— Bia foi comigo na locadora e a gente conversou um pouco sobre o tema do trabalho da Doralice. Estamos pensando em fazer sobre a história dos quadrinhos e como eles ficaram famosos aqui no Brasil.
— Que legal — digo, meio sem prestar atenção. Estou encarando minha bermuda do uniforme que estendi no chão da sala enquanto tento pensar em uma maneira de fazê-lo magicamente aumentar dois tamanhos pra me servir pra amanhã. Estava sentada no chão da sala já faziam uns quinze minutos, observando minha bermuda antiga do uniforme e pensando em como fazê-la magicamente aumentar dois tamanhos pra me servir amanhã. A experiência de usar o short-saia de Ritinha nesses dias não tinha sido a pior — eu tinha outras coisas pra me preocupar — mas definitivamente não era algo que eu queria repetir.
Não que eu odiasse a saia em si. Só não ficava bem em mim.
Tá, mentira, talvez eu odiasse a saia.
— Você tá pensando em fazer sobre o que? — ele pergunta, mas tenho a impressão de que não é realmente isso que ele quer saber. Ele quer saber se Safira já me ligou hoje.
— Não sei — falo, arrumando o telefone entre meu ombro e minha orelha e encostando as costas contra o sofá. Não respondi pois não quero alimentar o monstro fofoqueiro que vive dentro do meu amigo.
— Sua dupla não sugeriu nada quando vocês falaram?
— Só sobre atropelamentos em Boa-Morte. — Faço uma careta. — Cara, ela realmente precisa superar isso.
— E se vocês fizessem sobre assombrações? Tipo, mitos urbanos e essas coisas. Já aproveita que tem a história dela pra contar.
— Dúvido muito que Safira vá querer fazer um trabalho sobre algo que já atormenta a vida dela todo tempo. — Começo a enrolar o fio do telefone no dedo, e empurro minha bermuda pro lado para pode esticar as pernas. — Você faria um trabalho sobre a Bia te amolando em relação a Raquel? — O menino ficou em silêncio. — Pois é. Duvido que ela queira também. Mas, de qualquer forma, vou dar um jeito. Eu sempre dou.
— Só não fique se achando muito. O meu vai ser melhor. — Dou uma risadinha. O Colégio Eduardo Flores tem essa mania de dar medalhas pros melhores trabalhos de cada turma. Nunca ganhei uma, mas sei que Mateus e Bia concorrem todo ano para saber quem tem mais. Pelo menos, dessa vez, eles não vão estar no pescoço um do outro o ano todo igual ano passado.
— Você tem alguma farda velha ai? — pergunto, meio distraidamente. Mateus sempre teve o mesmo tamanho que eu, mas ele cresceu bastante recentemente, então não faço ideia como as roupas dele ainda o servem. — Não aguento mais usar os shorts da Rita.
— Acho que tenho... — Escuto o garoto se levantar e abrir uma gaveta, e então o farfalhar de roupas sendo remexidas. Ele então resmunga algo inaudível, e diz: — É, tenho sim. Mas eram do Dudu. Tem problema?
Faço uma careta. Isso me lembra da hipótese de mais cedo que Bia fez, sobre eu gostar dele, e tenho ânsia de vômito. Quero dizer não, mas... será que vale a pena ficar com a roupa incomodando até que a gente receba os uniformes novos? Respiro fundo.
— É, pode. Eu faço uma dedetização completa.
Mateus ri.
— Amanhã eu levo pra v-...
— Mari! — Rita aparece na porta da sala, parecendo brava. — Não me escutou chamar, não?
Balanço com a cabeça que não, e falo "Rapidinho, Mateus" pro telefone.
— O que foi? — A olho, com o cenho franzido.
— Tô indo na padaria, quer ir?
Dei de ombros e assenti.
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Os Fantasmas de Boa-Morte ⚢
Romance[HIATO] A pequena cidade de Boa-Morte sempre foi muito crédula em todos os sentidos: em Deus, em santos, em fantasmas, aparições, mal olhados e todo o resto. Todos os seus habitantes eram extremamente supersticiosos, e Maria Madalena e sua família n...