MANSÃO

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Houve um tempo em que ela não precisava se preocupar tanto.

Corrigindo, sua única preocupação era conseguir entrar em uma escola profissionalizante. Era começar a estudar, já com seus quinze anos de vida, a área divina e surpreendente da psicologia. Virar noites estudando e negar convites de saídas com amigos era visto como uma disposição a mais para se dedicar e tornar concreto seu sonho. Mas há um caminho tortuoso para todas as pessoas que almejam uma coisa e para Hermione, isso não foi diferente.

Contas, remédios, roupas, calçados, materiais escolares... estava precisando de tudo isso e de mais um pouco. Mas sem dinheiro nada vai par frente e a morena estava em desespero em busca de emprego. Pelo visto, a baixa temporada no comércio deixou os donos de padarias, lanchonetes, lojas de tecidos e calçados não queriam contratações por enquanto. Estabelecimentos de venda de comida foram suas últimas tentativas. Últimas e falhas.

Seu celular agora parecia um paredão de uma boate: a cada minuto o sininho de notificação soava e as milhões de mensagens se acumulavam sem ser lidas. Não queria saber o que Ana ou Antonella tinham a dizer - com certeza lamentando sobre sua demissão -, ou os pedidos de desculpas de Luna, ou o silêncio nada a ver que estava dando em Bill. Esse último não tinha culpa no cartório, mas também sabia que se abrisse uma mensagem dele, acabaria que o dizendo toda a merda que acontecia.

A escada de incêndio onde estava sentada a dava uma vista privilegiada para uma lata de lixo e uma poça de água lá em baixo. Se virasse o roso para a direita, podia ver onde o beco acabava e as pessoas caminharem apressadas; periódicas gritando algo no celular e esbarrando em segundos. A vida delas parecia um saco, mas ainda sim era uma vida, com suas alegrias e tristezas, dificuldades e momentos bons. Torceu a boca de lado e ouviu a chaleira apitar dentro de casa. Sua mãe preparava um chá de cheiro delicioso e não demoraria até que ela levasse um xícara a filha.

Encarou a janela do apartamento a sua frente e lembrou de uma música ao mirar o pôster de uma banda colada no quarto. Batucou com a caneta que tinha na mão - usava ela para circular empregos na folha do jornal posto de lado - no ferro, tentando achar ou inventar um ritmo legal.

Parou um instante, recordando de que ela e Luna costumavam cantá-la juntas.

Não falava com a loira a três dias e estava magoada pela reação da amiga. Ora, fora ela que tinha dito palavras duras, então seria ela que deveria se redimir. Não gostava do jeito com que ela via os problemas da morena e não deixaria barato. O gelo duraria até que um pedido de perdão fosse feito, do contrário, Luna teria que arranjar outra melhor amiga.

Terminaram com os tão conhecidos socos no ar, ação essa que criaram ao longo do tempo em que cantavam.

Hermione tinha se virado para vê-la a olhando da janela e sorriram uma para a outra. Depois as expressões foram morrendo, tocando-se do provável motivo de Luna está ali. A loira abaixou o olhar e mexeu com o pé desconcertada em um pedaço do assoalho arribado para cima. Limpou a garganta mas não soube o que dizer.

- O que faz aqui? - Hermione conseguiu falar.

- Vim pedir desculpa - o fio de voz da loira denunciava seu desconforto. - Não sei o que deu em mim por ter falado daquele jeito. Me desculpe.

- Eu sei muito bem o que deu em você. Foi só o seu lado esnobe e rico que aflorou após muito tempo - a morena disparou, lembrando as duas de suas condições de diferentes economias. Era um assunto delicado para Luna - saber que seu pai metia medo em todos os empresários da cidade não era lá muita coisa na qual gostava de dizer -, só que esse defeito dele os tinha ajudado a ter uma estabilidade mais que boa.

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