repentance I

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Acordei ainda com a visão afetada, o ambiente girava ao meu redor e minha garganta estava seca, levantei o tronco e espremi os olhos colocando os dedos sobre a testa. Apenas após alguns segundos percebi que estava apenas de roupa íntima e havia dormido no sofá, então me levantei indo até a cozinha para pegar água até topar com a figura de minha vizinha vestindo meu hobby de seda cinza, franzi o cenho e ela me ofereceu um sorriso tímido.

— Bom dia. – disse e tomou um gole de seu café segurando a caneca com as duas mãos.

— Bom dia? – eu disse pegando o recipiente com o líquido na minha geladeira, havia aquela atmosfera estranha no ar, afinal eu não lembrava de nada e não sei se transamos. Bom, eu calculava mentalmente maneiras de pergunta-la o que realmente aconteceu sem parecer uma idiota.

— Você não se lembra de nada né? – ela perguntou rindo e eu neguei com a cabeça tomando toda água do copo d'água, então ela suspirou fundo. — Você apareceu chorando na minha porta dizendo que eu estava com a sua chave e que era pra eu entregar para você finalmente ficar sozinha com sua solidão absoluta.

— Merda. – passei a mão pelos cabelos em constrangimento. — Olha Lauren me perdoe pelo transtorno ok? Mas, por que eu estou...- – ela começou a rir.

— Ah isso! Não, nós não transamos. – por mais linda que a mulher seja, naquele momento eu fiquei aliviada por tal notícia. — Após eu te dar a chave, você vomitou, inclusive em mim, depois caiu e eu tive que te trazer pra cá. – porra. — Eu não te dei banho porque, bom... enfim, mas coloquei suas roupas pra lavar e tomei um banho, espero que não se importe.

— Eu não me importo, de forma alguma. – engoli em seco após notar que seu olhar estava em meu corpo. — Bom, me perdoe, mais uma vez, você não precisava.

— Relaxa, você é uma boa companhia quando não está embriagada e vomitando pelo corredor. – sorriu cínica e eu acabei por rir. — Pra beber duas garrafas de vinho sozinha, alguém realmente quebrou seu coração.

— Não. – logo respondi. — Não foi nada nesse contexto.

— Uh, ok... – deu ombros. — Então, eu já vou ind- – a mulher já ia se retirando quando segurei seu pulso.

— Espera. – fitei sua íris verdes e umedeci os lábios antes de dizer. — Eu preciso retribuir por ontem, o que acha de um jantar?

S/n. – me deu um meio sorriso e arqueou as sobrancelhas. — Se você realmente quer me retribuir isso. – se aproximou dos meus lábios ficando centímetros dos mesmos. — Me convida para um motel, seria bem mais interessante. – piscou e se desenvencilhou dali em direção à porta, por um momento me encontrei petrificada mas logo fui atrás dela.

— Lauren, isso é sério? Eu- – ela se virou para mim e me entregou seu celular com a tela aberta em sua agenda de contatos.

— Me dá seu número, a noite eu te ligo e a gente resolve isso. – adicionei meu número, ela sorriu e beijou minha bochecha. — E eu te devolvo isso depois. – se referiu ao hobby e logo saiu andando me deixando atordoada parada na porta, até a senhora de idade que trabalha nos corredores me ver de roupa íntima e tapar os olhos envergonhada, balancei a cabeça tentando ajeitar meus pensamentos e fechei a porta.

Estou em uma montanha-russa

(...)

Era meu dia de folga então resolvi fazer uma caminhada, pensei muito sobre ontem e como esses pensamentos ruins estavam voltando à tona novamente, quando eu ainda era criança eu fui diagnosticada com depressão e me lembro exatamente dessa sensação. Esse sufoco, essa solidão extrema e a certeza incessante de que a minha existência não faria diferença para ninguém, é como uma maldição. Uma voz impedosa, grosseira e rudemente sincera ecoando e ecoando pela minha cabeça. Eu queria gritar, eu queria poder fazer algo a respeito mas tudo o que eu consegui foi adormecer isso com meu ego inabalável, mas apesar de ter essa postura de me colocar acima de tudo e todos, tudo o que eu realmente sinto por mim é nojo.

Comecei a hiperventilar e e engoli em seco, a única maneira de calar essa voz é estando bebada o suficiente pra não pensar em nada e eu estou exausta disso, exausta desse personagem que eu mesma criei e principalmente, exausta dessa realidade. No final das contas, eu iria decepcionar todo mundo de qualquer maneira.

(...)

Após retornar pra casa, eu me encontrava vestindo uma roupa casual e finalizando com meu perfume. Fitei as horas no relógio e peguei as chaves do carro, eu iria encontrar Hailee e resolver as coisas com ela.

Acho que já passou da hora de finalizar essa situação

Fui até a garagem, entrei no carro e dei partida indo até o apartamento da morena. Assim que cheguei na portaria, o porteiro liberou minha entrada pois já me conhecia e fui até seu apartamento. Bati na porta e enquanto esperava tive a surpresa da aparição de minha cupido.

— Camila, eu não- – eu disse olhando para baixo e ela percebeu que eu não estava no meu melhor momento ali.

— Escuta. – disse e eu olhei em seus olhos castanhos sentindo aquele habitual arrepio. — Eu sinto muito por tudo. – após isso, um silêncio absoluto se instalou no local. — E-Eu só, não sei, você é uma incógnita pra mim.

— Eu não sou a pessoa mais fácil de lidar também, não te culpo, de verdade. – revirei os olhos. — E se te magoei em algum ponto me des- – quando ia acabar a frase uma Hailee apenas de toalha abriu a porta com um sorriso animado.

— Tava falando sozinha? – a morena perguntou franzindo o cenho e acabou rindo.

— Não, eu não- – grunhi desistindo de me explicar. — Enfim, oi. – eu disse colocando as mãos nos bolsos da calça.

— Oi. – riu. — Entra logo. – me puxou para dentro do apartamento e eu umedeci os lábios apertando os olhos. — Você veio de repente, aconteceu algo?

— Eu acho que precisamos conversar. – ela soltou uma risada leve como se estivesse incrédula, em anos de "relação não convencional" eu nunca havia dito tais palavras.

— É, eu também acho mas depois de você me ajudar com isso... – sussurrou após se aproximar e tentar colocar minha mão por baixo do tecido da toalha.

— Hailee. – chamei sua atenção após me desvencilhar de seu corpo. — É sério.

Dessa vez ela me fitou com seriedade e cruzou os braços, eu suspirei e engoli em seco. Eu quero ser melhor, porque agora vejo claramente que eu vivi uma vida em vão.

love is not real | cc + youOnde histórias criam vida. Descubra agora