada nas mãos, e o irmão mais velho de Mateus abre a porta.

— E aí, Maria? — ele cumprimenta.

— E aí, Dudu? O Mateus tá aí? — aperto mais a sacolinha, ansiosa.

— Tá sim, tá lá em cima. — ele se afasta da porta e me dá lugar pra passar. Eu entro e já imediatamente corro para as escadas, mas então escuto ele dizer: — Como que tá a Ritinha?

— Tá bem. — respondo, e corro escada acima, revirando os olhos. Obviamente, Dudu era um dos caras que gostava de Maria Rita, mas pra quem ela nunca tinha dado bola.

Empurro a porta do quarto de Mateus de supetão e posso ver o garoto pular de susto na cadeira em que ele está sentado, se virando pra mim de olhos arregalados.

— Maria! — ele reclama, a mão no peito. — O que cê tá fazendo aqui?

Mostro a sacolinha amarela da locadora Caixão e ele ergue as sobrancelhas. Sei de imediato que ele ficou interessado. Por isso, me jogo na cama dele e digo:

— Peguei uns filmes sobre fantasmas pra gente fazer maratona aqui hoje. Mas tenho que avisar pra Bia ainda.

— Você nem perguntou se eu tinha compromisso hoje. — Mateus disse, rodando um botãozinho no radinho portátil em suas mãos. Contudo, somente estática saia dele, não importava quanto ele girasse o botãozinho.

— Você tem compromisso? — arqueei a sobrancelha.

— Não, mas não custava ter perguntado. Vai que eu tivesse um encontro ou coisa do tipo? Você ia querer estragar a vida romântica do seu melhor amigo?

— Cala boca, bobão. Você nunca que ia ter um encontro.

— Quem garante? Você ia ficar sem ver os filmes.

Os Fantasmas de Boa-Morte ⚢Onde histórias criam vida. Descubra agora