Rosalie suspirou ao entrar na sala de observação e ver Salvation lá, sem camisa, apertando um pano no lado de seu corpo, onde parecia ter sido atingido.
"Boa tarde, o que foi dessa vez, outra farpa?" Ela ergueu as sobrancelhas.
Ele sorriu, seus olhos castanhos maliciosos.
"Do jeito que você fala parece que eu tomei um tiro de raspão de propósito, Rosie." Ele disse, já sabendo que ia irritá-la.
"Não me chame assim. Já falei pra você." Onde ela estava com a cabeça quando dormiu com ele?
"Eu me lembro de você gostando de ouvir." Ela revirou os olhos.
Deu um tapa na mão dele e olhou o ferimento. Superficial.
"Pode ter algum estilhaço, vou chamar a doutora." Ela apertou o botão e começou a limpar, um pouco mais forte do que deveria. Ele riu.
"Eu adoro uma fêmea com pegada forte, pode continuar." Rosalie parou.
"Se falar mais alguma coisa, vou deixar para Paul te atender." Ele fez sinal de que estava passando um zíper pela boca. Rosalie tentou não olhar muito para os lábios cheios dele.
Nesse momento, a doutora Alli entrou na sala de observação com um grande sorriso no rosto.
"Ros, adivinha quem se acasalou?" Ela disse já se sentando numa cadeira, ficando de frente para o ferimento de Salvation que estava sentado na mesa.
Allison tocou na ferida, procurando estilhaços.
"Parece tudo ok, Sal. Você teve sorte. Vou dar uns pontos e não vai ficar nem cicatriz." Ela informou Salvation que acenou.
"Quem acasalou, doutora?" Alli olhava o ferimento, parecia esquecida do que tinha dito.
"Ah, sim. Cassie! Vengeance ligou, vão fazer um jantar íntimo amanhã comemorando e ela quer você lá. O helicóptero já deve estar sendo preparado."
Rosalie franziu as sobrancelhas. Cassie tinha ligado a poucos meses arrasada com o acidente do namorado. Como ela tinha se acasalado de repente assim?
"Você não está feliz por ela?" Alli perguntou, enquanto pegava o kit de sutura que Rosalie lhe estendia.
"Eu não sei. Ela sempre foi apaixonada por Simple, mas ele a rechaçou da pior forma."
"Simple é uma criança grande. Não poderia se acasalar com ela, de acordo com a nossa lei. Tio Justice sabe disso?" Salvation perguntou a doutora.
Allison deu de ombros.
"Bom, talvez eles se casaram no mundo dos humanos, como vocês dizem." Rosalie balançou a cabeça. Alguma coisa estava errada, mas ela não ia discutir isso ali na frente de Salvation. Os olhos dele a incomodavam.
"Eu vou arrumar minha mala, então."
"Na segunda te espero aqui." Rosalie sorriu. Era quinta, teria três dias de folga.
"Obrigada." Ela recolheu tudo, jogou as embalagens fora, e preparou o kit de curativo. Ia saindo quando Salvation a chamou.
"Rosalie?" Ela se voltou, a cara fechada.
"Vou aproveitar a carona. Peça para me esperarem, por favor." Ele disse e desviou o olhar para a doutora, a dispensando.
Moleque arrogante. Só por que era lindo, forte, alto e ótimo na cama, achava que podia assediá-la. Rosalie ia mostrar a ele.
Ela subiu as escadas, quando chegou no seu andar, Book saía do quarto de Creek. Ele sorriu.
"Rosalie." Os olhos dele a percorreram de cima a baixo e pararam em seus seios. Ela acenou e fechou a porta de seu quarto.
Book estava interessado nela, mas ela não foi feita para sexo casual. Não se sentia capaz de pular na cama com ele, depois de ter estado com Salvation, ainda que tenham parado de se ver a dois meses. Sem falar que ele e Creek não deviam estar rezando sozinhos no quarto dela.
Novas Espécies eram sinceros, francos e aparentemente não se apegavam. Trocavam de parceiras, amigavelmente, sem brigas e eram muito discretos. As fêmeas deles não tinham interesse em se acasalar, então, o sexo era casual, ainda que envolvesse muito carinho e amizade.
Ela pegou sua mala e começou a colocar roupas aleatoriamente, o rosto bonito de Salvation estampado em sua mente. Não estava apaixonada, mas frustrada. Ela foi trabalhar na Reserva, e num primeiro momento todos aqueles homens, bonitos altos e fortes, a intimidaram e excitaram. Ela ficou meses sem nem olhar nos olhos deles, trabalhando, sem desenvolver nem mesmo uma relação de amizade com qualquer pessoa. Ela era uma nômade. Gostava de seu trabalho por exatamente poder se mudar de tempos em tempos. Não ficaria muito tempo ali, então, não queria laços duradouros. Cassie foi a única paciente a que ela abriu seu coração, e elas quase não se ligavam. Rosalie gostava de sua própria companhia, ela se bastava.
