Capítulo um

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Definitivamente eu não imaginava que retornaria para Belo Horizonte aos quarenta anos, iniciando um projeto com a clínica e me colocando mais uma vez em  zona familiar.

E aqui estou franzindo minha testa, esfregando o nariz ao olhar o cômodo vazio.

Leotie sempre foi meu lar, o começo de vários momentos importantes em minha vida. 

Fechei a porta do antigo escritório. Me encontrava eufórica,  feliz e com muitas dores nas costas. Ah! Finalmente havia terminado de encaixotar tudo para a mudança, eu poderia me contentar com pensamentos e uma lista de responsabilidades para o dia seguinte. Mas, apenas virei a cabeça em direção ao ombro direito, arqueando a sobrancelha quando Amanda passou rápido em direção ao quarto e Augusto deu de ombros, os olhos analisando a sala praticamente vazia.

— Você está lindo, por acaso é tinta permanente? —  perguntei a meu filho  em tom de descontração, erguendo as mãos como barreira, enquanto meu rapaz de dezessete anos se aproximava com os braços abertos.

Era surreal entender que eu era mãe de um marmanjo, calouro e que já era considerado adulto.

— Só existe uma forma de descobrir, mãe.

Mãe! Eu adorava essa palavra, ainda que viesse com tons variados, repetitivos e fosse a causa de meus fios brancos.

— Eu ainda sou responsável por você, Augusto, e posso repreendê-lo.

Ele tinha sido repreendido por fugir das tarefas de casa para jogar futebol o dia inteiro; por ter pedido dinheiro aos avós paternos para um evento escolar que foi proibido por mim. Definitivamente não sentiria saudades dos confrontos, mesmo que para outras pessoas eu sempre demonstrasse facilidade para contornar essas situações.

Apaziguadora Carolina!

—Fui aprovado, mãe! Agora me dê o abraço — ele disse, sem chances para que eu escapasse — Admiro a senhora muito e vou ser um sucesso naquela faculdade — Augusto confirmou, ainda me abraçado apertado.

Oh, sucesso! Ninguém especificou a representação dessa palavra, quer dizer, no momento em que confirmei a gestação meus ouvidos foram bombardeados com o termo: futura sogra.

Talvez eu esteja um pouco ansiosa com nossa mudança.

— Uma pena que sua irmã não esteja tão empolgada. Eu só queria que tudo se ajeitasse e pudéssemos sentar no sofá com harmonia.

— Amanda não quer perder os amigos, mãe, sabe o quanto foi difícil se acostumar e a baixinha está na adolescência. Ela com certeza puxou ao papai.

Foi automático meu sorriso, nem por isso menos sincero.

— Oh! Finalmente concordamos, moço —  retorqui —Se importa em levar essas caixas para a garagem? Depois eu arrumo no porta-malas.

— Eu sabia que ia tirar proveito do meu resultado na academia, mãe.

—Talvez eu o acompanhe quando estivermos em Belo Horizonte.

— Desde que a senhora não resolva arrumar um namorado —Augusto disse com uma piscadela, pegando uma caixa.

— Fale menos e trabalhe mais, filho.

Sozinha na sala novamente, me acomodei na poltrona, as mãos descansando nos braços do móvel.

O caminhão viria no dia seguinte e eu ainda teria um grupo de jovens nas próximas horas. Por que  concordei  com essa festa repentina?

Eu nunca havia cogitado voltar a minha cidade natal, principalmente com a morte de Igor.  Admito que era jovem demais para que houvesse um ponto final. Respirei fundo, diversas vezes me questionei sobre o que seria necessário para tê-lo novamente.

Em Um SomOnde histórias criam vida. Descubra agora