O resto dessa semana e o começo da outra passaram com um piscar de olhos.
Papai não veio essa semana, então mamãe pediu pizza no sábado, e eu e minhas irmãs nos sentamos para assistir novela com ela a noite toda. Eu até quis ir na Locadora Caixão pegar outro filme para ver quando a novela acabasse, já que todos os filmes que passavam nesse canal eram ainda mais velhos que os disponíveis lá — e cheio de cortes e propagandas também — mas aquilo que Rita tinha me contado de Raquel ainda estava na minha cabeça, e eu não sabia direito o que pensar sobre. Seria esquisito falar com ela normalmente depois de saber o que ela fez com a minha irmã.
Na quarta de noite, o telefone tocou. Quem atendeu foi Cida, e ela veio correndo me gritar na porta do meu quarto.
— O que foi? — perguntei.
— É pra você — ela respondeu simplesmente, e se sentou na sua própria cama logo em seguida.
Eu franzi o cenho. Ligação pra mim? A essa hora da noite? Bia e Mateus sempre me ligavam de tarde, nunca quando já estava escuro.
— Quem é?
— Não sei, não perguntei.
Revirei os olhos e me levantei, me arrastando até a sala de estar, a barra da minha calça de pijama também arrastava no chão. Peguei o telefone que estava fora do gancho e escutei o silêncio por alguns segundos antes de responder. Quem será que era?
— Alô?
Dois segundos de silêncio, e eu quase desliguei, achando que a ligação tinha caído.
— Oi, dupla.
Suspirei. É claro.
— Que foi, Safira?
— Nossa, você não fala nem um "Boa noite, Safira", nem um "Tudo bem com você, Safira?". Entendi, entendi.
— O que você quer? — a ignorei, e me sentei no apoio de braço do sofá, começando a enrolar o cabo do telefone no dedo.
— Que rude — a menina disse com a voz afetada, fingindo tristeza. Depois explicou com clareza: — Semana que vem a gente já tem que entregar a primeira parte do trabalho de história.
— Já?
Fiz uma careta. Tinha me esquecido totalmente disso.
— É. A gente tem que fazer uma ficha sobre o tema do trabalho e preencher o cronograma.
— Que cronograma é esse?
— Você não presta atenção na aula? Ela tinha deixado uma cópia na moça que faz xerox lá na escola, pra gente poder imprimir também. A gente tem que colocar as datas que a gente vai se encontrar pra fazer o trabalho.
— E como que a gente vai saber isso? Eu não sei prever o futuro.
Safira soltou uma risada pelo telefone. Sem entender, eu também ri.
— É só na teoria, boba. — Pude sentir pelo tom da sua voz que ela ainda sorria. — Tipo um planejamento do que a gente vai fazer, mas não precisa seguir tão fielmente assim.
— Ah. — Olhei pro teto. Bem que ela podia ter explicado isso de primeira. — E a gente vai fazer sobre o que? Eu não pensei em nenhum tema.
— Também não sei. O que você acha de ficar um pouco depois da aula amanhã pra gente falar sobre?
— É... pode ser. Na biblioteca? — perguntei. Não queria muito ir, mas eu não podia dizer não. Eu tinha prometido pra mamãe que eu iria melhor na escola esse ano, e já perder pontos logo de primeira assim não ia ser tão legal.
VOCÊ ESTÁ LENDO
Os Fantasmas de Boa-Morte ⚢
Romansa[HIATO] A pequena cidade de Boa-Morte sempre foi muito crédula em todos os sentidos: em Deus, em santos, em fantasmas, aparições, mal olhados e todo o resto. Todos os seus habitantes eram extremamente supersticiosos, e Maria Madalena e sua família n...