Mas Salvation! Ele a fez se perguntar se poderia mudar seu jeito reservado e se envolver de forma mais profunda. Tudo por causa do amante maravilhoso que ele era na cama. Com vinte e um anos, ele tinha experiência de sobra, afinal Novas Espécies de segunda geração eram muito precoces. Demais até, na opinião dela.
Rosalie colocou na mala uma camisola vermelha de renda que tinha comprado e acabou por não usar. O lance dela com Salvation foi tão rápido que nem deu tempo da camisola, encomendada pela internet, chegar pelo correio.
As vezes ela pensava se não tinha sido um mal entendido. Salvation era calado, introvertido. Como ela, na verdade. Mas ela não ia dar o braço a torcer e perguntar se ele dormiu com Hope como parecia naquela manhã, logo depois dele ter voltado de um serviço da força tarefa deles.
Rosalie odiava se lembrar disso. Ela passou dois dias muito preocupada, a força tarefa era usada para serviços extremamente perigosos, ele chegou, mas não ligou para ela.
Se Timber, que era o líder da missão, não tivesse ido em algum apartamento do andar dela, ela nem saberia que Salvation tinha chegado e que estava bem.
E de manhã, tomava café na mesma mesa que tomava com ela de mãos dadas com Hope, os dois com os cabelos molhados, recém saídos do banho.
Rosalie fechou a mala, foi até a cozinha ver se não havia nada na geladeira que tivesse de tirar. Ela estava inquieta. Que droga! Ela tinha de estar intrigada com esse casamento repentino de Cassie, não chateada por Salvation continuar com aquilo de aparecer no hospital para vê-la. Tempos atrás, depois de duas semanas daquela manhã, ele apareceu no hospital com uma farpa enterrada no dedo. Rosalie retirou, de forma eficiente e em silêncio. Ele então lhe perguntou se podia levar pipoca e refrigerante ao apartamento dela mais tarde para verem um filme. Com a cara mais deslavada! Rosalie tinha o visto mais de uma vez no refeitório com Hope, que merda era aquela?
Rosalie tinha dito que não, que tinha um compromisso. Ele acenou, agradeceu pelo curativo e saiu. E agora, mais de um mês depois, lá estava ele de novo. Tudo bem que um tiro não era uma farpa, mas ele tinha aparecido justo no plantão dela.
Rosalie desceu, foi até o estacionamento e esperou alguém estacionar um jipe. Justamente Book estava no dito jipe. Ela perguntou se ele a levaria no heliporto, ele sorriu e ela subiu.
Foram em silêncio, Rosalie não era uma boa conversadora, ele era respeitoso. Todos eles eram. Foi por isso que ficou tanto tempo, quase três anos. Talvez fosse hora de ir para outro lugar.
No heliporto, Book gentilmente pegou a mala dela e se encaminhou ao helicóptero que estava parado esperando por ela. Salvation já estava sentado dentro da aeronave.
Book ainda a ajudou a entrar e se despediu todo sorridente. Rosalie se ajeitou e fechou os olhos, não queria conversar.
A viagem era curta, logo avistaram o verde das copas das árvores da Reserva. Rosalie sentiu uma certa ansiedade por ver Cassie. Como ela pôde se casar assim, de repente?
O helicóptero pousou, dessa vez foi Salvation que a ajudou a descer. Ele segurou a mão dela, mais tempo que o necessário, o calor de sua palma a desestabilizando. Ela correu para um jipe onde Romulus a esperava.
"Fez boa viagem?" Ele sorriu para ela, charmoso. Rosalie teve uma certa quedinha por ele quando ela e Cassie estiveram na casa daquele médico insuportável, o doutor Bishop. E quem não teria? Romulus era lindo. Olhos azuis claros, cabelos negros, feições perfeitas e simétricas, tudo isso num corpo alto e forte. Salvation subiu no jipe e acomodou as malas dele e dela, se sentando no banco de trás.
"Vai ficar no hotel, Salvation?" Romulus perguntou.
"Por que pergunta? Rosalie não vai ficar lá também?" Ele perguntou, sua voz baixa e grave um pouco fria.
"Não. Cassie quer Rosalie no Zoológico. Lá tem vários quartos. Mas eu te deixo no hotel, não é um grande desvio de qualquer forma." Romulus também usou um tom de voz seco. Eles não pareciam ser amigos.
"O que Cassie está fazendo no zoológico?" Rosalie perguntou.
"Papai vai dar uma casa para eles, de presente, mas até que fique pronta, ficarão lá." Vengeance. Rosalie tremia só de se lembrar dele. Todos diziam que ele tinha um grande coração, mas ela só se lembrava de sua fisionomia dura.
Não demorou, Romulus parou no hotel, era bem perto do heliporto. Mas Salvation não desceu.
"Na verdade, como não fui convidado para o jantar, eu acho que poderia dar meus cumprimentos ao feliz casal. Vou com vocês e você me traz de volta, quando voltar.
Romulus o olhou. Firme. Diziam que ele lia mentes, mas Rosalie não acreditava nisso.
"Que seja." Ele deu de ombros e voltou a dirigir. Rosalie se sentia perseguida e não estava gostando disso, mas não podia fazer nada.
Chegaram num estacionamento pequeno, na frente de uma varanda grande com uma mesa também grande no meio, sofás, cadeiras e uma mini cozinha num canto. Cassie abriu uma porta, saiu sorrindo e a abraçou apertado assim que Rosalie desceu do jipe. Um Nova Espécie gigante moreno, muito bonito, apareceu atrás dela, também sorrindo. Cassie vestia uma espécie de conjunto de moletom cortado, esquisito.
"Nova moda?" Rosalie perguntou. Cassie riu, ela estava corada, até um pouco suada e descabelada. Como se estivesse acabado de...
"Sim, uma nova tendência. Para quando você não tem mais roupas limpas e os conjuntos de moletom são muito grandes." Ela olhou para Salvation.
"Oi? Eu não conheço você." Ela perguntou, sua timidez voltando automaticamente. Cassie era muito tímida.
Salvation estendeu a mão para ela, o Nova Espécie atrás de Cassie rosnou e a abraçou pela cintura, colando as costas de Cassie a frente de seu corpo.
"Ora, Hush! Não lembra de mim? Sou Salvation. Eu passei um tempo aqui quando era bem novo, antes disso aqui virar o zoológico." Ele disse. O outro, Hush, um nome estranho na opinião de Rosalie, parou de rosnar, mas não sorriu, apenas acenou.
"Hush é meio possessivo." Cassie explicou sem graça." Rosalie não entendeu. Por que o gigante seria possessivo com Cassie? A menos que não fosse Simple o noivo. Rosalie segurou a expressão de espanto. Era pior ainda!
"É compreensível. Se eu tivesse uma fêmea tão linda como você, não deixaria que tocassem nela também." Salvation falou olhando para Cassie, despejando todo o seu charme barato. Rosalie bufou.
"Bom, eu só vim trazer Rosalie. Então, cumprimente os noivos para que eu te leve logo para o hotel. Antes que meu pai apareça aqui e me faça ir pra casa correndo." Romulus disse as costas de Rosalie. Salvation o olhou com pouco caso:
"Talvez isso te fizesse ficar mais forte." Ele disse. Rosalie achou o comentário sem sentido, Romulus era forte, não tanto quanto Salvation, ou quanto o improvável marido de Cassie, que era uma montanha de músculos, mas para ela, Romulus era perfeito.
"Eu te acho muito forte, Rom. E olha que com a sua inteligência você nem precisa de força." Ela sorriu. Romulus sorriu também, ficando deslumbrante, seus olhos azuis claros brilhando, seus dentes brancos iluminando seu rosto. Ele escondia as presas e seu cabelo era usado curto, parecia um humano comum. Quer dizer, um humano de beleza perfeita. Salvation, limpou a garganta, quebrando o momento entre eles.
"Eu só vim desejar felicidades. Estava querendo fazer algo diferente, acabei de vir de uma missão, então aproveitei o helicóptero. Desejo uma vida de casados incrível para vocês, muita harmonia e muitos filhotes."
Cassie sorriu de orelha a orelha, o grandalhão também sorriu, largou Cassie e abraçou Salvation. Um abraço de urso.
Ele gesticulou alguma coisa.
"Hush está te convidando para o jantar amanhã." Romulus traduziu. Rosalie franziu a testa. Libras? Ele era surdo? Tudo estava muito estranho.
Romulus ligou o jipe, Salvation segurou a mão de Rosalie antes de subir no jipe e sussurrou um até amanhã, seus olhos cheios de lascivia.
Cassie a abraçou e elas entraram pela mesma porta que Cassie e Hush saíram. Cassie a guiou por um corredor e abriu uma porta. Elas entraram num quarto arejado onde uma cama coberta com uma bonita colcha de retalhos dominava o meio. Móveis de madeira escura, bonitos e funcionais completavam a decoração rústica e aconchegante.
"Você vai ficar aqui. Daqui a pouco vamos jantar. Pode descansar." Cassie disse e já ia saindo.
"Cassie? Podemos conversar?" Cassie a olhou indecisa. Parecia de repente ter se lembrado do bizarro que a situação era.
Hush estava na porta a esperando, Cassie olhou para ele, depois para Rosalie. Era como se ela não pudesse ficar longe do homem! Rosalie achou que talvez Cassie não estivesse em seu juízo perfeito.
"Podemos conversar depois do jantar, é uma longa história, Ros. Mas não quero que você se preocupe. Não foi pra isso que eu te chamei aqui." Ela disse e antes que Rosalie pudesse dizer alguma coisa, o grandalhão a pegou no colo e Cassie saiu do quarto rindo.
Rosalie se sentou na cama. Aquele dia foi exaustivo, ela resolveu tomar um banho e se deitar um pouco até o jantar.
Debaixo da água do chuveiro bem quente, Rosalie relaxou, deixando todas as preocupações, o casamento estranho de Cassie, a insistência de Salvation, tudo escorrer junto com a água e descer pelo ralo. Ela saiu do banheiro bem disposta, se enxugou e vestiu a dita camisola vermelha. Era curta, podia continuar vestindo-a debaixo da roupa que vestiria para jantar.
Ela se deitou, fechou os olhos e tentou cochilar. Mas ouviu gemidos vindo do lado esquerdo de seu quarto e um barulho de uma cama batendo na parede. Será que aquele quarto era de Cassie e Hush? Ela se sentou. Um gemido mais alto seguido de um som estranho chegaram aos seus ouvidos. Rosalie suspirou. Se fosse Cassie, ela estava desfrutando bem de seu 'marido'. Rosalie esperava que ela estivesse feliz. Foi estranho ela não querer conversar logo que Rosalie chegou.
Outro gemido, dessa vez do outro lado do quarto, chamou sua atenção. Diferente dos gemidos acompanhados do bater da cama na parede, pareciam gemidos de dor. Seu lado enfermeira tomou conta e ela saiu para o corredor. Os gemidos vinham de um quarto ao lado do seu. Ela tentou abrir a porta, estava aberta, ela entrou. Alguém estava deitado na cama, um homem. Não um homem comum, mas um Nova Espécie grande e forte. Ele estava nu, deitado meio de lado segurando algo que pendia do lado de seu tronco. Rosalie o tocou, ele se virou rapidamente e ela se viu olhando nos olhos azuis claros de Romulus. Como isso era possível? Ela o viu sair dirigindo o jipe com Salvation ao seu lado a pouco tempo!
"Romulus?" Ela perguntou, mas seus olhos se firmaram no que ele segurava ao lado do corpo. Era um acesso para uma bolsa de colostomia. A pele em volta da incisão estava arroxeada e um pouco de secreção estava vazando.
"Sou enfermeira, posso dar uma olhada?" Ele fechou os olhos e soltou a bolsa. Estava vazia, ele teria se machucado na troca? Rosalie tocou a entrada da sonda e viu que estava inflamada. Ele fechou os olhos com mais força, quando ela tocou, devia ter doído. Rosalie esperou ele abrir os olhos, tentando não olhar para o pênis enorme mesmo em repouso.
Ele a olhou.
"Está inflamado, está tomando antibióticos?" Ele indicou uma mesinha, havia alguns comprimidos sobre ela. Rosalie leu os rótulos.
"Você está tomando uma dose cavalar, mas não parece estar funcionando." Ela não sabia o que fazer.
Ele segurou a mão dela.
"Não foi sua culpa." Até a voz dele era igual a de Romulus. Quem era ele?
"O que está dizendo? Como assim?" Ela sentiu um arrepio. Ele não podia estar falando sobre o que ela imaginou. Não. Não podia.
"Sua mãe. Você ainda não tinha se formado, não houve sinais de alerta, ela não tinha como ser socorrida."
Ele disse se sentando, a voz entre gemidos de dor.
Rosalie sentiu uma lágrima rolar por seu rosto. Tantos anos tentando esquecer o dia em que abriu a porta do banheiro e encontrou sua mãe caída, morta. Agora aquele estranho lhe fazia relembrar tudo, a dor da perda, a culpa.
"É uma merda, não é? Esse meu dom é uma porcaria. Me desculpe." Ele disse.
Lhe tocou o rosto, enxugou as lágrimas com um dedo. Rosalie se aproximou mais, ele era tão alto que sentado na cama ficava quase do tamanho dela.
Ele segurou o queixo dela, puxou delicadamente até encostar seus lábios nos dela. Deu um beijo de leve, Rosalie fechou os olhos, mas logo ele afastava seu rosto do dela.
"Tarde demais." Ele sussurrou.
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HUSH
FanfictionHush é um macho espécie que viveu na zona Selvagem durante muito tempo, sozinho, em silêncio, já que nasceu surdo. Leo, porém o chamou para trabalhar com ele no resgate de animais rejeitados, e depois no Zoológico que fundaram. E a partir daí, sua v...